Quando o corpo vira território e a memória se transforma em luta
por
Vitor Simas
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22/04/2025

Por Vitor Simas

 

No sertão de Euclides da Cunha, onde a terra é seca e a resistência brota entre espinhos e pedras, nasceu uma menina que mais tarde se tornaria símbolo de muitas vozes silenciadas. Filha do povo Kaimbé, Vanuza cresceu na aldeia Massacará aprendendo desde cedo que o mundo indígena, especialmente o das mulheres, não se explica apenas com palavras — ele se sente na pele, nos rituais, nas mãos que colhem e nos pés que firmam o chão.

Na aldeia, as mulheres são tudo. Carregam nos ombros o alimento da roça, a espiritualidade das rezas, o choro dos filhos e a força de uma ancestralidade. Vanuza cresceu observando essa teia invisível: o modo como as mais velhas orientavam a vida sem jamais perderem a firmeza. Era ali, entre o preparo dos alimentos e os cânticos noturnos, que a menina aprendeu a sabedoria de um povo cuja existência insiste em continuar mesmo diante do apagamento sistemático.

Aos 14 anos, quando partiu para São Paulo, carregava nos olhos o medo do desconhecido, mas no coração uma certeza incômoda: sua missão não cabia nos limites da aldeia. Era preciso sair. Era preciso atravessar. Chegar à cidade grande foi como ser arremessada em um mundo que a enxergava apenas como um erro de estatística. A urbanidade não sabia reconhecê-la. Entre casas emprestadas, privações e olhares que cortavam, entendeu que sobreviver ali seria um outro tipo de guerra.

Vanuza conheceu o abandono, a fome, o racismo cotidiano. Em muitas ocasiões, sua origem era negada por desconhecimento ou desdém. Mas ela se recusava a desaparecer. Formou-se técnica em enfermagem, atuou nas periferias da cidade e fazia questão de se apresentar como indígena — não por vaidade, mas por necessidade de afirmar que existia, que estava viva, que pertencia a um povo. Sua identidade era um ato de resistência cotidiana.

Em 2020, quando o Brasil mergulhava no caos da pandemia, seu corpo foi chamado a ser mais do que sobrevivente — tornou-se símbolo. Vanuza foi a primeira mulher indígena a ser vacinada contra a COVID-19 no País. Não buscava protagonismo, mas compreendia o poder daquele gesto. Era mais do que imunização: era um marco. Um braço indígena, feminino, erguido como bandeira num momento em que tantos morriam calados. A imagem circulou o país, mas não era a fotografia que importava — era a mensagem: os povos originários seguem vivos e não recuarão.

A repercussão daquele ato não a acomodou. Pelo contrário, a empurrou para novas frentes. Fundou, em Guarulhos, a Aldeia Multiétnica Povos Dessa Terra. Um território simbólico e real, onde diferentes etnias — como Guarani, Pankararé e Kaimbé — encontraram chão para recomeçar. Ali, mulheres fugidas da violência, crianças privadas de suas raízes, jovens em busca de pertencimento, se conectam num espaço de cura e ancestralidade. A aldeia não é apenas abrigo: é gesto político contra a lógica urbana que apaga, silencia e transforma cultura em folclore.

Lá, os dias começam com rezas e terminam com partilhas. As mulheres assumem papéis de liderança, como fizeram suas mães e avós. Não há luxo, mas há dignidade. As crianças crescem aprendendo a língua dos antepassados, os rituais sagrados, os nomes verdadeiros das coisas. Tudo ali pulsa numa cadência que desafia o tempo cronológico e reeintroduz no concreto da cidade aquilo que a modernidade tentou apagar: a cosmovisão indígena.

A política institucional, que por tantos anos foi uma máquina de invisibilizar esses corpos, também passou a ser território de enfrentamento para Vanuza. Em 2020, ela se lançou como candidata à vereança em Guarulhos. A campanha não foi movida por ambição pessoal, mas por um projeto coletivo. Levou para as urnas temas que raramente encontram espaço no debate público: território indígena urbano, saúde com respeito à cultura, educação com base na ancestralidade, combate ao machismo — inclusive dentro da própria comunidade. Não venceu nas urnas, mas plantou sementes. Hoje, continua a pressionar o poder público por políticas voltadas à população indígena que vive fora das aldeias oficiais, especialmente as mulheres.

Seu compromisso com a educação a levou também aos bancos universitários. Estudou Serviço Social na PUC-SP, por meio do Projeto Pindorama, que visa a inclusão de indígenas no ensino superior. Para ela, estar na universidade nunca significou abandonar a aldeia. Pelo contrário, significava levá-la consigo, carregá-la nos livros, nas conversas, nas provas, nos corredores. Ainda assim, mesmo ali, enfrentou olhares de desconfiança e comentários que tentavam colocá-la de volta no lugar da margem. Mas ela persistiu. Sua presença ali era também um ato político.

Além da atuação local, sua voz ecoa nas maiores mobilizações indígenas do Brasil. No Acampamento Terra Livre (ATL), realizado anualmente em Brasília, ela se junta a milhares de lideranças para exigir aquilo que a Constituição já garante, mas que o Estado se recusa a cumprir: a demarcação de terras, o direito à saúde e à educação, o respeito à vida. Em 2024, o ATL completou vinte anos, reunindo mais de 200 povos. Vanuza estava lá. Participava não como espectadora, mas como protagonista. O ATL, para ela, é onde os corpos indígenas dialogam com o poder público e com a nação. Onde se afirma, mais uma vez, que os povos originários seguem vivos e organizados.

Hoje, ao olhar para sua trajetória, Vanuza não mede conquistas por cargos, títulos ou fotos em jornais. Mede pelas meninas indígenas que agora sonham em ser lideranças, entrar na universidade, curar com suas mãos e ensinar com suas palavras. Cada caminho aberto, cada espaço conquistado, cada voz é, para ela, uma vitória coletiva.

 

 

Documentário autobiográfico de Vanuza Kaimbé

 

Ser mulher indígena, diz ela, é habitar o entre o lugar da dor e da esperança. A dor que nasce da violência, da invisibilidade, do descaso. A esperança que brota da coletividade, da luta contínua, da espiritualidade que sustenta. Vanuza Kaimbé, com sua caminhada firme e serena, é uma dessas mulheres-sementes que enfrentam o fogo da história para reflorestar o futuro.

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A comunidade LGBT+ enfrenta desafios para garantir inclusão e respeito. Entre preconceitos e iniciativas de diversidade, jogadores e criadores lutam por um cenário mais acolhedor.
por
Thomas Fernandez
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15/04/2025

Por Thomas Fernandez

 

O baralho de cartas desliza suavemente sobre a mesa. Cada jogador posiciona suas criaturas, lança feitiços e traça estratégias. Magic: The Gathering - MTG não é apenas um jogo de cartas colecionáveis, mas um universo inteiro onde histórias se entrelaçam, comunidades se formam e, para muitos, um refúgio onde a criatividade se expressa. No entanto, para a comunidade LGBT+, esse espaço nem sempre foi – ou é – tão acolhedor quanto poderia ser.

Higson Menezes, jogador de Magic desde 2006 deixa evidente que o jogo não é apenas um passatempo, mas uma parte essencial da sua trajetória. MTG sempre esteve presente em sua vida, mas foi em 2016 que mergulhou de cabeça nesse universo. Com o tempo, não apenas jogou, como também criou eventos e se envolveu em iniciativas voltadas para a diversidade dentro do jogo. A comunidade de Magic tem uma base de fãs vasta e apaixonada. Uma paixão que dificilmente resulta em inclusão. A realidade é que a aceitação da comunidade LGBT+ dentro do MTG ainda é algo nichado. Algumas lojas de card games são acolhedoras e incentivam a diversidade, mas outras simplesmente não se interessam ou não veem um retorno financeiro na realização de eventos inclusivos. E, claro, existem aqueles jogadores que se opõem à diversidade, preferindo manter o ambiente como um “clube fechado”.

Higson já passou por situações de preconceito dentro do jogo. Um dos momentos mais marcantes foi quando começou a divulgar o Pride Magic, iniciativa que criou para promover um espaço seguro para jogadores LGBT+. Em um dos grupos de discussão, um membro se revoltou, alegando que criar esse tipo de evento era “segregar” os jogadores. O discurso dele era de que estavam “separando” a comunidade ao invés de integrá-la. No entanto, a realidade é que espaços seguros são necessários porque, muitas vezes, o ambiente tradicional de lojas e torneios não é receptivo. A comunidade LGBT+ dentro do MTG depende muito das lojas e dos próprios jogadores. Quando a administração do local incentiva a inclusão e combate comportamentos tóxicos, a diferença é perceptível, no entanto, há locais onde a cultura de exclusão persiste. Algumas lojas não se preocupam com esse aspecto, e os jogadores que compartilham dessa visão reforçam um ambiente hostil para quem foge do padrão tradicional.

Mesmo com os desafios, há iniciativas que lutam por um Magic mais inclusivo. Além do Pride Magic, outras figuras na comunidade trabalham para ampliar a diversidade. Criadoras de conteúdo como Lys Alana, Lumi e Carol Anet fazem um trabalho importante, não só por serem parte da comunidade LGBT+, mas também por representarem mulheres dentro do jogo – um outro grupo que, historicamente, enfrenta barreiras no cenário competitivo. Além disso, há ações como as arrecadações organizadas pelo canal Tolarian Community College, um dos maiores criadores de conteúdo sobre Magic no YouTube. O professor, criador do canal, realiza campanhas anuais para arrecadar fundos para a Trans Lifeline, uma organização que fornece suporte direto e assistência financeira para pessoas trans em situação de vulnerabilidade. Essas arrecadações não apenas ajudam a comunidade trans, mas também reforçam a importância de um espaço mais acolhedor dentro do universo de Magic. Enquanto isso, a própria Wizards of the Coast, empresa responsável pelo Magic, tem uma postura ambígua em relação à diversidade. Embora tenha promovido representatividade em suas cartas e histórias, decisões como o retrocesso na relação entre Chandra e Nissa – duas personagens que estavam a caminho de se tornarem um casal – mostram que a empresa ainda prioriza interesses financeiros sobre o compromisso com a comunidade.

A mudança precisa vir de dentro para fora. As lojas precisam se abrir à diversidade, e os jogadores devem estar dispostos a construir um ambiente mais acolhedor. Para quem é LGBT+ e quer entrar no mundo do Magic, Higson considera importante buscar uma loja receptiva, observar o ambiente, conversar com outros jogadores e perceber se há abertura para inclusão. Se um local não for seguro, o ideal é procurar outro. Infelizmente, ainda é necessário esse cuidado.

A comunidade Magic já avançou em termos de aceitação, mas há muito o que melhorar. E a mudança não acontece sozinha, a diversidade dentro do jogo precisa ser incentivada, não apenas por empresas e criadores de conteúdo, mas por cada jogador que deseja um ambiente mais inclusivo e respeitoso para todos.

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Cultura e Entretenimento

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No País que mais violenta a população transgênera, existir é um ato de resistência e reafirmação
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Julia da Justa Berkovitz
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10/04/2025

Por Julia Berkovitz

 

Jordhan Lessa é um servidor público comunicativo, culto, alegre, com uma história inimaginável. Até os seus 46 anos, viveu no que ele chama de “não lugar”. Após batalhas internas e externas contra a discriminação e a violência que sofreu a vida inteira, Jordhan pôde se entender como um homem trans. Aos 11 anos foi levado a um manicômio por ter dito à sua mãe que gostava de uma menina. Durante sua adolescência, Jordhan foi expulso de casa, morou na rua, trabalhou no lar de uma família e somente voltou à casa de sua mãe, após ter descoberto uma gravidez fruto de um estupro.

Daí em diante, Jordhan seguiu batalhando por seu filho, sobrevivendo de subempregos, tendo em vista que sempre foi discriminado por ter uma “leitura muito masculina”. Aos 30 anos, ele conseguiu entrar no serviço público. Ainda assim, dentro da própria comunidade LGBTQIAPN+, as mulheres lésbicas o indagavam porque ele era “tão masculino”. Ele ficava sem entender esse questionamento, pois nunca soube ser diferente.

A única vez em que Jordhan tomou banho no quartel, ele foi chamado na sala do comandante porque uma colega se sentiu desconfortável com a sua presença no vestiário. Até então, no início dos anos 2000, ele nunca tinha ouvido falar de transição de gênero. Após anos enfrentando questões de saúde mental, Jordhan conheceu João W. Nery, o primeiro homem trans a realizar a cirurgia de redesignação sexual no Brasil. Nesse momento, Jordhan se reconheceu como um homem trans. Diz ter passado a existir e a viver realmente, achando seu lugar no mundo.

Jordhan
Jojo.

Jordhan explica que para além do problema da falta de empregabilidade de pessoas trans, há a questão da manutenção, não basta apenas contratá-las, elas devem ser tratadas com respeito em um ambiente que não as invalide. Para aqueles que estão passando pela transição, o tratamento não deveria ser diferente. Alguém é trans a partir do momento em que se autodeclara. Para Jordhan, o trabalho que ele faz de conscientização é uma semeadura: não necessariamente poderá colher todos os frutos, mas abrirá caminhos e possibilidades para a população trans combater o preconceito que sofre. 

Esta também foi a vivência de Nathan Breno da Silva, um analista administrativo extrovertido, carismático, dedicado que, mesmo jovem, já possui uma longa trajetória de vida. Nathan adentrou no mercado de trabalho já tendo passado pela transição de gênero, mas, infelizmente, isso não o impediu de ser desrespeitado e discriminado.

Ele alega ter sido muito difícil entrar no mercado de trabalho sendo um homem trans. Em 2018, Nathan participou de um processo seletivo específico para pessoas trans em uma empresa multinacional. Ele e mais dois candidatos foram selecionados. Na época já se reconhecia como Nathan, os outros dois meninos estavam no processo. Ele relata que tiveram todo o apoio possível da empresa, que chegou a fazer um treinamento com a equipe para saber como recepcioná-los. Mesmo assim, eles recebiam inúmeros olhares de julgamento. 

Nathan
Na.

Nathan explica que para aqueles que estão no início da transição, sem os documentos retificados e enfrentando questões de saúde mental, entrar no mercado de trabalho é um processo ainda mais difícil e doloroso. Diz que as pessoas não aceitam quem você é, não respeitam o seu nome e o seu pronome. 

Tanto na multinacional quanto em empregos anteriores, colegas de trabalho tentavam invalidá-lo como homem, pedindo para ver seu corpo, perguntando pelo nome morto ou querendo “vê-lo de verdade”. Nathan conta que, em diversas situações, é necessário fingir que não está ouvindo os comentários preconceituosos e ignorar indagações sobre sua identidade. 

Tanto para Jordhan quanto para Nathan, é a partir da comunicação que as pessoas trans poderão ser verdadeiramente incluídas no mercado de trabalho. Certos termos utilizados em campanhas, como “saúde feminina”, não incluem as mulheres e os homens trans. É necessário criar uma comunicação assertiva e abrangente.  Além disso, é fundamental que pessoas trans tenham espaço e visibilidade para contarem suas histórias e experiências de vida. Palestras e treinamentos são portas de entrada para essa comunidade. Jordhan acredita que o caminho é a sensibilização, as pessoas precisam, primeiro, vê-los como gente. 
 

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Entre o alívio da fuga e as incertezas do futuro, a sobrevivência de uma familia libanesa em território brasileiro revela a resiliência dos refugiados
por
Laura Celis Brandão
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15/04/2025

Por Laura Celis

 

O som das explosões ainda ecoava nos ouvidos de Fateh e sua esposa, Nadia quando recebeu uma mensagem da Embaixada brasileira que dizia: "Vôo de Repatriação ao Brasil. Lista de Espera. Embarque dia 18/10/2024 (13h)". Durante meses, a família viveu sob o temor constante dos bombardeios, enquanto a guerra no Líbano transformava ruas familiares em cenários de destruição e escombros. O medo já fazia parte da rotina quando Nadia decidiu partir junto aos seus filhos. Sem alternativas, partiram junto aos filhos Said, 16, Sadal, 11 e Solana, 6 para o Brasil, para deixar o cotidiano de violência.

A guerra avançava sem trégua atingindo não apenas edifícios, mas também famílias inteiras. Casas de parentes foram bombardeadas, bairros antes movimentados foram reduzidos a ruínas, e conhecidos desapareceram, vítimas dos ataques incessantes. Permanecer significava conviver diariamente com a incerteza da própria sobrevivência.

Deixaram para trás a casa onde construíram uma vida, os amigos de infância, os cheiros e sabores de uma terra que, apesar do sofrimento, ainda chamavam de lar. Agora, fisicamente longe do caos, tentam recomeçar em um País que não conheciam, onde tudo soa estranho — inclusive a língua — mas que representa sua única chance de sobrevida e segurança. Entre o luto pelo que ficou para trás e a esperança por um futuro mais digno, enfrentam os desafios da adaptação, enquanto tentam se adaptar, carregam a incerteza de quando, ou se, conseguirão chamar esse novo lugar de lar.

Apesar do alívio de estarem em um local seguro, Nadia e Fateh lidam com um sentimento constante de culpa por terem conseguido escapar enquanto tantas outras pessoas, incluindo familiares e amigos, ainda enfrentam os horrores da guerra, e não contam com o dia de amanhã. Para Nadia, a sensação de impotência é esmagadora, por saber que muitos dos que ficaram não tiveram escolha. O sentimento de sobrevivência se confunde com a angústia por aqueles que não puderam partir, e a cada notícia de mais destruição em sua cidade natal, a dor de estar longe se mistura com o alívio de ter dado uma chance de sobrevivência aos filhos, e a si mesma.

Nadia relembra as dificuldades desde a decisão de partir até a chegada ao Brasil com a família em 18 de outubro de 2024. As quase 10 horas que separam Beirute de São Paulo foram marcadas por incertezas, burocracias e medo. A saída do Líbano exigiu negociações e muita coragem, já que cada passo poderia significar o fim do sonho de recomeçar. Passaram dias aguardando informações, sem garantia de que conseguiriam embarcar. A confirmação de que estariam na lista de espera de refugiados a bordo dos aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) veio apenas horas antes da decolagem, trazendo um misto de alívio e desespero, que aumentava a cada segundo que se aproximava do próximo voo. O tempo era curto para se despedirem do pouco que restava, e a incerteza do que os aguardava no Brasil, e o que deixavam no Libano tornava a partida ainda mais angustiante.

Ao pousarem em solo brasileiro uma onda de alívio tomou conta de Nadia e sua família. Apesar dos desafios da adaptação estarem apenas começando, havia, pela primeira vez em meses, um pequeno sentimento de segurança. A angústia constante dos bombardeios, o medo de não saber se poderiam sobreviver até a próxima hora, deram lugar a uma sensação de proteção, mesmo que temporária. 

A chegada ao aeroporto de Guarulhos foi marcada por uma recepção calorosa, com parentes que haviam imigrado anos antes e agora viviam em São Paulo. Apesar da saudade da terra natal ser profunda, o abraço familiar trouxe um sentimento reconfortante de pertencimento. Os parentes que os receberam foram fundamentais nesse processo inicial de adaptação, oferecendo apoio emocional e prático, como o acolhimento em suas casas, e principalmente, no processo de familiarização com a nova realidade. 

A adaptação ao Brasil, embora seja desafiadora, é vista como uma oportunidade, principalmente pelo futuro dos filhos. As crianças, que enfrentaram por muito tempo o medo diário da guerra, e largaram estudos, amigos e o lazer, agora vivem a oportunidade de estarem em um ambiente seguro, no qual podem acordar sem o medo constante de ataques repentinos. Nadia diz que por sentir muito medo, uma das filhas urinava na cama constantemente. 

O futuro da família, assim como o de muitos refugiados, permanece incerto. O processo de reintegração no Brasil passa por um caminho repleto de obstáculos, mas também de avanços significativos. O país vem se tornando um destino importante para pessoas em buscas de refúgio, principalmente vindas de países do Oriente Médio. Porém, a integração social, cultural e econômica desses cidadãos deslocados exige mais do que políticas públicas de acolhimento, há a necessidade de um esforço para que as diferenças culturais sejam respeitadas, e que a solidariedade seja incorporada na sociedade como um todo. A jornada de Nadia, Fateh e os filhos reflete a luta de milhares de refugiados que buscam, no Brasil, uma chance de recomeço, e acima de tudo, de viver com dignidade.

 

 

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Política Internacional

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Histórias de reinvenção pessoal quando a vida impõe novos caminhos.
por
Mohara Ogando Cherubin
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10/04/2025

Por Mohara Cherubin

 

Estabelecido em seu cargo há mais de uma década e acostumado a uma rotina previsível, Vandenilson de Assunção, mais conhecido como “Maranhão” iniciou aquela segunda-feira, 19 de junho de 2023, como qualquer outro dia de trabalho. Nada indicava que, em poucas horas, sua vida tomaria um rumo inesperado. Por volta da 20h15min, enquanto voltava para casa de moto com a sua esposa na garupa, um carro avançou o sinal vermelho e colidiu violentamente contra eles. A motorista, Marcela, 22, não conseguiu frear a tempo. O impacto foi imediato e a dor, avassaladora. No asfalto, em meio à confusão e ao desespero, um único pensamento dominava a sua mente: se indagava como Ramon, seu filho mais novo, ficaria sem os pais.

Hoje ele é um homem que, mesmo carregando consigo um recomeço de vida constante, está sempre com um sorriso no rosto. Hoje tem 44 anos e aprendeu a encarar a vida com um olhar diferente, uma esperança de que um novo dia sempre virá. A partir de cuidados, companheirismo e perseverança, ele aprendeu que nem todo recomeço é uma escolha. Reflete diariamente que às vezes, a vida o força a recomeçar, e é na superação desses desafios que diz se reinventar.

Com uma infância e adolescência tranquilas, Maranhão cresceu em São Luís, capital do Estado, onde também conheceu o amor e se casou com Maria da Glória Almeida Diniz, 48, em 2006, com quem teve três filhos. Em 2008, o casal recebe um convite para passar um mês de férias em São Paulo, na casa da irmã de Maranhão, que já residia na cidade. Aos poucos, uma simples viagem marcada pela curiosidade se transformou em um desejo pelo novo, fazendo com que o período de “férias” da família se prolongasse na cidade.

O surgimento de uma proposta de trabalho na área de segurança fortaleceu ainda mais o desejo de permanecer em São Paulo. Desse modo, junto de sua esposa e os três filhos do casal Carlos Henrique, 23, Isaac, 21 e Ramon, 16, Maranhão se estabelece em São Paulo e inicia uma nova jornada pessoal e profissional. Um tempo depois, em 2009, ele iniciaria seus serviços como porteiro e manobrista no Porto Seguro, um condomínio residencial localizado na Zona Norte de São Paulo.  

Apesar de atuar na área de segurança do condomínio, Maranhão nunca foi uma pessoa de apenas um "bom dia" e "boa noite". Desde os primeiros dias de trabalho, ele se mostrou alguém que realmente se importa com os moradores. Com seu jeito simpático, prestativo e sempre atento às necessidades de cada um, foi construindo laços de amizade, conquistando a confiança das famílias e se tornando uma figura essencial no dia a dia do condomínio. Foi nesse período que recebeu o apelido carinhoso de "Maranhão", uma referência ao seu estado de origem, e, até hoje, mantém essa mesma proximidade e dedicação no trabalho.  

A recuperação foi um dos momentos mais difíceis de sua vida. Tanto ele quanto a sua esposa tiveram que passar por cirurgias devido a fraturas no fêmur e nos braços. Ambos se viram totalmente dependentes dos amigos e vizinhos para realizar atividades simples e sobreviver, em razão do afastamento das atividades profissionais. Ambos consideram que a fisioterapeuta Carla foi um verdadeiro anjo em suas vidas, fazendo com que não desistissem do tratamento e os ajudando a dar os primeiros passos de volta à vida. No total, foram 19 meses de recuperação até que o porteiro estivesse apto a retornar ao trabalho. 

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Vandenilson de Assunção, o "Maranhão".

 

A retomada da vida foi uma experiência dolorosa para Maria Luiza Martins. Apelidada de "Malu", viúva, 74, vivia uma vida agradável com os três filhos, Janaina, 46, Juliana, 44, e José Lucas, que teria 42 anos atualmente. A família, que havia perdido o pai anos antes, em 1996 e havia encontrado força e consolo em meio às dificuldades da perda. As filhas mais velhas de Malu estavam escrevendo suas próprias histórias e já caminhavam para a independência financeira, enquanto o caçula não conseguia manter estabilidade nos empregos, por conta de seus comportamentos. A perda do filho José Lucas foi outra situação que marcou uma nova interrupção da vida no dia a dia de Maria Luiza.

Ele era um rapaz alegre, carismático e educado, rodeado de colegas e pessoas que o amavam, mas, a partir dos 15 anos de idade, o jovem teve a acesso a drogas ilícitas e começou a fazer uso contínuo das substâncias. Desde então, suas irmãs tentaram ajudá-lo de diversas formas, entretanto, ele não aderia a nenhum tratamento, e só se envolvia cada vez mais com más companhias, "amigos" que apoiavam e acompanhavam o rapaz nessa jornada autodestrutiva.

E foi em 2004 que José Lucas morre vítima de assassinato em um posto de gasolina da região. Ele tinha apenas 22 anos na época do crime. Os dias, meses e anos que se seguiram foram marcados pela dor de uma mãe que não se conformava com a terrível perda dos homens da sua vida, seu marido e seu filho. O diagnóstico de depressão piorou consideravelmente a partir daquele fatídico domingo, e Malu e as filhas seguiam procurando entender e aceitar a tragédia. 

20 anos depois Malu vive em uma residencial para idosos e o ambiente a ajuda a tornar os dias mais fáceis.

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Malu e as filhas, Janaina e Juliana.

 

Tanto Maranhão, quanto Malu, tiveram suas vidas marcadas pela necessidade de recomeçar por caminhos diferentes. Ele, enfrentando a dor física e os desafios da recuperação após o acidente, e ela, aprendendo a lidar com o vazio deixado pela perda de um filho. Porém, apesar das cicatrizes que carregam, ambos encontraram forças para seguir em frente, mostrando que a resiliência está nos pequenos gestos do cotidiano, no apoio de quem está por perto e na capacidade de encontrar novos significados para a vida. Recomeçar não é esquecer, mas aprender a viver apesar das ausências e transformações, valorizando cada dia como uma nova oportunidade. 
 

 

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Após resultados do primeiro turno, institutos de pesquisa são criticados e vivenciam perda de credibilidade
por
Fernanda Fernandes e Giovana Yamaki
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26/11/2022

Após divergência entre o que apontavam as pesquisas eleitorais e os resultados das urnas no primeiro turno no estado de São Paulo, foi gerado uma grande repercussão negativa por parte dos bolsonaristas em relação à falta de credibilidade das pesquisas. Em contrapartida no segundo turno, os grandes institutos acertaram. Porém, ainda assim, a discrepância alimentou um discurso que vem há tempos sendo perpetuado por Jair Bolsonaro.

Após as apurações das urnas no primeiro turno, Tarcísio de Freitas havia recebido 42,32% dos votos, Fernando Haddad 35,70% e o até então governador, Rodrigo Garcia, do PSDB, 18,4%. Mas nos levantamentos, o candidato apoiador do presidente Jair Bolsonaro se apresentava sempre abaixo de Haddad.

No Ipec, o petista estava à frente com 41% dos votos válidos e o carioca com 31%. O Datafolha e o Atlas também apontavam para a mesma média de porcentagem dos votos válidos para Tarcísio. Enquanto Haddad aparecia com uma média de 39% dos votos.

Glauco Peres da Silva, professor do Departamento de Ciência Política da USP, acredita que esses erros enfatizam ainda mais a perda de credibilidade das pesquisas por uma parcela da população, que apoia o atual presidente do Brasil. Afinal, as pessoas esperam que as pesquisas acertem o resultado, mas esquecem-se de analisar também o procedimento delas. 

O incentivo para essa grande comoção contra as pesquisas surgiu de discursos de Jair Bolsonaro, que em diversas ocasiões afirmou que as pesquisas são fraudadas. Com isso, seus apoiadores agarraram essa narrativa e quando não recebem o resultado esperado por eles, começam a criticar o estudo e sua apuração. 

O professor explica que compreender uma pesquisa de opinião não é fácil e compara a tarefa a um exame de sangue. “Você retira uma parte do sangue para ver seu estado de saúde, ninguém analisa ele todo. A mesma coisa acontece quando você vai fazer uma pesquisa, não dá para ouvir todo mundo”, diz. Ele complementa afirmando que muitos não conseguem entender que são procedimentos estatísticos complexos e com várias dimensões envolvidas.

Adrián Gurza Lavalle, professor de ciência política da USP e editor-chefe da Brazilian Political Science Review, acredita que um dos motivos para ter ocorrido esse erro nas pesquisas é que alguns institutos utilizaram o Censo de 2010, enquanto outros trabalharam com a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), que é mais atualizada. “Aqueles que trabalharam com o censo de 2010 representaram os grupos de baixa renda e isso produziu efeito na representação desses grupos nos resultados.”

Rafael de Paula Aguiar, pesquisador do Núcleo de Estudos em Arte Mídia e Política, da PUC-SP, afirma: "Essa discrepância pode ser compreendida. De fato, as pesquisas não erraram”. O cientista político deixa claro que não dá pra falar que não teve discrepância nas pesquisas e no resultado eleitoral, mas elas precisam ser interpretadas junto ao comportamento eleitoral. 

Entre os fatores que interferiram no dia da votação do primeiro turno, ele lista que, primeiramente, existia uma porcentagem significativa de indecisos, que de última hora decidiram por um voto útil. Esses  votos foram para o candidato Tarcísio. Rafael também reforça que o fato de o político ter associado a sua imagem a do atual presidente Jair Bolsonaro, também interferiu na sua popularidade. 

Rosemary Segurado, cientista política e professora da PUC-SP, também faz essa pontuação. Ela explica que às vésperas da eleição eram visíveis, para o governo do estado de São Paulo, muitos indecisos, que não sabiam quem eram os candidatos e estavam com os olhos muito voltados apenas ao cenário nacional. A especialista aponta também que muitos eleitores de Bolsonaro optam por não responder às pesquisas, o que faz com que não consigam captar essa opinião.

Outro elemento importante citado por Aguiar é o de que a realidade do eleitor do Haddad e do eleitor do Tarcísio é diferente. A pesquisa Datafolha do dia 19 de setembro mostrou que Lula sustenta suas intenções de voto entre os eleitores mais pobres, com renda familiar de até 2 salários mínimos, obtendo 57% das intenções de voto desse grupo. Sendo assim, muitas vezes, o público petista que responde a pesquisa não vai às urnas por não ter condições de arcar com o custo da passagem. Essa problemática foi discutida, e para o segundo turno, todas as capitais do Brasil e mais 100 outras cidades ofereceram transporte gratuito para os eleitores.

Apesar de muitos especialistas políticos entenderem que esse estudo não tem como ser 100% certeiro, pelo fato de os eleitores mudarem de opinião e decidirem seu voto de última hora, manipulação e fraude foram palavras muito citadas por bolsonaristas ao se referir às pesquisas eleitorais. Uma grande parte da população, como citado acima, acredita que as pesquisas foram divulgadas visando favorecer os candidatos do PT. 

Resultados no 2º turno

No dia 30 de outubro, Tarcísio de Freitas, do Republicanos, foi eleito o governador de São Paulo com 55,34% dos votos válidos. Já Fernando Haddad, do PT, obteve 44,66%. O resultado foi o esperado de acordo com o que evidenciaram as pesquisas eleitorais, que apresentaram levantamentos semelhantes. As pesquisas analisadas foram: Ipec, Datafolha e Atlas Intel.

No último levantamento do Ipec, Tarcísio aparecia com 52% contra 48% de Haddad em votos válidos, ou seja, que não contam com brancos, nulos e indecisos. A pesquisa tinha uma margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos. Sendo assim, o resultado final poderia registrar 50% para cada um dos candidatos, ou 54% para Tarcísio e 46% para Haddad, esse segundo exemplo chegando bem perto da porcentagem das urnas. 

O Datafolha e a pesquisa Atlas apresentaram resultados semelhantes ao Ipec, também levando em consideração a margem de erro. No Datafolha, Tarcísio aparecia com 53% e o petista, com 47% dos votos válidos. No Atlas, o republicano tinha 52,2%, e Haddad, 47,5%. 

“As pesquisas eleitorais no segundo turno acertaram mais o resultado devido à população já estar mais decidida”, pressupõe Vera Lucia Chaia. Ela atua na área de ciência política, com ênfase em comunicação e comportamento político, ministrando aulas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). 

Para Gurza, a precisão nesse segundo turno se deu pelo menor número de abstenção, votos brancos e nulos. Ele diz que houve também ausência de voto útil e que o voto estava alinhado com as únicas opções em relação às quais os eleitores poderiam se manifestar na eleição. “No segundo turno, houve menos elementos de incertezas do ponto de vista meramente técnico.”

Devido ao maior acerto nesses resultados, houve menos manifestações em relação às pesquisas. Chaia diz que os políticos não as questionaram, dessa vez, pelo fato de terem sido eleitos pelo mesmo sistema eleitoral. 

O editor-chefe da Brazilian Political Science Review sugere como alternativa, após essas pesquisas de intenção de voto, que os principais institutos componham uma comissão para revisar os critérios que estão sendo aplicados. “É preciso averiguar as deficiências que esses critérios podem eventualmente estar introduzindo na aferição das intenções de voto.”

No entanto, Lavalle ressalta que pesquisa de intenção de voto serve para imaginar cenários futuros a partir da tendência das pesquisas produzidas e que os resultados podem realmente não coincidir. 

Criminalização dos institutos de pesquisa 

Com a repercussão negativa sobre a grande diferença entre os resultados das pesquisas e os resultados das urnas, os institutos entraram na mira dos governistas. No dia 6 de outubro, o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), sem critérios definidos, apresentou um projeto de lei que visa punir institutos de pesquisas eleitorais e seus contratantes quando os resultados de levantamentos não forem similares aos das urnas. 

O projeto propõe que os institutos que divulgarem pesquisas eleitorais publicadas 15 dias antes da data do pleito e que apresentem resultados diferentes, além da margem de erro, dos números apurados nas urnas devem ser punidos com penas de reclusão de até 10 anos e multa. Já no dia 18 do mesmo mês, a proposta foi aprovada no plenário da Câmara, tendo 295 votos favoráveis e 120 contrários. 

O projeto trata de forma radical a forma que o governo irá lidar com os institutos de pesquisa, e a medida pode trazer sérios danos à democracia do Brasil. 

Em relação a essa proposta, Aguiar comenta que é contraditório o governo apoiar um discurso de liberdade e ao mesmo tempo evitar que as pesquisas sejam feitas e divulgadas. Além de refletir sobre a importância das pesquisas para os próprios políticos, que precisam desse termômetro para dosar suas ações, propostas e campanhas. 

Rosemary reforça que a medida é uma tentativa clara de criminalizar as pesquisas eleitorais, “eles propõem punições que são até mais altas do que para os crimes hediondos. Criam um processo de deslegitimação que é o mesmo que eles fazem com as urnas eleitorais”. A professora julga que esse processo é perigosíssimo. “Não é criminalizando a ação dos institutos de pesquisa que iremos gerar um debate para que haja um aprimoramento das formas de coleta dessas opiniões.”

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Partido desponta com Tarcísio em São Paulo, observa poder no Congresso e ensaia aliança com futuro governo Lula
por
Beatriz Loss, Julia Rugai e Pedro Galavote
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26/11/2022

 

 

Gilberto Kassab em audiência na Câmara dos Deputados. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

 

Conhecido por uma notável facilidade de transição entre os governos, Gilberto Kassab, presidente nacional do Partido Social Democrático (PSD), foi uma peça chave nas eleições de 2022 e na campanha do governador eleito do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e, agora, caminha para alinhamento da sigla ao governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

 

Há quem admire sua facilidade de transição entre os governos. Mas há também aqueles que enxergam suas movimentações como um jogo nas sombras da política brasileira. Pode-se dizer que Kassab caminha nestes dois campos e é considerado um grande articulador político.

 

De vereador à ministro do Estado, Kassab ocupou diversos cargos na política brasileira e transitou não só pelo governo Bolsonaro (PL), mas também por Dilma (PT) e Michel Temer (MDB). Diz enxergar-se como um político de centro ideológico e ressalta que o partido tem dado conta de carregar um posicionamento coletivo. “O Centro do equilíbrio, ponderação, é exatamente a saída para este cenário polarizado e, historicamente, a preferência do eleitor brasileiro tem sido o centro”, pontua Kassab. 

 

A insistência por um posicionamento coletivo, visando a “unidade do partido” - como mencionado diversas vezes durante uma recente entrevista concedida para o programa Roda Viva, da TV Cultura - fez com que o ex-ministro segurasse, a todo custo, seu posicionamento final para o segundo turno das eleições presidenciáveis deste ano. O comportamento era previsível e, enquanto é visto por alguns integrantes do partido como o movimento certo, para nomes que vagam há tempos pela política brasileira configurou a “preferência pelo jogo nas sombras dos bastidores políticos.” 

 

Kassab sempre foi uma figura presente nos bastidores. Logo na fundação do PSD, quando questionado sobre a ideologia do partido, o ex-prefeito respondeu que não era um partido nem de direita, nem de esquerda, nem de centro. Ainda assim, o ex-prefeito diz que a insistência em “pinçar” esta frase é um equívoco. “Jamais disse que o partido não seria de direita, de esquerda ou de centro. Explicava que a definição desse posicionamento seria coletiva, como de fato ocorreu”, pontua o presidente da sigla. 

 

O especialista Francisco Fonseca, cientista político e professor da PUC-SP, afirma que “essa é uma resposta muito simbólica porque com isso ele estava querendo dizer ‘olha, eu vou me adaptando aos diversos governos.’ Por exemplo, ele foi ministro de Ciência e Tecnologia da Dilma e logo em seguida aderiu ao golpe de 2016 e trabalhou com o Temer.”

 

Homem de terno e gravata com pessoas ao redor

Descrição gerada automaticamente

Dilma Rousseff e Gilberto Kassab em convenção do PSD. Kassab e Temer reativando Conselho de Ciência e Tecnologia. Fotos: Jorge Willian/Agência O Globo e Walter Campanato/Agência Brasil

 

 

Nas eleições deste ano não escolheu apenas um lado. Passou toda a campanha negociando com o então candidato à presidência, Lula, mas também apoiou o candidato de Bolsonaro no estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, uma vez que seu vice na chapa é Felicio Ramuth, parlamentar do PSD. Além disso, o partido é o mesmo de Alexandre Kalil, que foi apoiado por Lula ao governo de Minas Gerais. 

 

“O Kassab é um político muito hábil de bastidores, muito gelatinoso, pragmático e que, na verdade, não contribui pra uma vida política em relação a programas de governo. Está com o governo de um modo geral pra ser um certo intermediário de um conjunto de negócios. Aquilo que se chama de centrão, são negócios”, avalia Fonseca.

 

Mesmo com um pequeno encolhimento da bancada da Câmara dos Deputados, em relação ao número atual, a sigla encabeçada por Gilberto Kassab se exercita para projeções futuras. Em 2018, contava com 34 deputados federais. Atualmente, a bancada tem 46 e, com a eleição deste ano, somam 42 deputados federais. O cenário no Senado é diferente e o PSD ocupa a segunda maior bancada da casa, com 12 senadores, atrás do PL. 

 

O movimento, que mira uma ampliação do partido, não é de agora e tampouco será considerado o bastante com os resultados de 2022. Durante as eleições municipais de 2020, a sigla já apresentava bom desempenho quando passou de 539 para 655 prefeituras, acumulando 116 a mais que as eleições de anteriores e se consagrando como mais vitoriosa. As diferentes fotografias de pleitos antigos, e do atual, reafirmam Gilberto Kassab como um dos caciques na política. 

 

A capilaridade nacional conquistada ao longo destes anos ganhou mais fôlego durante as campanhas das eleições de 2022. No entanto, a sigla não foi capaz de lançar um candidato próprio que arcasse com a competição.

 

 

A candidatura de Tarcísio

 

Eleito governador do Estado de São Paulo no segundo turno, o candidato Tarcísio de Freitas (Republicanos) teve como uma importante força motora de sua campanha a figura de Gilberto Kassab. 

 

“A candidatura de Tarcísio e este apoio, a meu ver, foi uma percepção antecipada”, explica o coordenador de ações sociais e sindicais do PSD, Ricardo Patah. Ele diz que para o nascimento desta conjuntura, os diálogos com o partido foram além da figura de Kassab. O personagem responsável pelo sucesso desta articulação, que desembocou na parceria entre Tarcísio e o ex-prefeito, é Afif Domingos. 

 

Coordenador de campanha do candidato pelo Republicanos, Domingos é também um dos fundadores do PSD e tem como característica o trânsito entre os diferentes governos. Participou do ministério da Economia do governo Bolsonaro ao lado de Paulo Guedes e, a partir de seus conselhos, embarcou na candidatura de Tarcísio de Freitas. 

 

Patah conta que a escolha envolveu muito diálogo, comportamento que marcou os caminhos de Kassab durante a pandemia na visita de diversos diretórios em diferentes estados. Liderada por Tarcísio, a chapa foi uma das primeiras a definir o vice, Felício Ramuth, ex-prefeito de São José dos Campos, que trocou o PSDB pelo PSD no início deste ano. 

 

Kassab e Tarcísio

Kassab, Tarcísio e seu vice, Ramuth. Foto: Divulgação/Twitter

 

“Aqui em São Paulo o PSD definiu seu apoio à candidatura do Tarcísio de Freitas pois ele é o mais qualificado, honesto e bem preparado para fazer o Estado avançar, se desenvolver e melhorar a vida das pessoas que aqui vivem”, pontua Kassab ao Contraponto. Ele avalia que, diferente do PSDB, o PSD conseguiu se renovar e não enfrenta muitas dificuldades nas urnas.

 

Através de trocas de mensagem, o presidente nacional do PSDB, Marco Vinholi, comentou que enxerga Kassab como um grande articulador político e influente no cenário atual.

 

Mesmo ponderando o jogo de poderes que acontece, agora, no Estado de São Paulo, Vinholi diz que não acredita que o PSDB irá se dissipar e a articulação do PSD com o Republicanos não inviabiliza a restauração dos tucanos nos próximos anos. 

O especialista Francisco Fonseca pondera que o PSDB ainda tem muitas prefeituras no estado e que, formalmente apoiando Tarcísio, estaria participando do poder. Em um plano nacional, o partido míngua e perde protagonismo. 

“Busquei incessantemente por uma candidatura própria, e depois mesmo fora do nosso partido”, pontua Kassab. Quando questionado sobre a tentativa de candidatura, com o nome do atual presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD), o ex-prefeito paulista diz que não conquistou o apoio necessário para decolar e elogiou o desempenho de Pacheco à frente do Senado. “Vejo sua reeleição [ao Senado] como algo natural (...) e confio que será uma escolha pelo desenvolvimento do Brasil”, complementa. O nome de Rodrigo Pacheco é visto, segundo assessores do partido, como “pacificador” para o futuro. 

 

Segundo assessores da campanha de Tarcísio, o PSD já está empenhando esforços para a transição de governo no Estado de São Paulo. Em nível nacional, Kassab também já afirmou em entrevistas que a sigla vai apoiar o governo de Lula, mas quer realmente fazer parte com algumas condições. O pessedista quer indicar dois nomes para compor ministérios e quer se ‘sentir governando’.

 

“O ideal, para próximos pleitos, é uma pacificação. Acredito que com a vitória de Lula, teremos menos hostilidade”, diz Ricardo Patah, também presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Patah comenta sobre as costuras nacionais que o partido fez, com diferentes aspectos políticos e enfatiza que o partido é um dos “instrumentos fundamentais” para a pacificação política do Brasil. 

 

 

PSD como peça chave no futuro governo

 

Como bem coloca Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Inteligência Internacional da FGV, Kassab pode ser entendido como um “grande termômetro da política brasileira''. Sendo um entendedor dos ventos políticos, soube observar em quais lugares ainda há espaço para uma atuação mais assertiva, ao mesmo tempo que seus dirigentes foram liberados para apoiar tanto Lula, quanto Bolsonaro durante o segundo turno.

Com um saldo positivo na eleição de Tarcísio em São Paulo, agora, o presidente do PSD projeta nacionalmente um alinhamento mais direto com Lula.  “Kassab sabe que tem muito a pedir ao Lula, porque sabe que o PT precisa bastante do PSD”, comenta Paz. De acordo com o pesquisador, a sigla de centro será uma peça chave para o futuro governo. “A configuração do próximo congresso é difícil e vai demandar muita habilidade política para poder governar. Não vai dar para manter uma minoria”, completa.

Além de um projeto que possibilita manter Pacheco na presidência do Senado, a sigla procura por espaço para crescer. “É um momento propício para isso porque há uma mudança interessante no cenário da política nacional”, diz Leonardo.

O pesquisador da FGV explica que, enquanto os principais partidos brasileiros se desintegram - ainda que lentamente - os que não eram considerados protagonistas estão ficando maiores. O terreno é fértil para observar quais destes partidos, de um centrão que sempre foi composto por siglas médias, vão ganhar desenvoltura.

“O que está em jogo é saber quem vai compor melhor com o governo federal e quem vai ganhar mais plataforma”, comenta. Esta não é uma jogada exclusiva de Kassab. Valdemar da Costa Neto (PL), Ciro Nogueira (PP) e Luciano Bivar (União Brasil) fazem o mesmo com um possível aceno a Lula.

Neste momento, partidos que compõem o conhecido “centrão” são cada vez mais necessários para qualquer tipo de governabilidade. O PSD de Kassab está na dianteira, mas todos eles ganharam uma estatura diferente e começaram a atuar para além do antigo “blocão”. “Eles podem começar a brigar mais entre si, para ver quem vai pegar a maior fatia do poder”, finaliza.

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Novo Congresso deve tornar jornada do ex-presidente ‘missão impossível’; orçamento apertado e emendas de relator minam governabilidade petista
por
Bruno Hideki Kawagoe e Isabela Mendes
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20/11/2022

Em 2002, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) comemorava não somente o resultado das urnas, mas também seu aniversário — dia 27 de outubro. Com aproximadamente 53 milhões de votos, o Partido dos Trabalhadores conquistava, pela primeira vez, a presidência da República. Foi inédita a ascensão de um líder da classe operária ao cargo mais importante do país. Começava, ali, o legado do governo petista, que não apenas reelegeu Lula em 2006, como também perpetuou seu poder com a eleição de Dilma Rousseff (PT), então ministra da Casa Civil, em 2010 e 2014, sucessivamente.

Desde então, o torneiro mecânico formado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) enfrentou acusações de corrupção que culminaram na sua prisão, em abril de 2018. A absolvição, porém, veio com a comprovação de parcialidade no julgamento do caso conduzido pelo ex-juiz Sergio Moro, garantindo, assim, sua elegibilidade.

As duas candidaturas têm características semelhantes. Em ambos os pleitos, Lula formou coligação com diversos partidos da ala progressista, e emplacou como vice caciques da centro-direita brasileira: José Alencar, do PL, em 2002, e Geraldo Alckmin, recém-migrado para o PSB, em 2022 — o ex-tucano foi seu adversário nas eleições de 2006 e representa a velha guarda pessedebista, tendo sido um dos fundadores do partido em 1988.

Vinte anos atrás, o que estava em jogo era a vitória de um partido ou de outro e, claro, se a elite empresarial ganharia mais ou menos dinheiro. À época, aquele Brasil vinha de dois governos Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e tinha certa maturidade nas questões monetárias e compromissos fiscais. Em outubro daquele ano, o dólar, por exemplo, era negociado a R$3,85. Lula herdou, naquela ocasião, um país com reconhecimento internacional, economia reorganizada e uma democracia de massas em consolidação. 

Apesar de divergências políticas, tanto FHC quanto José Serra reconheceram e cumprimentaram a vitória do petista, ao contrário do atual chefe do Executivo, Jair Bolsonaro (PL). As principais diferenças estão no contexto de cada campanha. No recente processo eleitoral, o futuro da democracia esteve gravemente ameaçado por incitação direta do presidente, que desafiou as instituições e desacreditou da integridade das urnas eletrônicas incessantemente.

Pedras, pedregulhos e penedos no caminho

Lula, diferentemente de 2002, não encontrará terras férteis para plantar como da primeira vez em que foi eleito. Apesar do ex-presidente sempre ter sofrido resistência do empresariado, a eleição de Bolsonaro, em 2018, figurou uma guinada do Brasil à extrema-direita, em sintonia com o cenário político internacional que proclamou Donald Trump presidente da República dos Estado Unidos em 2016. 

Bolsonaro, que foi por 28 anos um deputado federal de pouco destaque, capturou os holofotes durante a votação do impeachment da ex-presidente Dilma, em que homenageou Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-comandante do DOI-CODI em São Paulo durante o período da ditadura militar. Dilma foi presa e torturada pelo regime militar quando era ainda uma estudante. Naquela inserção, o atual mandatário começou a pavimentar seu caminho rumo ao Palácio do Planalto, atraindo a atenção da população conservadora descontente com o legado petista, que agonizava em crise.

Impulsionado pelas redes sociais, Bolsonaro se tornou um fenômeno digital assim como Trump e, em março de 2016, anunciou sua pré-candidatura à presidência da República pelo Partido Social Cristão (PSC). Contudo, sua chapa presidencial foi lançada oficialmente em 2018 pelo extinto PSL. Apesar de estar na vida pública há mais de três décadas, Jair Bolsonaro se elegeu naquele ano com 55,1% dos votos válidos contra o ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT), inflamando o discurso de um candidato “antissistema” e contra a velha política. Foram mais de 57 milhões de votos que marcaram a derrocada petista.

Em 2022, quatro anos depois, com Lula livre da prisão e das sentenças que o condenaram, o Partido dos Trabalhadores apostou na popularidade do ex-presidente para derrotar a tragédia bolsonarista, marcada sobretudo pela negligência durante a pandemia da covid-19, que deixou mais de 600 mil mortos. Pesou, também, a acentuação do desmatamento da Amazônia, o aumento do desemprego e da precarização do trabalho e as tesouradas em áreas como Saúde e Educação. 

No pleito eleitoral do mês passado, o mais acirrado desde a redemocratização brasileira, o povo, após muito ser desestimulado, foi às urnas mandar a galera do “é melhor Jair se acostumando”, Jair embora, um marco da ressurreição do Lula e do PT, muito rejeitados pela classe média e pela elite nacional. No entanto, apesar da vitória suada (50,9% a 49,1%) contra quem tinha a máquina pública nas mãos – e não teve pudor de usar a seu favor – os motivos de preocupação sobram para contar. Isso porque a renovação do Congresso Nacional não trouxe tanta novidade assim. 

O partido do chefe do Executivo derrotado, o PL, ampliou sua bancada na Câmara dos Deputados em 23 cadeiras – passou de 76 para 99. No Senado, conquistou 7 assentos a mais.  Já a federação PT-PCdoB-PV, do presidente eleito, faturou 12 postos na Câmara, passando de 68 para 80 deputados, mas elegeu apenas 2 senadores, restando com 9 parlamentares na Casa Legislativa. Portanto, para aprovar Projetos de Lei, Propostas de Emenda à Constituição ou novos Programas de Governo, Lula terá que negociar – e isso significa ceder aos caprichos do Centrão, bloco político que forma maioria no Legislativo, à parte dos partidos de oposição alinhados a Bolsonaro. Além disso, a pressão dos parlamentares para a manutenção das emendas de relator, coração do Orçamento Secreto de Bolsonaro, está mais forte do que nunca. Por outro lado, a grande mídia e os eleitores estão vigilantes e cobram medidas duras para acabar com o mecanismo.

A posse de Lula como presidente da República ocorrerá oficialmente apenas no dia 1º de janeiro de 2023. Porém, já foi dada a largada para as conversas e negociações. O petista tem dialogado com Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, a fim de fazer valer seus discursos de campanha. O principal interesse em jogo atualmente é a chamada PEC da Transição, que visa garantir orçamento para o pagamento dos R$ 600 prometidos de Auxílio Brasil – que voltará a ser Bolsa Família. 

A verba para cumprir a promessa da manutenção do valor do benefício, porém, não está disponível no orçamento de 2023 elaborado pelo atual governo, que limita o Auxílio a R$ 405. Por isso, a PEC propõe retirar permanentemente o benefício do chamado Teto de Gastos, tema sensível para o mercado financeiro. A argumentação é que retirando o programa social do Teto, Lula estaria agindo com irresponsabilidade fiscal. Para os operantes do capital financeirizado, despesas como essa são inaceitáveis e causariam um “rombo fiscal” que vai “quebrar o Brasil”. 

Por isso, a cada vez que Lula falar em acabar com a fome ou com o Teto de Gastos, o mercado, certamente, irá reagir, como fez durante seu discurso no Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB) na semana passada. Na ocasião, a B3, bolsa de valores brasileira, caiu 3,35%, encerrando o dia em 109.775,46 pontos. O dólar também oscilou: foi a R$ 5,40, alta de 4,09%. No entanto, esse mesmo mercado, à flor da pele com as “irresponsabilidades fiscais” do ex-torneiro mecânico, não deu uma única balançada com os R$ 795 bilhões fora de Teto durante os quatro anos de governo de Jair Bolsonaro. Portanto, cabe dizer que no meio do caminho de Lula, terão pedras, pedregulhos, penedos e tudo que tiver direito.

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A bancada das mulheres da Câmara de São Paulo ganha mais 6 parlamentares, mas presença do gênero feminino em espaços de poder ainda é tímida
por
Anna Beatriz Barreto da Matta e Vanessa Orcioli
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21/11/2022

A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aumentou sua bancada feminina de 19 mulheres para 25 candidatas eleitas em 2023. O número de deputadas no órgão estadual cresceu 31,57%. Das definidas pela população nas urnas, 13 foram reeleitas e outras 12 ou inauguraram pela primeira vez na Casa ou voltaram ao cargo após um ou dois mandatos fora.

Neste ano, segundo o veículo de comunicação Gazeta de S. Paulo, dos 2.059 nomes nas urnas disputando por uma vaga na Alesp, apenas 677 eram mulheres, o que representa 33% do total. O crescimento feminino nos espaços de poder ainda é tímido, porém, a legislatura de 2023-2026 terá a maior representatividade feminina da história da Assembleia. As deputadas eleitas no último dia 2 de outubro representam 27% do total de 94 cadeiras no Legislativo estadual. 

Embora a representatividade feminina tenha aumentado nas cadeiras do Parlamento Paulista, os dados apurados pelo TSE mostram que ainda existe uma alta sub-representatividade feminina. Se por um lado elas representam 52% da população brasileira, no outro extremo, ocupam apenas 12% das prefeituras, somente 15% do Congresso Nacional e nem 4% nos governos estaduais. Apesar de serem a maioria do eleitorado, o número de candidatas (33,6%) é quase a metade do número de candidatos homens (66,4%).

Divulgação: Carla Morando
Divulgação: Carla Morando

Partidos e suas representantes

A atuação do Legislativo estadual ficou em evidência por questões de gênero nos últimos anos. Na visão da cientista política e professora da PUC-SP Rosemary Segurado, as parlamentares eleitas souberam explorar os últimos acontecimentos polêmicos da Câmara em suas campanhas. “Em algumas campanhas foi possível notar a articulação dessas discussões importantes em relação a violência contra as mulheres e, principalmente, a violência política contra as mulheres.”

Liderando as três mulheres mais bem votadas para a Câmara neste ano, a deputada Paula Nunes dos Santos, da Bancada Feminista do PSOL, obteve 259 mil votos. Em seguida, Ana Carolina Serra (Cidadania) e Bruna Furlan (PSDB) ficaram com cerca de 190 mil votos cada uma. As parlamentares eleitas são novas no órgão estadual, e tirando Furlan, que já tinha um cargo político de deputada federal, Nunes e Serra são estreantes na política. 

Divididas por 13 partidos, as parlamentares eleitas foram contabilizadas sendo 5 do Partido dos Trabalhadores - esse com maior número de mulheres para 2023 na Alesp - 4 do Partido da Social-Democracia Brasileira, e 4 do Partido Livre. 

Em conversa com o Contraponto Digital, a deputada estadual Carla Morando enxerga que seu partido, o PSDB, equilibra a inserção feminina na política. “Sempre deixaram espaço para a presença de mulheres dentro do partido. Foram muitas as parlamentares que ocuparam quadros de primeiro escalão no governo do estado comandado pelo PSDB.

Morando contempla que as mulheres vêm sendo combativas e estão conseguindo conquistar cada vez mais espaços dentro do poder público. A deputada afirma que o interesse feminino pela política vem aumentando gradativamente. 

“A mulher já vem buscando cada vez mais a política. Esse processo vem acontecendo desta maneira, pois as bancadas femininas têm sido propositivas em suas ações, fiscalizando o debate no Legislativo e Executivo”, destaca a parlamentar.

Em um panorama geral, a sociedade tem reconhecido esse aspecto da eleição de mulheres para os parlamentos, bem como a nomeação em cargos de administrações públicas vem aumentando. “O atual momento do Brasil e Estado tem mostrado a preocupação de todos com a efetividade das ações, diminuindo esse tipo de comportamento. Ainda é necessário seguir trabalhando bastante para avançar ainda mais”, diz Morando

Para a jornalista, cientista política e pesquisadora em Comunicação e Política na Sociedade do Espetáculo, da Cásper Líbero, Deysi Cioccari, as mulheres tendem a ser combativas no campo das ideias, mas ela acredita que há certo respeito por serem minoria e um sentimento de união que existe também entre as mulheres. “O embate pode ser muito no campo ideológico, como tem que ser, mas jamais para aquele confronto que a gente vê na ala masculina mesmo, de agressão simbólica, verbal. Isso eu não acredito. Mas no campo das ideias é sempre a oposição democrática”, pontua Cioccari. 

Segundo Cioccari, um dos confrontos no papel da mulher na política ocorre devido à ligação instantânea da imagem feminina à pauta feminina. “Quando elas entram na política, parece que não conseguem ser políticas se não for longe do feminino e isso acaba afastando-as da participação política, não só da Alesp, mas como um todo.”

Cioccari afirma não ver as mulheres em pé de igualdade com os homens para discutir questões econômicas ou orçamentais devido ao machismo e misoginia instaurados na política brasileira. Essa diferença se dá também pela própria Constituição da Alesp. “Outro ponto divergente ocorre na estruturação das bancadas, quando as bancadas são femininas, há uma conversa maior, quando as mulheres discutem política, a busca é pelo entendimento. Já quando os homens discutem política, há uma certa busca pelo dissenso.”

Deysi Cioccari | Foto: Reprodução/ LinkedIn
Deysi Cioccari | Foto: Reprodução/ LinkedIn 

Crescimento da Bancada Feminina nos últimos anos

Em 2014, a Câmara contava com apenas 11 mulheres eleitas. Já no ano de 2018, o número de parlamentares femininas subiu para 19. Essa quantidade de mulheres na composição da Casa já era considerada uma marca histórica. Agora, com mais 6 deputadas eleitas, a Assembleia paulista teve um aumento de 31, 57% da representação feminina no órgão estadual. 

“O crescimento ainda é bastante lento, ainda que a gente possa e deva comemorar um aumento de representatividade feminina, não podemos esquecer que ainda estamos muito longe da paridade e da igualdade de condições”, afirma a advogada eleitoral Paula Bernardelli. 

Paula Bernadelli | Foto: Reprodução/ LinkedIn
Paula Bernadelli | Foto: Reprodução/ LinkedIn 

Esse tardio e tímido avanço decorre de um cenário influenciado por diversos fatores, como pontua Bernardelli. “Existem partidos que, em regra, têm baixíssima democracia interna, um ambiente político ainda muito machista e com muita violência política de gênero, e uma sociedade muito conservadora com relação aos papéis de gênero, que ainda não vê com bons olhos a mulher fora do ambiente doméstico e disputando espaços de poder”, diz.

Porém, em um panorama geral, a advogada enxerga com bons olhos a questão de votar e eleger mulheres, que têm ganhado destaque a cada eleição. De acordo com Bernardelli, a sociedade brasileira se encontra em um cenário mais positivo para as mulheres que lançam suas candidaturas.

Rosemary Segurado | Foto: Divulgação
Rosemary Segurado | Foto: Divulgação 

 

Legislativo e incentivo da participação das mulheres na política

Desde a década de 90, têm sido implementadas regras eleitorais com o objetivo de aumentar a quantidade de mulheres, tanto candidatas como eleitas, em eleições proporcionais. Entre elas, está a Lei eleitoral 9504/97, estabelecendo as cotas de gênero nas candidaturas. “A reserva de cadeiras no Parlamento parece ser a medida com resultados mais imediatos que poderia ser adotada. Para além e independentemente dela, são necessárias políticas de incentivo que efetivamente alterem a estrutura machista da política, protegendo e acolhendo mulheres que se lançam nesses espaços”, frisa a advogada Paula Bernardelli.

Outra lei criada para apoiar esta representatividade das mulheres na política é a Lei 12.034/2009, que transformou obrigatório o preenchimento do percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas. 

A PEC 18/2021, apresentada pelo senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e com o apoio de outros 28 senadores, procura garantir que as candidaturas femininas sejam efetivamente financiadas pelos partidos políticos. A proposta, que tem como relator o senador Nelsinho Trad (PMDB-MS), insere na Constituição uma regra que foi introduzida em 2015 na Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096, de 1995): a reserva mínima de 5% do fundo partidário para a criação, manutenção e promoção de campanhas de mulheres na política.

“Quando se luta por mais mulheres na política é natural e esperado que o resultado seja um aumento de mulheres em todos os espectros políticos. As políticas de incentivo ao lançamento de mulheres trazem vantagem a todos os partidos. A ideia da luta por mais mulheres é justamente que mulheres são diversas e podem ser representantes políticas de pessoas e pautas diversas, assim como são os homens”, pontua Bernardelli.

Gabriela Rollemberg | Reprodução ABRADEP
Gabriela Rollemberg | Reprodução ABRADEP

Caminhos que incentivam transformações

Contudo, quanto mais mulheres estiverem nos espaços de poder, mais possibilidade há de se eleger parlamentares que lutam pelo direito das mulheres. “Ainda temos um caminho muito longo pelo aumento dessa representação das mulheres e acredito que isso expressa também muito sobre como é a dinâmica, tanto política quanto eleitoral, nas regiões do país”. Ela afirma que não há mais como usar as mulheres “como laranjas”,  ou seja, colocarem candidaturas que não vão ser efetivas apenas para cumprir a questão eleitoral.  

Para possibilitar a diminuição da falta de equidade e igualdade na distribuição de poder, a advogada e cientista política Gabriela Rollemberg enxerga como fundamental que a sociedade olhe para dentro dos partidos políticos.

“Precisamos notar as governanças desses partidos, para como eles destinam os seus recursos, do fundo partidário, do fundo eleitoral. E, precisamos controlar e cobrar mais coerência deles, para que se crie, de fato, um estímulo para aprimorar o que acontece hoje”, afirma a advogada. 

Do ponto de vista de Rollemberg, “hoje, basicamente, o destino dos recursos é definido pelo presidente do partido, no máximo, ou com o tesoureiro. E são sempre homens e homens brancos que definem isso. E, obviamente, essa questão tem todo um peso na perpetuação do poder dentro do partido, na forma de distribuição dos recursos e na conversão de candidaturas em mandatos”.

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Candidatas a deputada federal pelo Estado de São Paulo e especialistas explicam a importância do enfoque em políticas públicas voltadas para as mães
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Helena Sereza, Hiero de Lima e Julio Cesar Ferreira
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26/11/2022

As mulheres brasileiras representam mais de 51% da população, de acordo com o IBGE. Porém, apenas 15% do Congresso Nacional é formado por mulheres, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Para especialistas, a falta de representatividade feminina entre os parlamentares cria uma lacuna para a implementação de políticas públicas focadas na maternidade em que as mulheres sejam autoras. 

Isto é comprovado ao entrar no site da Câmara dos Deputados e pesquisar pelas propostas legislativas a partir da palavra “maternidade”, é possível notar que, muitas são de homens e poucas de mulheres.  

As deputadas federais candidatas à reeleição pelo Estado de São Paulo, Sâmia Bomfim (Psol), Renata Abreu (Podemos) e Carla Zambelli (PL) são algumas das mulheres que trazem a pauta para dentro do Congresso.

Para a candidata de centro Renata Abreu, a parentalidade é uma pauta priorizada apropriadamente por todo o Congresso Nacional. Zambelli, por outro lado, acredita que muitos políticos não entendem sobre a maternidade. Já Sâmia Bomfim adiciona, dizendo que “de fato, existem poucos projetos voltados para essa realidade: da mãe, da mãe trabalhadora, da mãe solo”.

A doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Carla Cristina Garcia, argumenta que vivemos numa situação em que as mulheres têm uma atuação política pouco reconhecida, porque o “Estado é profundamente patriarcal”. Portanto, como a maioria dos políticos são homens, grande parte das legislações, mesmo as voltadas para as mães, são pensadas e formuladas por eles. 

Já Maíra Kubik, doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professora de Teorias Feministas na Universidade Federal da Bahia (UFBA), complementa apontando a divisão irregular de tarefas domésticas como motivo que afasta as mulheres da política. 

“As parlamentares mulheres estão o tempo todo tendo que lidar com a sobrecarga de trabalho, inclusive de trabalho mental, com o acúmulo de tarefas e funções”, diz, em entrevista à CNN Brasil.

Por outro lado, as expectativas do papel das legisladoras variam de acordo com seus partidos: “Ter uma mulher como legisladora, deputada, senadora, não significa que leis sobre igualdade de gênero vão imediatamente aparecer. Isso é universalizar o comportamento feminino”, argumenta Garcia. 


Mães e o mercado de trabalho

Uma pesquisa realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) com 247,4 mil mães evidenciou que metade das mulheres inseridas no mercado de trabalho são demitidas até dois anos depois que acaba a licença maternidade. A maior parte das saídas se dá sem justa causa e por iniciativa do empregador.

“Dentro da legislação brasileira, os direitos são iguais para homens e mulheres. Entretanto, na prática, por conta da divisão sexual do trabalho, as mulheres acabam sendo as principais responsáveis pelos cuidados dos filhos e as que ficam mais sobrecarregadas com essa tarefa”, explica a advogada Ana Paula Braga, sócia fundadora da Braga & Ruzzi Sociedade de Advogadas, primeiro escritório do Brasil especializado em direito das mulheres e desigualdade de gênero. 

Por Braga lidar diariamente com esses temas, ela conta que as áreas em que mais recebem demandas relacionadas à maternidade são a trabalhista, família e penal, especialmente em processos judiciais que tangenciam ou tratam diretamente sobre o tema, como a dispensa discriminatória e o desrespeito à licença maternidade. 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 54,6% das mães de 25 a 49 anos que têm crianças de até três anos em casa estão empregadas. A maternidade negra, nesta mesma situação, representa uma taxa ainda menor: menos da metade está no mercado de trabalho (49,7%).


Mães solo 

De acordo com o IBGE de 2018, há mais de 11 milhões de mães solo no país, sendo 61% delas mulheres negras. Também de acordo com o instituto, 63% dessas famílias são pobres. 

Dados levantados pelos Cartórios de Registro Civil do Brasil (Arpen) a pedido do jornal O Globo mostram que, nos últimos cinco anos, houve um aumento de 1,2% no nascimento de bebês sem o nome do pai nos documentos. No primeiro semestre deste ano, nasceram 1.313.088 bebês e, destes, 86.610 não têm o sobrenome paterno. No mesmo período de 2018, foram 1.452.161 recém-nascidos, dos quais 78.798 ficaram sem o nome do pai.

Para as mães chefes de família, a única medida feita para elas foi o programa de assistência financeira que garantiu que elas recebessem o dobro do valor, como foi o caso do Auxílio Emergencial que, durante a pandemia, chegava a R$ 1.200 mensalmente. Contudo, o Auxílio Brasil para as mães deixou de ter esse valor duplicado em novembro de 2021.

Impossibilitadas de trabalhar por conta de diversos fatores sociais, as mães inscritas no Benefício de Prestação Continuada (BPC) também não são permitidas de ter acesso a outros programas de seguridade social. Além disso, mais recentemente, tiveram o acesso ao Vale Gás dificultado por parte do Governo Federal. Treze mil mães solo estão cadastradas no BPC e somente uma foi amparada pelo programa Vale Gás. 

“Como a raça constitui classe no Brasil, são majoritariamente as mulheres negras as afetadas”, retoma Maíra, explicando que essa realidade impacta especialmente as mulheres da classe trabalhadora e aquelas que não possuem meios para colocar seus filhos em instituições particulares ou arcar com salários de babás. 

Hoje, há um Projeto de Lei de autoria masculina em tramitação na Câmara dos Deputados, que institui os Direitos da Mãe Solo, prevendo o dobro de benefícios, prioridade em creches, cotas mínimas de contratação em empresas e acesso a crédito. O PL 3. 717/2021 criado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM)  beneficia mulheres chefes de família que, segundo o autor e a relatora Leila Barros (Cidadania-DF), ficaram ainda mais vulneráveis após a pandemia. 


Saúde e maternidade

Os principais projetos levados ao Congresso envolvem a questão médica da maternidade. Do direito ao tratamento inicial custeado pelo Estado até a garantia de um parto saudável, a segurança das mães na hora da concepção é um dos tópicos mais citados em projetos de leis levados ao plenário.

Contudo, não há nenhuma lei federal ou estadual em São Paulo que puna a violência obstétrica. No país, apenas oito estados possuem alguma criminalização contra tais formas de abuso.

Em maio de 2019, o Ministério da Saúde publicou uma nota técnica contrária ao uso da expressão, afirmando que "o Conselho Federal de Medicina entende que o termo 'violência obstétrica' é inapropriado, devendo ser abolido, pois estigmatiza a prática médica e interfere de forma deletéria na relação entre médicos e pacientes". Porém, alguns meses depois, o conselho voltou atrás e reconheceu o direito das mulheres de denunciarem a violência durante o parto. 

No Brasil, 45% das mulheres que têm filhos no Sistema Único de Saúde (SUS) sofrem violência obstétrica. Em contrapartida, somente 30% dessas mulheres sofrem com o problema em hospitais privados. Os dados são do Nascer no Brasil, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de 2012. 

Melissa de Oliveira Pereira, Doutora e Mestre em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, explica a importância de programas envolvendo a maternidade que entendam a diversidade entre as mães.

"Mesmo as políticas públicas voltadas ao que é dito 'mulher' tem muita dificuldade de entender a multiplicidade do corpo feminino", exalta. "As políticas públicas precisam avançar, e muito, em relação às mulheres mães”. 

Melissa também explica que muitas mães amparadas pelo sistema de saúde têm demandas que saem do âmbito clínico, e que a grande maioria das mulheres precisam de um encaminhamento a centros de serviço social, por exemplo. Ela também ressalta o valor de espaços onde as crianças possam ficar enquanto as mães procuram atendimento médico. "Muitos serviços de saúde funcionam das 8h às 19h e as mulheres não têm tempo e acabam não conseguindo procurar ajuda médica".


Candidatas e suas propostas

Dentre as candidatas entrevistadas, Sâmia Bomfim é a que mais apresenta políticas públicas voltadas para as mães. Um exemplo é o PL 4.389/2021, que fala sobre a escolha de métodos contraceptivos. Há ainda um projeto da deputada que propõe o acolhimento de gestantes e mães de crianças e adolescentes em ambiente universitário, e outro que torna obrigatório a instalação de fraldários em ambientes públicos e privados.

Carla Zambelli, por sua vez, apresenta o PL 3.635/2019, criado em conjunto com Janaína Paschoal (PRTB), que dá a liberdade para a mulher optar pelo parto cesariano a partir da 39ª semana de gestação. 

Já Renata Abreu tem, em sua trajetória, o PL 8.702/2017, que estabelece que a contagem da licença maternidade seja suspensa, a critério da mãe, em caso de internação de seu recém-nascido, e retomada após a alta hospitalar. Além disso, ela defende a ampliação da assistência à gestante e à mãe no período pré e pós-natal.

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