Quando o Programa Universidade para Todos (PROUNI) foi lançado no longínquo 2004, a expectativa do governo de Luiz Inácio Lula (PT) era de que ele trouxesse mais equilíbrio na quantidade de alunos de classe alta e de classe baixa nas universidades do Brasil. Para além disso, era também uma tentativa de reparar o escanteamento histórico que a população pobre, principalmente a negra, teve no país. Era entendido que com a educação, os pobres, que na época representavam 33,2% % da população da época, teriam a oportunidade de crescer financeiramente e socialmente no Brasil.
No primeiro processo seletivo de bolsas, a quantidade de vagas ofertadas era baixa, um pouco mais de 95 mil. Perto dos 184 milhões de brasileiros que viviam nessa época, a quantidade de bolsa era uma unha perto da desigualdade que existia. Porém, com o sucesso do programa, o número de ofertadas foi aumentando gradativamente com o passar dos anos.
Em 2006, foram 109 mil bolsas. Em 2010, quando o programa completou 5 anos de implementação, foram 152 mil. Em 2019, ano pré-pandêmico, a quantidade de bolsas saltou para quase 250 mil. Enquanto isso, milhões de estudantes de classe baixa foram se formando e ascendendo socialmente por conta dessa política de estado. Ou seja, a expectativa de 2004 virou realidade.
Um dos exemplos mais notórios dessa mudança de vida que o estudo permitiu foi da atual comentarista da TV Globo, Ana Thais Matos. Filha de empregada doméstica, Ana Thais conta que vivia em uma situação que não era alarmante, mas era de insegurança financeira. "Minha família tem uma origem humilde, bem pobre mesmo. Minha mãe Francisca era empregada doméstica, vendia bandeiras de times no estádio do Pacaembu e cuidava de mim e dos meus cinco irmãos."
Atualmente, ela é uma das principais comentaristas da maior emissora de televisão da América Latina. Em 2022, fez história: foi a primeira mulher a comentar os jogos do Brasil em uma Copa do Mundo Masculina de Futebol. Ao lado de Galvão Bueno e o ex-lateral Junior, ela acompanhou de perto a campanha do Brasil no Qatar. Ana Thais fala que se não fossem os estudos, não conseguiria chegar lá.
"Eu devo tudo a minha força de vontade, claro, mas também a oportunidade que me foi aberta há 16 anos, em 2007. Se eu não tivesse entrada na faculdade, possivelmente não teria isso conquistado tudo isso na minha vida."
Ela lembra que quando passou na universidade, quase caiu da cadeira, pois não estava esperando a aprovação na PUC-SP. "Também tinha feito inscrição no Prouni, porque estudei a minha vida toda em colégio público. Eu estava na praia, em Itanhaém, triste, porque todas as minhas amigas já tinham passado na faculdade. Eu fiquei para trás... Até entrei numa lan house para mandar um e-mail para o meu irmão, perguntando se eu poderia morar com ele em Florianópolis para recomeçar minha vida. Quando abri, tinha uma mensagem da PUC (Pontifícia Universidade Católica) me avisando que eu tinha sido aprovada para uma bolsa através do Prouni para jornalismo. Eu quase caí da cadeira", lembra a comentarista com emoção.
Hoje, surfando na onda do sucesso, a comentarista manda um recado claro para as próximas gerações: "não deixem de estudar. Você que é de classe mais baixa, não pense que é incapaz, têm várias formas de entrar na universidade. Tem o ProUni, tem o FIES, enfim. Se eu consegui, você também pode.", finaliza Ana Thais.
LICENÇA POÉTICA - AO ALTO E AVANTE
Agora saio da terceira pessoa, do distanciamento jornalístico e me incluo nessa história. Sei que não é praxe das redações de jornais o redator colocar o seu ponto de vista em uma matéria informativa. Porém, é um assunto que mexe tanto com o meu coração e meu ímpeto que peço desculpas aos deuses do jornalismo e solicito, unilateralmente, essa licença poética para rasgar as tradições da profissão.
Digo para você, caro leitor, que as próximas gerações de prounistas têm em quem se inspirar. Não necessariamente precisa ser pessoas que estão na mídia, no vídeo, em rede nacional. Pode ser gente do nosso cotidiano. O vizinho, o colega de empresa, o primo de um grande amigo. Felizmente programas de ascensão social colou no Brasil, embora exista críticas daqueles que lutam para manter o sistema opressor de pobres desse país. Há vitória nesse programa que vai completar 20 anos em 2024. Temos 'Michelles', 'Luans', 'Dayres', 'Geyzas' e entre outros prounistas por aí tentando vencer na vida. E eu me incluo nessa.
Assim como a Ana Thais Matos, sou prounista de jornalismo na PUC-SP. Como ela, trabalho na TV Globo. E posso dizer aos quatro ventos que assim como a comentarista e milhões de brasileiros que entraram na faculdade pelo ProUni, tive minha vida transformada pelo estudo e ascendi socialmente. Sai da favela do sapé, na zona oeste de São Paulo, em uma casa que ficava do lado de um ponto de tráfico para estudar em uma das maiores universidades do país. Não quero que pare em mim e assim como a Ana Thais Matos falou na nossa entrevista: "vamos lutar pra ter mais".
Deuses do Jornalismo: fim da licença poética.
Texto: Guilherme Tirelli
Audiovisual: Maria Eduarda Magalhães
Faça chuva ou faça sol, à noite, no meio de tempestades ou ainda que caia neve, eles são figuras constantes nas ruas. No ritmo acelerado da metrópole ou na selvageria do interior, muitas vezes às margens da sociedade, sem qualquer tipo de reconhecimento, encontram-se os entregadores de aplicativo. Quase que imperceptíveis aos olhos do “cidadão”, são notados apenas quando buzinam, esbarram ou passam a centímetros do seu retrovisor. Suscetíveis aos perigos da vida urbana, o trânsito é o que menos aflige o cotidiano desses trabalhadores. Entre os carros e caminhões, atravessam semáforos triscando as latarias dos automóveis para entregar seu pedido no menor tempo possível. E fazem isso por pelo menos dois motivos em especial.
O primeiro deles diz respeito a satisfação do cliente, levando em consideração que ninguém gosta de esperar mais tempo do que o previsto para sua comida chegar – o que pode representar um feedback negativo para a empresa e empregados. O segundo e mais cruel deles é o salário, que na imensa maioria dos casos, é proporcional ao número de entregas realizadas no dia, semana ou mês. Logo, quanto mais rápido chegarem, mais pedidos serão encaminhados à eles e, consequentemente, aumentando o ganha-pão cotidiano.
Por trás dos capacetes, esse triste cenário revela uma realidade um tanto quanto desafiadora: colocar comida na mesa é muito mais difícil para quem tem que trabalhar com ela, literalmente, amarrada em suas costas. Para piorar essa situação, nas pizzarias, bares e restaurantes, os entregadores precisam embalar o pedido que acabou de sair do forno, “quentinho” e temperado. No pensamento, a imagem da sua casa, dos filhos e da esposa abatidos por conta da fome. Para garantir melhores condições para sua família, são esses os percalços aos quais eles se submetem. Trabalhar com a barriga vazia, entregando uma refeição que não é sua. Não existe nada mais cruel do que isso.
De acordo com dados divulgados pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional - Penssan, no 2º Inquérito Nacional sobre a insegurança alimentar no contexto da pandemia da Covid-19 no Brasil, coletados entre novembro de 2021 e abril de 2022, o número de brasileiros que sofrem com algum nível de insegurança alimentar ultrapassou os 125,2 milhões. O levantamento revela que, por falta de opção, inúmeras pessoas se submetem a trabalhos sem carteira assinada, temporários ou como freelancers. A questão central aqui é que nenhum deles oferece condições trabalhistas mínimas. Logo, eles não possuem direitos, muito menos garantias quanto à segurança. Trata-se de uma parcela da população que sai de casa em busca da sobrevivência.
O efeito da pandemia
No primeiro semestre de 2020, o Coronavírus se alastrou como foguete e ninguém àquela altura era capaz de prever os próximos capítulos da pandemia. Muito se ouviu sobre os trabalhadores essenciais e como eles não poderiam, em hipótese nenhuma, parar, já que o restante da população dependia diretamente dos seus serviços. Apontados e glorificados pelo senso comum como heróis, os profissionais das áreas da saúde, segurança e alimentação formavam a linha de frente no combate as consequências desse cenário pandêmico. Nesse contexto, os entregadores de aplicativo tiveram uma presença ininterrupta nas avenidas e ruas, embora fossem escassamente reconhecidos.
Em geral, a invisibilidade é rotina para a maioria desses trabalhadores. Os aplicativos de delivery, inegavelmente, dominaram o mercado de uma forma jamais vista. É compreensível, uma vez que, frequentar os estabelecimentos era inviável, logo a comida precisaria bater na porta dos clientes. Os grandes nomes por trás desse fenômeno são de conhecimento geral. iFood, Rappi e outros apps similares já eram figuras carimbadas no gosto do consumidor. As cores vibrantes e os símbolos engenhosos, infelizmente mascaram aquilo que não vemos. Nas notas fiscais o valor da entrega é creditado, contudo, é impossível aferir o preço da falta de segurança ou das noites mal dormidas. A hora-extra não paga a falta de condições mínimas de trabalho ou as dúvidas que pairam na cabeça desses motoqueiros.
Uma dessas dúvidas é se eles voltarão sãos e salvos para suas casas. O crescente número de motociclistas nas ruas afeta diretamente a quantidade de acidentes registrados. Antes do “boom” dos aplicativos, entre 2015 e 2016, as ocorrências com motos representavam 20% dos atendimentos no Hospital das Clínicas. Atualmente esse índice supera os 80%, de acordo com depoimento de Julia Maria D’Andréa Greve, coordenadora técnica do Laboratório de Estudos do Movimento da instituição. O relatório final da “CPI dos aplicativos”, ainda aponta que 60% a 70% das internações em estado mais grave no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do hospital envolvem motocicletas.
São esses desafios que Samuel Jonatas e outros tantos entregadores enfrentam diariamente.
Já segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil tem 1,5 milhão de pessoas que atuam como motoristas e entregadores de aplicativos, taxistas, moto-taxistas ou outras atividades feitas de maneira autônoma no setor de transporte. O mesmo levantamento apresenta que, quando se trata de moto-taxistas, mais de 73% são homens pretos e pardos. Em contrapartida, conforme a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos - Abia, os empresários do ramo de entregas de alimentos atingiram R$ 35 bilhões de lucro em 2021.
A dor que ninguém vê
Como dito anteriormente, chegar em casa na madrugada cansado, muitas vezes faminto e ter que levantar cedo novamente no dia seguinte, sem qualquer garantia oferecida pelas empresas corresponde a um cenário desumano. Nem o mínimo no que diz respeito aos vínculos empregatícios é concedido à eles. No caso de Renato, um entregador que ganhou certa notoriedade no ano passado, para economizar o transporte diário, que girava em torno de R$ 25, muitas vezes ele dormia nas ruas do Rio de Janeiro, caso contrário, a missão de sustentar sua família ficaria ainda mais difícil.
O caso de Rafael Vaz de Lima ainda é mais chocante. Retornando de sua última entrega, teve um “apagão” – provavelmente causado por estresse, conforme a palavra dos médicos. O entregador perdeu o movimento das pernas e braços, causado pelo impacto da mochila com o seu corpo.
Histórias como essas são parte do cotidiano desses entregadores, assim como a luta por direitos básicos. Por isso, figuras como Paulo Galo, conhecido como "galo de luta", surgem para denunciar a exploração da mão de obra. Galo ganhou destaque em 2020, ao liderar o movimento "Entregadores Antifascistas" que desde o início da pandemia, têm como objetivo central, melhorar a situação dos trabalhadores do ramo.
Apesar da Lei Federal nº12009 regulamentar a profissão dos motoboys e padronizar o moto-frete e moto-táxi em todo Brasil, a medida tem mais de 10 anos e desde a assinatura do Governo Federal, pouco se avançou na questão. A falta de fiscalização e incentivos para os motociclistas se adequarem à legislação é mais um empecilho que contribui para que a situação permaneça estagnada.
Em detrimento da precariedade trazida pela falta de regulamentação, no mês passado, o presidente Lula criticou duramente as empresas de aplicativos e afirmou que elas "exploram os trabalhadores como jamais foram explorados", em discurso para a Confederação Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas. Além disso, alertou que é preciso retomar o diálogo do governo com o movimento sindical para formalizar um novo pacto entre os trabalhadores e as empresas. Ainda assim, esse corresponde a um pequeno passo em busca daquilo que já deveria ser direito de todos eles há muito tempo.
O dia que não terminou
Um dia inteiro têm 1.440 minutos, 86.400 segundos e na manhã seguinte daquele sábado, cada um deles fizeram a diferença. Tudo o que eu queria era que aquilo nunca tivesse acontecido. Desde a infância jogara futebol com a energia de uma criança e o coração de um garoto e nem mesmo todo cansaço, nos meus piores dias em campo, me fizeram sentir algo parecido.
Nesse dia em questão me desafiei na função de entregador. Entretanto, não tinha o relógio contra mim, nem um chefe que me demitiria caso cometesse algum deslize. No interior da minha cidade, minha rotina de entregas iniciou-se na parte da tarde, sob a tutela de um amigo que possui uma livraria. Consigo carregar os livros na minha mente e as palavras no meu imaginário. Tatuadas na minha alma, as letras não fizeram a diferença.
Nunca pensei que, nos ombros, um livro poderia pesar tanto. Ainda assim, carrega-los nas costas pedalando pareceu-me uma ideia intrigante – por isso topei logo de cara e se arrependimento matasse, já não estaria mais sob essa Terra. Quando cheguei em casa, só lembro do alívio de me atirar no sofá e “apagar”. Porém, a dor descomunal nas pernas não me deixou pegar no sono. Parecia que acabara de correr uma maratona. Aquele sentimento de cansaço como jamais presenciei antes. De repente, o alívio me levou a uma reflexão: Como seria se eu tivesse que fazer isso todo santo dia?
Nos dias subsequentes a esse, só de lembrar da experiência já sentia um calafrio, que gelava a minha espinha dorsal, numa espécie de paralisia. E então tive a certeza de que é preciso além de sangue-frio, uma coragem do tamanho do mundo para arriscar a própria vida nas ruas. Os entregadores não entregam só comida. Nas minhas horas de “expediente”, sempre tive a certeza de que voltaria pra casa e lá teria um jantar pronto esperando por mim – privilégio esse que a maioria desses trabalhadores não têm. Por trás do “bom-dia”, eles mascaram a realidade que nem todos enxergam: um cenário de muita luta e dedicação de quem exerce seu ofício priorizando o outro.
Você já ouviu falar do movimento ‘RedPill’? O termo que chamou atenção nas últimas semanas em discurso dado por Thiago Schutz, responsável por um manual que leva o mesmo nome do movimento, traz a ideia de ‘resgatar e fortalecer a masculinidade saudável’. Movimentos como este, ou até mesmo a famosa "machosfera" discutem o papel dos homens na sociedade, mas o resultado efetivo é bem diferente: eles acabam gerando discursos machistas e, muitas vezes, misóginos, onde defendem a errônea percepção de que o feminismo é na verdade, o contrário do machismo, ou seja, prega a superioridade das mulheres. Ideias semelhantes, interesses iguais e direitos mal compreendidos juntam essa parcela de homens em um suposto conceito de misandria (ódio a homens) estatal, preconceito prejudicial, segundo eles, a homens brancos heterossexuais.
Thiago Schutz, ou o ‘coach do Campari’ como ficou conhecido, tem um perfil no Instagram chamado “Manual Red Pill Brasil”, com cerca de 300 mil seguidores, no qual ele dá “conselhos” para homens. Seus vídeos, apontados pelos internautas como machistas e misóginos trazem falas como: “o propósito de um homem num relacionamento tem que estar sempre acima do propósito da mulher”; “a sua mulher custa mais caro que uma garota de programa”; e “o homem está mais feito para o sexo do que a mulher”.
A maioria dos discípulos de movimentos como o ‘RedPill’ pertencem a extrema-direita e concordam que o mundo não discute de forma correta problemas relacionados a homens, como por exemplo, a falta de acolhimentos para homens vítimas de violência doméstica, e até a misandria que, segundo eles, é praticada por movimentos feministas. Na visão dos adeptos a pílula vermelha do filme Matrix, filme que deu origem ao nome desses grupos, isso porque no sucesso de 1999, Neo precisa escolher entre uma pílula azul e outra vermelha, sendo a Red responsável por libertar a pessoa do mundo imaginário, mundo esse, injusto, segundo a ‘machosfera’, pois na verdade, o sistema sempre esteve aqui para privilegiar as mulheres.
Mas que sistema é esse que privilegia mulheres? Esse sistema não é uma questão de subverter a ordem social, mas sim de buscar a igualdade de direitos e oportunidades entre os gêneros. A desigualdade de gênero não é um problema que afeta apenas mulheres de classes menos favorecidas, ela se manifesta em todas as esferas da sociedade, desde o acesso a cargos políticos até a remuneração no mercado de trabalho. Essa desigualdade é agravada por fatores culturais e socioeconômicos, como a ideia de que as mulheres devem ser submissas aos homens e a falta de políticas públicas que garantam a igualdade de gênero.
Entretanto, essa diferenciação pode ser atribuída a outras questões. O que justificaria então a existência de mulheres que perpetuam o discurso machista? Mulheres também presentes em movimentos masculinistas é mais comum do que se possa imaginar. A existência de mulheres que preservam e concordam com o discurso machista não é uma contradição, mas sim uma manifestação do patriarcado que as ensina a internalizar valores e ideias que as prejudicam e desfavorecem suas lutas.
Ao longo da história, as mulheres foram consideradas inferiores e incapazes, mas a luta por direitos e igualdade vem se fortalecendo ao longo dos anos. No entanto, ainda é evidente que a imagem da mulher é construída, imaginada e principalmente, disseminada por homens, fazendo com que discursos de ódio sexualizado, oprimindo e ridicularizando ainda sejam recorrentes nas diferentes esferas sociais.
Juliana Wallauer, jornalista, roteirista, mediadora e, atualmente apresentadora do ‘Mamilos Podcast’, conta o verdadeiro medo que os homens possuem, fazendo com que eles encontrem nas ameaças e discursos de ódio, o seu refúgio. “A luta feminista é uma luta por igualdade, e não para trocar o opressor [...] Eu acho que é uma resistência de homens feridos, de homens com medo, sem ter uma clareza de qual é o papel que existe para eles aqui. Que mundo novo é esse quando a gente tira a masculinidade tóxica? O que sobra? Como amar os homens se todos já nasceram machistas? Eles têm medo da perda do poder [...] o ressentimento pela perda do poder, o medo sobre um futuro que eu não sei qual é, não sei qual é o meu lugar, onde que eu pertenço, qual o papel que ainda existe para mim. Eu acho que tudo isso é um caldo muito fértil para o crescimento desses grupos masculinistas e da continuação de discursos machistas.”
A inferiorização das mulheres por parte de alguns homens é uma questão complexa e multifacetada. Segundo estudos, essa postura pode ter origem em uma série de fatores, como a socialização de gênero, que muitas vezes reforça estereótipos e papéis desiguais para homens e mulheres. Além disso, a cultura machista que permeia muitas sociedades pode fazer com que os homens se sintam ameaçados pela luta feminista e pela busca por igualdade de gênero. Esse sentimento de ameaça pode levar à adoção de posturas agressivas e discriminatórias, como a disseminação de discursos de ódio e a inferiorização das mulheres. Outro fator importante é a falta de educação e conscientização sobre questões de gênero. Muitos homens não têm contato com informações que os levem a refletir sobre seus comportamentos e atitudes em relação às mulheres, o que pode contribuir para a perpetuação de comportamentos machistas e violentos.
Juliana ainda reforça que tais discursos de ódio só existem porque, infelizmente, os homens ainda possuem mais força que as mulheres, sejam elas verbais, físicas ou sociais. “Tem estudos que mostram que o homem vai ser violento com a mulher por quê? Porque ele pode. Porque ele consegue. A mulher vai ser violenta com as crianças e com os animais. Então, essa mulher que recebeu porrada da vida, de todo mundo que interage com ela, inclusive do marido, ela vai pegar os vulneráveis que estão ao alcance dela e vai repetir essa violência que, talvez não necessariamente seja física, embora muitas vezes seja, mas pode ser de outras ordens. A gente tem uma ordem estruturada que coloca o homem numa posição superior, acima, mais importante e mais ouvida, e até religiosamente como cabeça da família em relação a mulher [...] existe uma hierarquia clara que é defendida por uma série de estruturas, e ele vai jogar em cima dela todas as frustrações que ele tem, porque ele pode.”
Apesar das questões legítimas envolvendo homens, como a ausência de suporte para vítimas de violência doméstica, a noção de que um sistema que favorece as mulheres é de todo modo, errônea. Além disso, a presença de mulheres que apoiam ideias machistas não é uma contradição, mas uma demonstração do patriarcado que as ensina a internalizar valores que sempre as prejudicaram, já que crescer com essa mentalidade é incutido na educação e na criação de uma mulher, assim como na mente estreita de homens que se alinham com esses grupos masculinistas, que na realidade, estão perpetuando discursos de ódio.
Meu nome é Thiago Schutz, e sempre dou início a quaisquer tipos de texto com uma frase de impacto. Além desta característica, sou um profissional de orientação pessoal ou, em outras palavras, coach: dou auxílio aos Homens para que os Eles acordem para a realidade social opressora e os instruo a desenvolver sua própria conjuntura justa e biologicamente definida, como um leão que ruge ao acordar, da mesma maneira que um gorila bate em seus peitos quando quer mostrar o seu poder (por isso invejo as mulheres cis, que nasceram com mais seios que eu).
Os Homens vêm sofrendo, imagino que desde a primeira guerra mundial - quando as mulheres começaram a invadir o mercado de trabalho e roubar autonomia - um ódio pitoresco e invejoso pela sociedade moderna. Hoje em dia, é comum observarmos críticas ao comportamento Masculino (este, indubitável) tanto em um âmbito macro socioeconômico, quanto micro. As políticas públicas apenas beneficiam mulheres, ignorando totalmente aqueles que de fato movimentam e constroem este meio altamente especial: os seres masculinos. Não é à toa que a expressão “seres humanos” é masculina, muito menos que, ao se referir a ela, é possível utilizar como sinônimo “Homem”. Enganados estão os gregos antigos, que consideravam Gaia, ou seja, a terra, um planeta feminino - sua forma de esfera indica uma barriga de chope que demoramos anos para alcançar (exige muita coceira de saco).
O cenário é este, te afirmo. Agora coloco: qual seu posicionamento diante dele? Muitos, alienados, concluem que o melhor é se inserir neste Estado conforme ele o impõe. Outros, nem enxergam estes absurdos. Já alguns, como eu, lutam para que ganhemos a devida atenção novamente, como meu antigo familiar e primeiro ser geneticamente desenvolvido de maneira racional, a anta.
Durante minha jornada, claro que violenta, pois fisicamente assim sou, enfrentei vários dragões. Um dos piores é recente, e fico de joelhos por ajuda máscula - por isso escrevo estes parágrafos.
No início do mês, a atriz Livia La Gatto publicou em suas redes um vídeo me ridicularizando. A influenciadora não citou o meu nome, mas me senti afetado já que ela coloca de maneira debochada meus mandamentos e ideias meticulosamente elaboradas. Esbravejei nos ombros da mulher que contratei para me acolher neste momento insuportável (aliás, ela é a única que me apetece, já que as outras, nós Homens temos que fazer um sacrifício para suportar).
De modo sugestivo, mesmo com raiva, escrevi à Lívia para que ela tirasse o material do ar. Ela leu a mensagem, não me respondeu e, ansioso por uma resposta, liguei para ela - ninguém atendeu minhas chamadas (odeio ser ignorado). A resposta que tive foi conduzida a mim judicialmente: Fui definido como Réu.
A (in)justiça chama minha opinião exacerbada de crime. Não é à toa que divulgo o meu trabalho como uma atividade de resistência. Além disso, as autoridades decidiram que eu não posso conduzir a minha fala à moça, nem pela internet, muito menos pessoalmente. Eis que tenho que ficar trezentos metros longe dela. O que eu não entendo é a falta de capacidade desta massa envenenada populacional de não saber interpretar um texto. Como provariam que ameacei a artista quando disse “Você tem 24H para tirar seu conteúdo sobre mim. Depois disso, processo ou bala. Você escolhe.”.?
De qualquer forma, “O amor venceu!”, e é isso que importa. Peço, pelo amor de deus, que os Homens me ajudem. Se você está lendo isso e possui pelos no saco escrotal (de acordo com o meu Manual Red Pill e também a bíblia, quanto mais pelo no gorgomilo, mais forte você é, me ajude - “Dalila fez Sansão dormir com a cabeça em seu colo e então chamou um homem para cortar as sete tranças do cabelo dele. Desse modo, começou a enfraquecê-lo, e suas forças o deixaram”. Juízes 16:19-30 NVT”). Vamos unir as nossas mais profundas raízes capilares para acabar com a censura.
ObrigadO,
Thiago Schutz
Disclaimer: O texto é uma sátira escrita pela aluna Júlia Zuin.
Marcada pela luta sindical e por ter sido o berço político do atual presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a região do ABC Paulista apresentou uma queda eleitoral do petista em comparação com eleições anteriores. Tal perda se deve principalmente às mudanças políticas e sociais sofridas no perfil do ABC, principalmente com a dissolução do sindicalismo na região.
A perda política do PT na região do ABC, não é novidade das eleições de 2022. De 2002 a 2006, a queda no número de votos recebidos foi de 9,71%. Agora, a perda de 2022 se comparado a 2002 é 5,48%, se comparado com os números de 2006 é menor, de somente 1,78%.
Maria do Socorro Braga, doutora em Ciência Política e professora da UFSCar, defende que essa queda pode ser “relativa”, mas que ainda sim são dados que "apontam que o PT está perdendo cada vez mais espaço nessa região”. Braga acrescenta que Lula “só se tornou essa liderança tão forte e expressiva hoje” por conta de seu “capital sindical”.
Das sete cidades que fazem parte do ABC Paulista, as quatro principais são: Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul e Diadema, isso porque a tomada de decisão delas influencia o posicionamento das demais. Contraditoriamente, entre elas quatro a preferência eleitoral é divergente.
Das eleições de 1972 às de 2020, Santo André teve sete vezes seu prefeito alinhado às diretrizes da esquerda. João Avamileno e Celso Daniel, por exemplo, foram políticos do PT reeleitos com número de votos expressivo. Em 2000 Celso Daniel foi reeleito com 70,13% dos votos válidos. Após 16 anos, o município elege Paulo Henrique Serra (PSDB) com 78,21% dos votos válidos. Em 2020, ele foi novamente eleito, com 76,93% dos votos.
Já em São Bernardo do Campo, em cerca de 30 anos, somente sete prefeitos alinharam-se à ideologias mais progressistas, enquanto outros seis foram de direita ou centro-direita. Desses sete, três foram do PT. O primeiro prefeito de esquerda eleito foi Maurício Soares em 1998, na época do PT. A esquerda se apresenta com maior evidência a partir dos anos 90, conseguindo 06 mandatos seguidos. A “época de ouro” se encerra em 2016 com Luiz Marinho (PT).
Hélio da Costa, historiador e atual coordenador da área de estudos do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, acrescenta que a situação econômica do país favoreceu esse cenário. “[Luiz] Marinho só se elegeu porque o governo Lula estava muito bem”, pontua.
O ano de 2016, foi um marco da queda do PT. É nesse ano em que houve o impeachment da então presidenta Dilma Rousseff. Não coincidentemente, é a partir desse ano em que o partido perde cada vez mais poder na região.
São Caetano do Sul, por sua vez, não só nunca teve um prefeito alinhado com propostas da esquerda, como candidatos progressistas obtêm um baixo número de votos no município.
Na última eleição, em 2020, por exemplo, os outros dois colocados no pleito foram Mario Camilo Bohm (Novo) e Thiago Tortorello (PRTB), com 16,64% e 10,83% respectivamente. Ambos são de direita.
Em 2016, o cenário eleitoral foi o mesmo. E nos anos de 2012, 2008, 2004 e 2000 os principais candidatos opositores receberam menos de 35% dos votos.
Diadema, em contrapartida, traz consigo o marco de ter sido a primeira cidade a eleger um prefeito do PT.
O candidato em questão foi Gilson Menezes, eleito em 1982. Desde então, a cidade tem sido coordenada por partidos que compartilham do mesmo ou semelhante posicionamento político.
A história de Gilson Menezes, inclusive, reflete bem o histórico do ABC Paulista, pois ele nasceu na Bahia e veio à região para trabalhar nas indústrias, como tantos outros, depois participou das grandes greves e, por fim, fez parte da fundação do PT.
Além dessa contraposição, outro fator relevante para se analisar é a média de deputados estaduais eleitos do PT nos municípios do ABC entre os anos de 2002 e 2006, comparando-os ao ano de 2018. De acordo com a Fundação SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados) durante os anos de auge do partido foram eleitos em média 4,2 candidatos do PT, dentre 15 cadeiras a ocupar. Já em 2018, essa média cai para 1,5 candidatos eleitos pelo PT.
Para Hélio da Costa a popularização de Lula não significou necessariamente uma “transferência de votos”. Com exceção de Diadema, os outros municípios do ABC tiveram menos prefeitos alinhados à esquerda.
Já Richard Martins, graduado em história e mestre em ciência política, explica que a região sempre foi mais conservadora, mas que na época de 70 e 80 o apoio ao sindicalismo com bases esquerdistas se deu por questões trabalhistas e econômicas. Martins defende que “é comum e característico da classe trabalhadora votar com o bolso”.
As décadas de 70 e 80 no ABC Paulista foram marcadas pelas greves nas grandes indústrias. Essas surgiram devido à insatisfação dos operários devido aos elevados níveis de demissões, corroborados pela especulação de que o regime militar (1964-1985) havia maquiado os índices da inflação encobrindo o custo de vida da população.
Em 1977, as greves já haviam se alastrado para muitas fábricas e cidades vizinhas, incluindo classes trabalhadoras desde os metalúrgicos aos bancários, perpassando pelos professores. Em 1980, os movimentos foram atores sociais importantes para o enfraquecimento da ditadura militar e pelo fortalecimento de pautas da esquerda no país.
O fato de Lula ter assumido o protagonismo sindical no ABC nas décadas passadas o levou a uma certa popularização na região e, posteriormente, ao PT também.
Sidney Jard, professor da Universidade Federal do ABC, doutor em ciência política pela USP, acredita que os momentos históricos vivenciados pelo ABC influenciam pouco na hora de votar. Isso porque antes o movimento sindical pautava muitas coisas com os trabalhadores e agora há um enfraquecimento do sindicalismo e, consequentemente, de sua mobilização política.
Dentro disso, Costa argumenta que “o discurso de esquerda assusta o trabalhador, ele respeita o papel do sindicato, mas isso não significa que ele se identifica com valores da esquerda principalmente às vezes nos costumes a respeito da diversidade LGBTQIA + ,sobre feminismo, questão racial”.
Martins justifica a queda da esquerda no ABC Paulista com o enfraquecimento do sindicalismo. Tanto para ele quanto para Costa isso aconteceu principalmente pela terceirização e a uberização do trabalho.
“O que o terceirizado vai ter em comum com o trabalhador de contrato assinado e que tem o sindicato para defendê-lo? [...] Quem está na uberização sequer tem uma troca [de vivências] com outros [trabalhadores]”, exemplifica o historiador.
O cientista político Jard assinala que quando “se abrem espaços para que parte dos trabalhadores negociem diretamente com os empresários, com os patrões, sem depender da negociação” feita pelos sindicatos, as demandas de até então desaparecem.
Jard frisa que antes “havia uma identidade de trabalhador no ABC Paulista” e que com a chegada desse trabalho descontínuo isso se perde. “Qual a identidade de um trabalhador que trabalha para vários patrões? E qual o sindicato o representa?”, pontua.
Outro fator para a dissolução das entidades sindicais foi o corte dos incentivos tributários, em que antes se tinha com os “impostos sindicais”. Dentre as ressalvas feitas a esse tipo de recurso, o cientista político esclarece que deveria ter sido feito um processo de transição, na qual as entidades “pudessem se organizar e criar formas alternativas de sustentação dos seus trabalhadores, inclusive formas autônomas”.
A cientista política Maria do Socorro Braga defende que não só a região do ABC, mas o eleitoral nacional em sua maioria está mais preocupado com a sua mudança de vida do que com ideologias. “A tendência é buscar aquelas forças, independente se é de esquerda, de direita e de centro que mais apoie uma melhor qualidade de vida das pessoas”. A docente elucida que a identificação partidária é “uma construção de longo prazo”.
Diante disso, a docente acredita que “as forças políticas partidárias é que terão que construir projetos para corresponder a esses anseios e demandas dos diferentes segmentos populacionais”.
A respeito dessa perda de votos por parte da esquerda, Braga afirmou: “a esquerda vai ter que saber se unir como fizeram agora ao redor do ex-presidente Lula [...] parece que eles já perceberam que vão precisar dessa união para a esquerda conseguir que novas lideranças venham a ocupar esse espaço e aí é muito importante como é que o PT vai se colocar tendo que abrir mais espaço para outras liderança que não só são do campo petista”.