Somos lembradas o tempo todo que a política não é para mulheres, diz pesquisadora

A moda é um importante meio de comunicação na esfera política, e fica mais evidente nas eleições
por
Marcela Foresti e Paula Moraes
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18/10/2022

As dificuldades enfrentadas no dia a dia para serem respeitadas no ambiente político, levam as mulheres a repensarem o que vestem.

As mulheres passaram a performar e imitar o jeito masculino ao longo dos anos para serem levadas a sério no ambiente de trabalho e na política, e mesmo assim, são relembradas de que isso não as fazem ter os mesmos privilégios. “Somos lembradas de que jamais seremos homens”, explica Mayra Cotta, advogada e autora do livro 'Mulher, Roupa e Trabalho'.

Cotta diz que as mulheres foram produzidas socialmente como um corpo e antes de qualquer coisa, vão ser avaliadas pela aparência e pelo corpo. A mulher está sempre consciente de que é um corpo, diferente do homem que é visto como a razão e esquece que também é um corpo.

As candidatas precisam pensar de forma redobrada como irão se apresentar, para que seus eleitores e outros possíveis as levem a sério e ouçam suas ideias.

Como são vistas apenas como corpos, muitas vezes a população masculina se sente no direito de invadir e violar estes corpos que circulam pela sociedade em busca de igualdade e respeito.

Sempre pensando que, se sua roupa é muito larga, vão achar que ela é desleixada demais para o cargo, e se é muito justa, vão deixar de ouvir suas ideias para observar seu corpo.

Elas não podem estar muito sérias pois vai passar a impressão de dura e agressiva, “masculinizada”, e isso desagrada. E não podem passar a impressão de que são frágeis e sensíveis, pois isso transparece que não irão dar conta do cargo.

Mulheres na política

Segundo os dados oficiais do Governo Federal, as mulheres são a minoria dentre as deputadas eleitas nas últimas eleições de 2018. Foram apenas 77 pelo Brasil, sendo 11 no Estado de São Paulo.

Na política, foi apenas em 1933 que foi permitida a participação das mulheres como eleitoras, um ano antes da eleição da primeira mulher deputada, Carlota Queirós, pelo Estado de São Paulo.

Nas eleições de São Paulo deste ano, a participação das mulheres é bem marcada e muitas estão representando esta grande parcela da sociedade. Porém, com o aumento da participação delas, aumenta a exposição, levando a ataques machistas de eleitores, colegas de profissão e adversários políticos.

Os casos de abuso dentro do mundo político, justificado pela vestimenta das mulheres, são parte da rotina de muitas que estão tentando abrir espaço e impor respeito.

As dificuldades no ambiente de trabalho

Existem casos de assédio e importunação sexual dentro do ambiente político, casos como o da deputada estadual de São Paulo Isa Penna (PSOL), que foi apalpada em dezembro de 2020 pelo deputado Fernando Cury (União Brasil) durante a votação do orçamento de 2021 na ALESP (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo).

O ocorrido sucedeu na denúncia de Pena por importunação sexual e quebra de decoro parlamentar, e resultou no mandado de Cury sendo interrompido pela ALESP em 1˚ de abril de 2021.

O caso levou a uma onda de políticas mulheres por todo o Brasil relatarem assédios sofridos no meio político. Uma delas foi a deputada federal de São Paulo, Tábata Amaral (PDT), que diz em uma reportagem feita pela Folha de São Paulo, que desde que foi eleita em 2018 vem passando por situações desconfortáveis com colegas de trabalho. "Um deputado veio, me puxou, abraçou, só que ele era mais alto do que eu, e eu não consegui sair. Veio uma amiga minha, começou a bater na mão dele, a gente ficou assustada e eu fui embora, chorei… você se sente super mal."

Nesse mesmo período, a deputada estadual de São Paulo, Janaina Paschoal (PSL), que considera que as mulheres no meio político não têm uma pressão maior para se vestir de forma "adequada", afirmou através de suas redes sociais que iria aguardar antes de se manifestar sobre o caso de assédio sofrido por Penna.

Ao ser questionada se já se sentiu como se não fosse respeitada enquanto exerce sua profissão na Câmara dos Deputados, Paschoal afirma que não. "A política é bem democrática nesse sentido. Mas, na Universidade, sim. Sempre implicaram com meu cabelo e com meu estilo mais informal."

Ao mesmo tempo, Paschoal afirma não considerar a maneira de se vestir um fator importante para a comunicação com o público, e considera terninhos sua roupa favorita para os trabalhos na Assembleia, mas afirma já ter usado todo tipo de roupa.

Ao contrário de Paschoal, a deputada estadual de São Paulo, Maria Lúcia Amary (PSDB), considera a maneira de se vestir um importante meio de comunicação com o público. "Eu acredito piamente que 'vestir' é 'se comunicar'. As roupas que nós usamos ora podem ocultar, ora podem expressar um modo de ser e estar no mundo."

Amary também diz respeitar o modo de cada um se vestir, mas opta por usar o 'dress code' adequado para o ambiente político. "Desde sempre procuro estar vestida da maneira que o evento ou a ocasião exige. E claro, com o meu toque pessoal e minha personalidade."

O não pertencimento ao ambiente de trabalho

“O mundo do trabalho formal, o mundo do trabalho socialmente prestigiado, este espaço não foi construído para ser frequentado por mulheres”, explica Cotta.

A roupa apenas concretiza este não pertencimento. Coêlho também diz que o jeito “masculino” de se vestir é o que estamos acostumados a ver como sinônimo de seriedade “Nosso cérebro ainda está treinado para ver esses significados nos elementos visuais de roupas mais sérias, fechadas e que coincidem com o guarda-roupa masculino”.

A especialista em imagem e moda, Carol Coêlho acrescenta que a sociedade foi fundada em cima de um patriarcado e as mulheres não eram destinadas a atividades remuneradas. Desta forma, deveriam se vestir desta forma delicada. “Sua vestimenta era formada por elementos visuais de delicadeza e feminilidade, pois era o que todas deveriam comunicar”.

Imagem delicada e feminina

Os vestidos enormes e estruturados e os corpetes apertados para delinear suas curvas, foram usados estrategicamente por muito tempo para manter a imagem da mulher como alguém frágil e delicada.

A vestimenta masculina foi criada no século XVIII e permanece até hoje quase intacta, é vista como símbolo principal do privilégio e da racionalidade.

Durante a década de 30, a estilista francesa Coco Chanel, inspirada no armário masculino, lançou o primeiro modelo de calças para mulheres, baseado nas calças de boca largas usadas pelos marinheiros. Posteriormente, na década de 50, ela surgiu com o Tailleur, a versão feminina do terno.

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