Sob gestão Ricardo Nunes, 43 das 49 obras de drenagem em andamento estão atrasadas

Especialistas explicam que não há verba suficiente para a solução permanente dos alagamentos
por
Maria Eduarda Frazato, Maria Eduarda Mendonça e Vicklin de Moraes
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27/06/2023

A Prefeitura de São Paulo utilizou apenas 4% do orçamento de 2023 para o combate de enchentes, equivalente a R$ 23 milhões dos R$1,54 bilhão previstos. Em 2022, o orçamento era de R$ 2,3 bilhões, entretanto a administração municipal utilizou R$1,4 bilhão, deixando de gastar 25% do esperado.

Segundo dados do Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (GCE), o mês de março de 2023 encerrou com a marca de 193,9 mm de precipitação, 9.2% acima do previsto. Esse é um dado importante visto que foram 22 dias com chuvas que vem castigando a população paulistana.

Em São Paulo, das 49 obras de drenagem em andamento, 43 estão atrasadas. Como é o caso do projeto de contenção de margem no Parque Ecológico Chico Mendes localizado no bairro do Itaim Paulista, que estava previsto para ser entregue em setembro de 2021. Mas, quase dois anos após o prazo estimado, a obra se encontra apenas 69% finalizada e sem previsão de conclusão.

Outro exemplo de atraso é a obra emergencial de contenção de talude em margem do córrego, localizada no bairro de Guaianases que estava prevista para ser entregue em dezembro de 2022. Quatro meses após o prazo estimado, a obra se encontra 87% finalizada e sem previsão de conclusão, apesar de seu caráter de urgência.

Obras de drenagem em andamento na capital paulista Fonte: Obras Abertas
Obras de drenagem em andamento na capital paulista Fonte: Obras Abertas

 

A Prefeitura de São Paulo, em parceria com as secretarias de Governo, Infraestrutura Urbana e Obras, Controladoria Geral do Município e a Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município, disponibilizou em junho de 2022 o Portal “Obras Abertas”. 

O site permite que os cidadãos acompanhem o andamento das obras públicas em execução. Em comunicado, a Prefeitura informou que "a nova ferramenta cumpre o objetivo de transparência e ressalta o comprometimento da idade com as ações de fortalecimento do Governo Aberto."

Causas dos atrasos 

O arquiteto e urbanista Nabil Bonduki, que já atuou como vereador duas vezes na capital paulista, explica que qualquer obra de prevenção de enchentes é precedida de um estudo sobre o risco que aquela população está sofrendo - a ameaça vai de um a quatro. Quando uma região está sob risco 4, é necessário remover a população, ou seja, encontrar alternativas habitacionais, então a utilização de muitos desses recursos é destinada ao abrigo da população. 

De acordo com o especialista, algumas razões podem explicar os atrasos, como irregularidades com a empreiteira que pode levar a suspensão da obra, ou a construtora chegar à conclusão que o projeto não promoverá nenhum lucro, apenas prejuízo, e também a falta ou suspensão de pagamento da Prefeitura. Um outro problema é a deterioração das áreas após paralisações das obras, que muitas vezes precisam de uma nova revisão orçamentária. 

“Os projetos em quadros técnicos precisam de investimentos e muitas vezes isso não é feito pela falta de vontade política, logo gera uma dificuldade enorme em conseguir gastar. A Prefeitura tem em caixa hoje cerca de 34 bilhões, é inacreditável que a atual gestão seja tão incompetente para destinar esses recursos”, afirma Nabil.

Em seu último mandato, Nabil teve papel decisivo como relator na elaboração do atual Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo.

Oposição critica

O vereador Rubinho Nunes (União Brasil), membro da base do governo e Presidente da Comissão de Política Urbana, confirma que a porcentagem gasta até o momento é irrisória, apesar de acreditar que o orçamento total é suficiente. “Como há uma falta de mobilidade, devido às despesas obrigatórias, questões emergenciais como enchentes, tornam-se  prejudicadas” afirma o político. 

Em contrapartida, a covereadora Natália Chaves, da Bancada Feminista do PSOL, expõe que não é possível saber se o R$ 1,54 bilhão que foi previsto pela Gestão Municipal é o suficiente, pois o valor nunca é executado totalmente. Além disso, o valor investido é mal distribuído “uma vez que se executa muito mais dinheiro no centro do que nas periferias, onde as pessoas são mais vulneráveis”, explica a especialista. 

O Ministério Público de São Paulo solicitou à Prefeitura de São Paulo, uma ação civil pública para que apresente um plano de redução de riscos com medidas estruturais de curto, médio e longo prazo para combater “graves problemas de enchentes na cidade”.

No período de 2014 a 2020, foram gastos 4 bilhões em drenagem, entretanto estavam previstos 7,5 bilhões de reais em ações orçamentárias relacionadas à prevenção e ao combate de enchentes. 

A coveradora esclarece que esse é um problema que é visível quando se discute as leis orçamentárias que passam pela Câmara dos Vereadores, em que são previstas uma boa quantidade de verba, mas não se executa, e isso é um problema que justifica a falta de Recursos Humanos. 

O Presidente da Comissão de Política Urbana explica que na cidade de São Paulo, as vítimas de enchentes têm acesso aos mecanismos de assistência social e redes de amparo da Prefeitura para qualquer cidadão. Também está em fase de tramitação um projeto de lei que garante a isenção e descontos no IPTU para pessoas que moram em regiões consideradas de risco ou que tenham sido afetadas pelos alagamentos. 

Por outro lado, Chaves ressalta que o processo para que famílias vítimas de enchentes consigam esses benefícios é bem burocrático, o que faz com que muitas desistam no meio da ação. “A gente [PSOL] sempre recebe pedidos de ajuda da população para receber os auxílios. Não é todo mundo que tem um celular e  internet ou é alfabetizado, podendo ser facilmente enganado”.

Há soluções para enchentes? 

Uma das obras da Prefeitura de São Paulo para o combate de enchentes é a drenagem de rios, que se dividem entre macro e micro. A macrodrenagem é feita em toda a bacia hidrográfica, tal como a canalização e piscinões. Já a microdrenagem ocorre em bairros e ruas específicas. Em 1992, foi criado o primeiro piscinão, executado sob o estacionamento do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho, localizado no bairro do Pacaembu, durante a gestão de Luiza Erundina e concluída no mandato seguinte do prefeito Paulo Maluf.

Contudo, o professor da Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAU-USP), Angelo Salvador Filardo Junior, ilustra que a Avenida Pacaembu, mesmo com todas as medidas, em algum momento do futuro irá inundar, apesar da existência de um piscinão. “Basta que caia uma chuva maior do que a capacidade do piscinão ou que essa chuva se concentre rio abaixo em relação à posição do reservatório. Sempre haverá uma estação mais chuvosa!”.

A função da várzea do rio é dar espaço para que ele encha, esvazie e se mova. Quando esse espaço é aterrado para a construção de casas e prédios, surgem as enchentes e alagamentos. A primeira urbanização de Várzea do Rio ocorreu em 1870, com a Várzea do Carmo. “Seis gerações ganharam dinheiro vendendo lotes irregulares e construíram um problema. Em quantas vidas irão resolvê-lo? Iremos gastar mais dinheiro solucionando-o do que se ganhou criando-o”, afirma o doutor. 

Filardo ainda acrescenta que cada um foi muito esperto saneando o terreno que queria vender. Mas coletivamente, foram estúpidos, pois aceleraram a água para cima do terreno do outro e venderam exatamente o lugar que seria inundado. “É o que seria hoje o investidor em bitcoin, que vai pagar no futuro o lucro de quem se deu bem no passado. No caso, nós somos os investidores de bitcoin, nós herdamos esse erro”.

Para o professor, a questão das enchentes não possui uma solução permanente. “Gastamos um dinheiro absurdo em soluções imperfeitas, que consomem energia e exigem manutenção. Não há certeza se no dia a dia irão funcionar. A verdade é que esses lugares não poderiam ser ocupados. Vendemos o futuro e gastamos mal no presente”.

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