O ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles (PL) foi o quarto deputado federal mais votado pelo estado de São Paulo e chega à Câmara para compor a bancada ruralista. Na contramão, Marina Silva (REDE) e Sônia Guajajara (PSOL) elegeram-se como importantes figuras ambientalistas. Cientistas políticos apontam para o crescimento do número de parlamentares mais à direita e que representam uma ameaça para o meio ambiente.
Das 513 cadeiras da Câmara, 137 serão ocupadas por partidos que costumam se manter próximos à defesa de direitos ambientais, segundo dados apurados pelo Farol Verde e apresentados pelo jornal Folha de S.Paulo. Dentre o grupo dos ambientalistas, estão os partidos Avante, Cidadania, PCdoB, PT, PSOL, PSB, PV, PDT e Rede.
Do outro lado, 213 deputados — representando 41,5% das cadeiras da Câmara — do PP, União Brasil, Solidariedade, PL, PTB e Novo se concentram na bancada ruralista. No “centro” da discussão, que converge tanto com as propostas ruralistas como também com os projetos ambientalistas, estão 163 deputados do Pros, Patriota, PSDB, MDB, PSD, Republicanos, Podemos e PSC.
São Paulo ‘engrossa’ bancada ruralista
A análise focada nos deputados eleitos e reeleitos desenha um cenário de crescimento da posição antiambientalista. Até as eleições deste ano, os parlamentares contrários às pautas ambientais somavam 37% das cadeiras da Câmara. Hoje, a composição é de 42,6%. A Câmara perdeu quase 3 pontos percentuais dos deputados que se colocam na posição de intermediários e mais 3 dos que defendem a preservação do meio ambiente.
O principal nome da lista de parlamentares eleitos por São Paulo que irão compor a bancada ruralista e trazem à Câmara pautas antiambientais é o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, do PL. No entanto, para o coordenador de comunicação do Observatório do Clima, Claudio Angelo, é preciso aguardar e analisar o início do mandato de Salles, já que ele pode ceder para projetos ambientalistas.
“Ricardo Salles foi muito ‘espertão’ como Ministro, mas o Parlamento é outra coisa. É uma máquina de moer gente, que determina como pode ser o futuro político de um deputado. Então não sabemos como ele vai trafegar lá dentro”, explica.
De acordo com o Ruralômetro, banco de dados da Repórter Brasil, a tendência é realmente de ‘afrouxamento’ nas propostas de preservação ambiental.
O objetivo do banco é comparar os deputados, observando como cada um vota em projetos de impacto ambiental. Cada parlamentar recebe uma nota, que é calculada com dois critérios: como o deputado votou e quais foram as propostas apresentadas por esse parlamentar durante a candidatura.
Para realmente entender as consequências de cada um dos projetos, organizações do ramo socioambiental avaliam as propostas e indicam o nível de impacto ambiental de cada uma delas. As notas são geradas a partir dessa análise.
Restringindo a pesquisa para o estado de São Paulo e para os candidatos de 2022, são 21 os parlamentares que têm uma nota mais baixa, contra 46 com notas mais altas. Isso indica mais posicionamentos contrários à proteção ambiental, do que favoráveis.
O termômetro indica as chamadas notas. Quanto mais alta a temperatura, maior a inclinação para pautas antiambientais. O gráfico e as informações foram retirados do próprio Ruralômetro.
Ao lado de Ricardo Salles, outros nomes da bancada ruralista foram eleitos, como é o caso de Adriana Ventura (Novo). A deputada tem, em seu histórico parlamentar, posicionamentos antiambientais. Em março deste ano, Ventura votou a favor da mineração em terras indígenas.
“No Brasil, existem muitas leis que protegem o meio ambiente, como a Lei 11.428/2006, que assegura a proteção da vegetação do Bioma da Mata Atlântica. Mas, o que a gente precisa é que elas funcionem”, disse a deputada em vídeo publicado nas redes sociais.
Também eleita deputada federal por São Paulo, Sônia Guajajara (PSOL) se torna uma figura importante para a proteção indígena e no combate ao meio ambiente. Ao lado de Marina Silva (Rede) e Nilto Tatto (PT), a indígena se junta à bancada ambientalista.
“Nós precisamos retomar os projetos e apoios para os povos e comunidades tradicionais e fazer a retomada do fundo Amazônia”, diz Tatto (PT), deputado federal reeleito pela segunda vez em São Paulo, em entrevista ao Contraponto.
Para o petista, apesar de deputados conservadores e com pautas antiambientais terem sido eleitos, a eleição de Lula para a Presidência, deve equilibrar o debate na Câmara Federal. Tatto afirma que, com Lula, o Executivo deve pautar uma agenda de interesse socioambiental, de desenvolvimento sustentável, já que também impacta o agronegócio.
Agronegócio pode ameaçar a preservação de terras indígenas
A demarcação de terras indígenas no Brasil é um direito constitucional, assegurado pela primeira vez na Carta de 1988. Dentro do território delimitado, é proibida toda e qualquer atividade de mineração que não tenha aval do Congresso e consulta prévia às comunidades afetadas. No entanto, a ANM (Agência Nacional de Mineração) tem registrados mais de dois mil pedidos de atividade mineradora em áreas (em pequena ou larga escala) demarcadas por lei.
Pagu Rodrigues, membro da Comissão de Povos Indígenas da OAB/SP entende que o problema vai além da discussão das pautas, se são ou não ambientalistas. Porém, o debate precisa estar focado nos interesses econômicos, porque esses sim vão determinar as diretrizes das leis aprovadas (ou barradas).
A advogada aponta o agronegócio como um forte elemento econômico, o que consequentemente impacta na aprovação de mais projetos.
“Quando a gente pensa em demarcação, os territórios são fundamentais para enfrentar esses interesses econômicos, porque eles criam uma identidade, principalmente para nós [indígenas]”, aponta Pagu Rodrigues em evento na PUC-SP. “A Mata Atlântica que está aqui do lado não recebe tanta atenção. São Paulo é um estado minerador e é justamente a Mata Atlântica que perde com isso”, continua.
Para o professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP, Pedro Luiz Côrtes, é possível conciliar o agronegócio e a questão ambientalista, já que o desmatamento afeta o agronegócio.
“Foi demonstrado que as pautas podem se conciliar: no governo Lula, houve uma redução significativa das taxas de desmatamento, ao mesmo tempo em que o agronegócio crescia e se exportava cada vez mais”, argumenta.
Atualmente, existem 14 Projetos de Leis propostos por antiambientalistas que estão em discussão na Câmara e incentivam a exploração dessas florestas. Eles fazem parte do que Cortês chama de “Pacote da Destruição”. Este pacote é um conjunto de projetos que afrouxam a proteção do meio ambiente.
“Se todos esses projetos forem aprovados, é o descontrole do desmatamento e de outras formas de destruição ambiental no Brasil”, assegura Claudio Angelo.