Pilotos vivem 420 metros de pura adrenalina

Um pouco da vida dos pilotos de arrancada e suas histórias sobre como chegaram nas pistas
por
Rodrigo Silva Marques
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14/06/2024

 Por Rodrigo Silva      

A origem das corridas de arrancada remonta o pós Segunda Guerra, quando jovens americanos apaixonados por velocidade, mas sem muito dinheiro, passaram a construir e customizar seus carros a partir de sucatas de roadsters (veículos conversíveis de dois lugares) encontrados em ferros-velhos, transformando-os em supermáquinas equipadas com motores V8 de grande cilindrada. Os duelos para saber que era os mais rápido aconteciam no leito seco do Lago Muroc, no deserto do Mojave, na Califórnia.

Por aqui no Brasil, as arrancadas chegaram em São Paulo e Curitiba, começando a tomar força no fim dos anos 80, quando as provas eram oficializadas e realizadas na reta principal do Autódromo de Interlagos. Na época, era uma solução para acabar ou pelo menos diminuir a quantidade de rachas que aconteciam em diversos pontos das capitais paulista e paranaense, como a Marginal Pinheiros e a Avenida Iguaçu. 

Atualmente, as corridas são administradas pelos próprios pilotos juntos com os organizadores de eventos. Os denominados mais rápidos que cada região do país se enfrentam numa final conhecida como Armageddon, que será realizada esse ano em São Paulo, justamente em Interlagos. 

Para entender um pouco mais sobre esse universo, é preciso conhecer um pouco da história dos responsáveis por isto, os pilotos. Entrando em contato com dois deles, pode-se se ter uma noção  melhor desse mundo. 

O primeiro contato foi com Ricardo Galli, conhecido como o Rei. Membro da equipe de preparação Peninha Street, venceu sua sétima coroa no início de Maio. Ao falar um pouco de sua história, contou que como vários outros garotos dos anos 80 que gostavam de carros, cresceu admirando os grandes nomes do automobilismo brasileiro da época como Nelson Piquet e Ayrton Senna. Natural de Osasco, Galli também explicou como foi difícil viver na cidade devido aos altos indíces de criminalidade da região.

Esses eram basicamente seus dias, ia para escola e ficava desenhando carrinhos de corrida na mesa até a professora chamar atenção, voltava lendo uma revista Quatro Rodas e depois ficava ajudando o avô com seu carro.

Com isso, aprendeu ainda jovem a mexer em motores, inicialmente por razões mecânicas e depois para extrair potência. Quando ele tinha uns 17 anos por aí, ia junto com um amigo seu até a Hildebrando de Lima, ele tinha um Golzinho quadrado endriabrado. E às vezes deixava ele dirigir aquele treco. Foi basicamente sua primeira experiência dirigindo um veículo, foi aí também que começou seu gosto pelo popular carro da Volkswagen. 

Quando conseguiu financiar seu primeiro carro, a primeira coisa a fazer foi justamente ver até quanto ele chegaria com ele. depois começou Mexer nos componentes para ficar mais potente. Nessa época começou a participar de rachas, que se tornaram "um vício" na sua vida por bastante tempo. Começou como um escape, mas a sensação de adrenalina e perigo total era como uma droga, tipo heroína e crack, ele corria toda noite depois da faculdade, era uma parte de eu financiar meus estudos com o dinheiro das vitórias, o resto ia pro carro. 

 A rotina deu a Ricardo uma certa reputação, chegando ao ponto de desafios valendo altas apostas de dinheiro, mas também alguns problemas com a polícia. Nessa época conheceu os mecânicos da Peninha Street, que somente atuavam como oficina de preparação. A junção do útil com o agradável. 

Através da Peninha, que se tornou sua equipe, foi apresentado as arrancadas profissionais e viu uma oportunidade de sentir adrenalina de correr sem tantos riscos, até porque descobriu que sua esposa estava grávida de seu primeiro filho. Nessa situação, acabou se vendo obrigado a largar e se "desintoxicar do vício dos rachas para ter uma família.

Mas se tornar "profissional em acelerar" e vencer se tornou rentável. Aos poucos, foi escalando na lista dos mais velozes de São Paulo, o que resultou na participação de eventos de mais prestígio como o Race Valley Outlaws e o Armageddon (maior evento de arrancada do país). Inclusive afirmou estar ansioso para sua partipação esse ano. Nos outros anos, a equipe não conseguia ir longe, mas agora estão confiantes de que podem chegar na final e vencer".

Arrancada 1
      O gol 4x4 de Ricardo

O outro contato foi João Couto, o "Joãozinho". Diferente de Ricardo, ele é um novato em arrancadas, começou a correr ano passado, e ainda busca se classificar na Lista de Curitiba. O ranking de classificação, chamado de Shark Tank, consiste num grupo de quatro estreantes que competem com os pilotos que ocupam ranking da Lista e duelam no estilo mata-mata. Os vencedores que derrotarem os pilotos que estiverem na Lista, terão seus nomes preenchidos automaticamente as posições da lista correspondente. 

Couto começou seu contato com carros através do kart, onde competiu por anos em divisões amadoras e juvenis. Mas depois de uma ida aos Estados Unidos, tudo mudou. Seus pais o levaram a uma arrancada oficial da NHRA (associação norte-americana de arrancada) e se encantou instantaneamente com o que viu. Rapidamente trocou a precisão das curvas pela agilidade das retas longas.

Começou junto com o Tio, que é mecânico, a aprender sobre motores, mas como era novo ainda não podia dirigir, apenas dar umas aceleradas. Com isso. uma situação engraçada aconteceu, durante um teste que fazia com um uno no dinamômetro, o tio deu permissão pra ele acelerar o carro, e na busca para ver qual era a potência final dele, o motor estourou. Seu tio tinha acabado de colocar pistões novinhos e eles foram pro espaço basicamente, ele queria matá-lo ao mesmo tempo que não parava de rir. 

Depois de se tornar maior de idade, começou a treinar no autódromo de Curitiba aos fins de semana, aos poucos foi ficando cada vez melhor. O seu ponto fraco era a largada, derrapava um pouco e perdia tempo, era difícil manter o carro em linha reta depois do tranco do motor. Depois de pegar mais prática, rapidamente começou participar de eventos locais. A primeira corrida foi na pista de Cascavel. Ganhou a primeiro corrida como profissional. De lá pra cá foi só subindo.

Arrancada 2
O chevy opala de João antes das modificações

No início do ano, se tornou piloto da equipe de Helder Gandolfo, um dos maiores nomes de arrancadas no Paraná, mirando uma boa participação no Armageddon desse ano. Como é um dos mais novos, acredita que tem muito ainda a evoluir ficar ainda melhor e quem sabe um dia participar de um evento da NHRA.

As  arrancadas tem ganhado cada vez mais popularidade e prestígio no Brasil, e ouvir um pouco da história dos pilotos que participam delas, mostra um pouco de seus mundos. São pessoas que vivem um pico de adrenalina durante 402 metros (cerca de um quarto de milha) em menos de 10 segundos. 

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