A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aumentou sua bancada feminina de 19 mulheres para 25 candidatas eleitas em 2023. O número de deputadas no órgão estadual cresceu 31,57%. Das definidas pela população nas urnas, 13 foram reeleitas e outras 12 ou inauguraram pela primeira vez na Casa ou voltaram ao cargo após um ou dois mandatos fora.
Neste ano, segundo o veículo de comunicação Gazeta de S. Paulo, dos 2.059 nomes nas urnas disputando por uma vaga na Alesp, apenas 677 eram mulheres, o que representa 33% do total. O crescimento feminino nos espaços de poder ainda é tímido, porém, a legislatura de 2023-2026 terá a maior representatividade feminina da história da Assembleia. As deputadas eleitas no último dia 2 de outubro representam 27% do total de 94 cadeiras no Legislativo estadual.
Embora a representatividade feminina tenha aumentado nas cadeiras do Parlamento Paulista, os dados apurados pelo TSE mostram que ainda existe uma alta sub-representatividade feminina. Se por um lado elas representam 52% da população brasileira, no outro extremo, ocupam apenas 12% das prefeituras, somente 15% do Congresso Nacional e nem 4% nos governos estaduais. Apesar de serem a maioria do eleitorado, o número de candidatas (33,6%) é quase a metade do número de candidatos homens (66,4%).
Partidos e suas representantes
A atuação do Legislativo estadual ficou em evidência por questões de gênero nos últimos anos. Na visão da cientista política e professora da PUC-SP Rosemary Segurado, as parlamentares eleitas souberam explorar os últimos acontecimentos polêmicos da Câmara em suas campanhas. “Em algumas campanhas foi possível notar a articulação dessas discussões importantes em relação a violência contra as mulheres e, principalmente, a violência política contra as mulheres.”
Liderando as três mulheres mais bem votadas para a Câmara neste ano, a deputada Paula Nunes dos Santos, da Bancada Feminista do PSOL, obteve 259 mil votos. Em seguida, Ana Carolina Serra (Cidadania) e Bruna Furlan (PSDB) ficaram com cerca de 190 mil votos cada uma. As parlamentares eleitas são novas no órgão estadual, e tirando Furlan, que já tinha um cargo político de deputada federal, Nunes e Serra são estreantes na política.
Divididas por 13 partidos, as parlamentares eleitas foram contabilizadas sendo 5 do Partido dos Trabalhadores - esse com maior número de mulheres para 2023 na Alesp - 4 do Partido da Social-Democracia Brasileira, e 4 do Partido Livre.
Em conversa com o Contraponto Digital, a deputada estadual Carla Morando enxerga que seu partido, o PSDB, equilibra a inserção feminina na política. “Sempre deixaram espaço para a presença de mulheres dentro do partido. Foram muitas as parlamentares que ocuparam quadros de primeiro escalão no governo do estado comandado pelo PSDB.”
Morando contempla que as mulheres vêm sendo combativas e estão conseguindo conquistar cada vez mais espaços dentro do poder público. A deputada afirma que o interesse feminino pela política vem aumentando gradativamente.
“A mulher já vem buscando cada vez mais a política. Esse processo vem acontecendo desta maneira, pois as bancadas femininas têm sido propositivas em suas ações, fiscalizando o debate no Legislativo e Executivo”, destaca a parlamentar.
Em um panorama geral, a sociedade tem reconhecido esse aspecto da eleição de mulheres para os parlamentos, bem como a nomeação em cargos de administrações públicas vem aumentando. “O atual momento do Brasil e Estado tem mostrado a preocupação de todos com a efetividade das ações, diminuindo esse tipo de comportamento. Ainda é necessário seguir trabalhando bastante para avançar ainda mais”, diz Morando
Para a jornalista, cientista política e pesquisadora em Comunicação e Política na Sociedade do Espetáculo, da Cásper Líbero, Deysi Cioccari, as mulheres tendem a ser combativas no campo das ideias, mas ela acredita que há certo respeito por serem minoria e um sentimento de união que existe também entre as mulheres. “O embate pode ser muito no campo ideológico, como tem que ser, mas jamais para aquele confronto que a gente vê na ala masculina mesmo, de agressão simbólica, verbal. Isso eu não acredito. Mas no campo das ideias é sempre a oposição democrática”, pontua Cioccari.
Segundo Cioccari, um dos confrontos no papel da mulher na política ocorre devido à ligação instantânea da imagem feminina à pauta feminina. “Quando elas entram na política, parece que não conseguem ser políticas se não for longe do feminino e isso acaba afastando-as da participação política, não só da Alesp, mas como um todo.”
Cioccari afirma não ver as mulheres em pé de igualdade com os homens para discutir questões econômicas ou orçamentais devido ao machismo e misoginia instaurados na política brasileira. Essa diferença se dá também pela própria Constituição da Alesp. “Outro ponto divergente ocorre na estruturação das bancadas, quando as bancadas são femininas, há uma conversa maior, quando as mulheres discutem política, a busca é pelo entendimento. Já quando os homens discutem política, há uma certa busca pelo dissenso.”
Crescimento da Bancada Feminina nos últimos anos
Em 2014, a Câmara contava com apenas 11 mulheres eleitas. Já no ano de 2018, o número de parlamentares femininas subiu para 19. Essa quantidade de mulheres na composição da Casa já era considerada uma marca histórica. Agora, com mais 6 deputadas eleitas, a Assembleia paulista teve um aumento de 31, 57% da representação feminina no órgão estadual.
“O crescimento ainda é bastante lento, ainda que a gente possa e deva comemorar um aumento de representatividade feminina, não podemos esquecer que ainda estamos muito longe da paridade e da igualdade de condições”, afirma a advogada eleitoral Paula Bernardelli.
Esse tardio e tímido avanço decorre de um cenário influenciado por diversos fatores, como pontua Bernardelli. “Existem partidos que, em regra, têm baixíssima democracia interna, um ambiente político ainda muito machista e com muita violência política de gênero, e uma sociedade muito conservadora com relação aos papéis de gênero, que ainda não vê com bons olhos a mulher fora do ambiente doméstico e disputando espaços de poder”, diz.
Porém, em um panorama geral, a advogada enxerga com bons olhos a questão de votar e eleger mulheres, que têm ganhado destaque a cada eleição. De acordo com Bernardelli, a sociedade brasileira se encontra em um cenário mais positivo para as mulheres que lançam suas candidaturas.
Legislativo e incentivo da participação das mulheres na política
Desde a década de 90, têm sido implementadas regras eleitorais com o objetivo de aumentar a quantidade de mulheres, tanto candidatas como eleitas, em eleições proporcionais. Entre elas, está a Lei eleitoral 9504/97, estabelecendo as cotas de gênero nas candidaturas. “A reserva de cadeiras no Parlamento parece ser a medida com resultados mais imediatos que poderia ser adotada. Para além e independentemente dela, são necessárias políticas de incentivo que efetivamente alterem a estrutura machista da política, protegendo e acolhendo mulheres que se lançam nesses espaços”, frisa a advogada Paula Bernardelli.
Outra lei criada para apoiar esta representatividade das mulheres na política é a Lei 12.034/2009, que transformou obrigatório o preenchimento do percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas.
A PEC 18/2021, apresentada pelo senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e com o apoio de outros 28 senadores, procura garantir que as candidaturas femininas sejam efetivamente financiadas pelos partidos políticos. A proposta, que tem como relator o senador Nelsinho Trad (PMDB-MS), insere na Constituição uma regra que foi introduzida em 2015 na Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096, de 1995): a reserva mínima de 5% do fundo partidário para a criação, manutenção e promoção de campanhas de mulheres na política.
“Quando se luta por mais mulheres na política é natural e esperado que o resultado seja um aumento de mulheres em todos os espectros políticos. As políticas de incentivo ao lançamento de mulheres trazem vantagem a todos os partidos. A ideia da luta por mais mulheres é justamente que mulheres são diversas e podem ser representantes políticas de pessoas e pautas diversas, assim como são os homens”, pontua Bernardelli.
Caminhos que incentivam transformações
Contudo, quanto mais mulheres estiverem nos espaços de poder, mais possibilidade há de se eleger parlamentares que lutam pelo direito das mulheres. “Ainda temos um caminho muito longo pelo aumento dessa representação das mulheres e acredito que isso expressa também muito sobre como é a dinâmica, tanto política quanto eleitoral, nas regiões do país”. Ela afirma que não há mais como usar as mulheres “como laranjas”, ou seja, colocarem candidaturas que não vão ser efetivas apenas para cumprir a questão eleitoral.
Para possibilitar a diminuição da falta de equidade e igualdade na distribuição de poder, a advogada e cientista política Gabriela Rollemberg enxerga como fundamental que a sociedade olhe para dentro dos partidos políticos.
“Precisamos notar as governanças desses partidos, para como eles destinam os seus recursos, do fundo partidário, do fundo eleitoral. E, precisamos controlar e cobrar mais coerência deles, para que se crie, de fato, um estímulo para aprimorar o que acontece hoje”, afirma a advogada.
Do ponto de vista de Rollemberg, “hoje, basicamente, o destino dos recursos é definido pelo presidente do partido, no máximo, ou com o tesoureiro. E são sempre homens e homens brancos que definem isso. E, obviamente, essa questão tem todo um peso na perpetuação do poder dentro do partido, na forma de distribuição dos recursos e na conversão de candidaturas em mandatos”.