O Oscar é representativo apenas para norte-americanos

Ator nipo-brasileiro critica indústria hollywoodiana
por
Bárbara More
|
28/06/2023

O protagonismo asiático no Oscar 2023 chamou a atenção do mundo. Pela primeira vez em 95 edições da premiação, uma mulher amarela levou para casa a estatueta de Melhor Atriz. Michelle Yeoh ganhou o carinho da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas por sua performance em Tudo Em Todo O Lugar Ao Mesmo Tempo, produção que colecionou sete prêmios na noite do dia 13 de março, incluindo melhor Filme. Ke Huy Quan também foi prestigiado com a conquista do título de Melhor Ator Coadjuvante por sua interpretação do personagem Waymond Wang.  

A primeira obra asiática a levar o maior prêmio do Oscar foi o longa-metragem sul-coreano Parasita, consagrado Melhor Filme em 2019, além de também ter conquistado as estatuetas de Melhor Direção. Melhor Montagem, Melhor Direção de Arte. Melhor Roteiro Original e Melhor Filme Internacional. No entanto, até onde vai a representatividade na cerimônia da Academia e como ela afeta o Brasil?  

O ator de ascendência japonesa Ricardo Oshiro – que trabalha majoritariamente com teatro, mas também fez parte de produções cinematográficas como Ó Paí  Ó -opina que Hollywood está visando expandir o seu mercado e nunca teve um interesse genuíno em apresentar diversidade de etnias. Em entrevista ao Contraponto Digital, o artista celebrou que a cerimônia está se tornando mais inclusiva, mas foi crítico ao analisar que o Oscar tem relevância para o ocidente. 

“Para nós, como brasileiros, tem esse peso de representatividade. Por outro lado, eu como ator amarelo no cenário brasileiro, não sei como isso impacta a mim. É importante o prêmio por uma questão de visibilidade”, começou o ator. Ele ainda continuou a expor sua visão pessoal: “Para mim, o Oscar não é o prêmio do cinema, é o prêmio dos americanos e de Hollywood. Fico até surpreso que eles deem prêmios para outras etnias. Que bom, talvez estejam olhando mais para fora do próprio umbigo.” 

Ao ser questionado sobre a onda de investimento em produções asiáticas, o ator ressaltou que o objetivo de Hollywood é lucrar.  

“Fico feliz, mas eu acho que é muito uma questão de globalização, de abertura de mercad. O mercado chinês é um consumidor ávido. Eu sei que existe até uma censura hoje em Hollywood para agradar o estado chinês, para os filmes da Marvel não serem tão barrados lá. A bilheteria de Hollywood hoje conta com o público chinês.” Em sua reflexão, Ricardo ainda pontuou  que desconfia das reais intenções de Hollywood: “Sempre fico com um pé atrás. Eles estão preocupados com a representatividade ou com a grana da china em bilheteria? A gente acaba sendo levado por esse grande jogo da indústria cinematográfica.” 

As plataformas de streaming estão recebendo cada vez mais títulos de países como Japão, Coreia do Sul e China em seus catálogos. Além disso, adaptações de contos de fadas e histórias em quadrinhos também estão em alta.  

“Alice in Borderland é uma produção japonesa baseada em um mangá. Round 6, produção coreana muito inspirada em mangás japoneses. Isso é muito legal para eles lá, mas isso me representa como brasileiro de biotipo amarelo? Acho que não né, não posso me iludir”, disse Oshiro. O descendente de japoneses ainda compartilhou como a alta de produções asiáticas o afetou na adolescência: “Nos anos 1980, produções dos anos 1960 vinham para cá do Japão. Ultraman Spectreman, já coisa velha, mas fazia um sucesso absurdo até anos 1990. Isso acaba refletindo em nós brasileiros de ascendência asiática. Entre amigos, a gente vira o Ultraman.” 

Oshiro ainda adicionou que, apesar de os brasileiros não serem muito inclusivos, consomem produções asiáticas por influência dos Estados Unidos.  

“A gente aqui parece que fica sempre surfando na onda do que acontece fora. Como aqui no Brasil as pessoas estão pouco se lixando se eu sou de ascendência japonesa, coreana ou chinesa, tudo é: Ô Coreia, fala China! É tudo genérico. A gente acaba surfando nessa onda pop asiática.” 

Atrizes brasileiras 

Ricardo Oshiro não é o único artista amarelo que fala com sinceridade sobre a realidade de asiáticos e descendentes no Brasil. As atrizes Ana Hikari e Jacqueline Sato já expuseram suas visões sobre a representatividade na indústria cinematográfica.  

Em conversa com a revista Marie Claire, Ana foi direta ao ressaltar que a população brasileira é formada ela miscigenação de povos, o que deveria ser representado nas telas. 

“Para mim também não faz sentido a gente viver em um país que se auto intitula diverso e isso não ser representado no audiovisual”, começou a atriz. Ela ainda adicionou a importância de pensar em todas as etnias: “E quando digo isso, não estou falando apenas de pessoas amarelas, não. Também falo em relação a pessoas indígenas, negras, pessoas com deficiências.” 

A artista também afirmou que gostaria de ver mais integrantes amarelos no elenco de produções, mas faltam oportunidades. 

“Olho para os lados e não vejo mais nenhuma atriz asiática contratada [...] Não quero ser a única. Eu sei que existem vários atores e atrizes asiáticas muito talentosos e que não tem oportunidade”, disse Ana. 

Jacqueline Sato levantou um importante ponto ao revelar ao jornal Metrópoles que não se sentia bem com sua aparência porque não via pessoas de seu biótipo na mídia. 

“Durante a maior parte da minha vida eu me senti feia, não aceitava meu corpo como era, queria melhorar, mudar, para me adequar ao padrão de beleza vigente. Era como se não adiantasse eu estudar e ser boa atriz, eu precisava modificar algo em mim para que me vissem como uma opção, afinal, em muitos testes eu escutava: Ah, mas você não é brasileira, né? E em outros: Ah, mas você não é bem japonesa. Então, qual era o meu perfil?” 

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