Por Beatriz Monteiro Loss
Já passava das onze horas da noite quando Juliana e Ana Luiza, ao aproveitarem a sexta-feira pós aula e estágio, foram roubadas na Rua Ministro Godói, em Perdizes. O sentimento nos movimentados bares que rodeiam a universidade onde estudam, a PUC-SP, que deveria ser de segurança e diversão, foi substituído por outro, muito mais negativo e desagradável: o medo.
A insegurança, a falta de proteção, raiva e uma sensação de impotência foram as principais marcas narradas pelas vítimas, claramente abaladas com a situação. A universidade, que deveria ser um espaço onde os alunos e professores se sintam protegidos, passou a ser mais um dos lugares onde as pessoas não podem ficar totalmente confortáveis.
Juliana e Ana Luiza contaram que estavam começando a se sentir mais à vontade em relação a pandemia, com a volta presencial das aulas na universidade. A chegada da pandemia de Covid-19 no início do ano de 2020 trouxe uma sensação de pânico e medo dessa nova doença que, até então, era desconhecida. Fomos obrigados a nos isolar e ficar em casa por um tempo e pensamos que passaria logo.
O especialista Gilson Iannini, professor do Departamento de Psicologia da UFMG, explicou que no contexto da pandemia, o perigo é invisível e, por também ser desconhecido, os indivíduos não estão preparados para lidar com ele, já que, na nossa cultura, não há disponível um repertório transmitido simbolicamente para enfrentá-lo, portanto, o medo nessa situação, é praticamente inevitável.
Em janeiro de 2021, chegaram as primeiras vacinas ao Brasil e, com isso, o sentimento de alívio pôde começar a tomar conta de nós novamente. A vacinação, claro, não foi a mais rápida e ágil do mundo, mas de qualquer forma, foi e tem sido de essencial para a melhoria da situação do País. Mesmo com muitos deslizes do governo, hoje mais de 80% da população brasileira já está vacinada com mais de uma dose da vacina e os números de contágios e mortes também diminuíram drasticamente. As duas estudantes contam que a segurança que achavam que teriam foi uma ilusão, porque apesar de não ter mais o medo de se contaminar com o coronavírus, não conseguem andar sozinhas nem dentro da própria universidade.
Ana Luiza é estudante de direito e cursa o período da manhã. Ela conta que ficou sabendo dos relatos de roubos, furtos, golpes e assédio, através de mensagens compartilhadas via WhatsApp e, em seguida, viu também posts em uma página de relacionamentos no Instagram, gerenciada por alunos da PUC. No momento em que recebeu os primeiros relatos, estava no meio da primeira aula de quinta-feira e, como iria embora andando para o metrô sozinha, logo deu jeito de arrumar alguém que fizesse o mesmo caminho para que pudesse ir acompanhada.
Juliana é estudante de publicidade e cursa o período noturno, horário de onde vinham os relatos mais preocupantes. A aluna, que vai para a faculdade de carro, deixa-o em um estacionamento no quarteirão ao lado da PUC. Ela afirma que mesmo não tendo que fazer todo o percurso até o metrô Barra Funda, sente medo no curto pedaço que tem que caminhar para acessar a universidade. Além disso, tem duas amigas que moram ao lado do estacionamento e combinaram de se esperar para ir e voltar da aula, dessa forma, nenhuma ficaria sozinha.
Os relatos de assédio, diferentemente dos de roubos e furtos, são de dentro do próprio campus, e não dos arredores. Sendo assim, fica um pouco mais complicado tentar escapar. Todos os relatos sobre assédio foram feitos de forma anônima e, portanto, não foi possível nenhuma entrevista. Apesar disso, os casos aconteceram de forma semelhante e aparentemente, vindos do mesmo homem, que não é um estudante da universidade. Esse homem seguiu as estudantes e chegou até a entrar no banheiro feminino atrás delas, fazendo com que elas se escondessem na cabine e ficassem lá por muito tempo, até ele ir embora.
Ana Luiza e Juliana foram roubadas de formas diferentes. Juliana caiu em um golpe de um vendedor ambulante, em que o cartão é trocado no momento do pagamento. Muitas vezes, por preguiça ou por facilidade, as pessoas optam por comprar bebidas ou cigarros desses vendedores por estarem mais perto do que os bares ou a banca de jornal, mas às vezes vale mais a pena dar alguns passos extras do que ter seu cartão trocado sem perceber. E Ana teve seu celular furtado no primeiro dia de aula. Além dos casos de Ana Luiza e Juliana, houve outros também tipos de relatos, de roubos com facas e canivetes.
Claramente incomodados, os estudantes foram atrás de possíveis soluções para o problema. Tentaram conversar com a Reitoria da universidade, que não demonstrou interesse em ajudar. E, além disso, deu uma entrevista ao SPTV dizendo que só estavam sabendo de um único relato de roubo nos arredores. Foram até a delegacia de polícia mais perto para propor algum tipo de vigilância em volta da faculdade, o que também não foi colocado em prática.
O legado da PUC-SP, de ser uma universidade democrática, sem catracas e onde a polícia não pode entrar, é um fator de muito orgulho pra muitos de seus alunos, porém, alguns recém ingressados começaram um movimento nas redes sociais pedindo para instalarem catracas nos portões. O movimento claramente não foi pra frente, visto que é a universidade tem seus princípios e impor catracas vai contra os ideais da faculdade.
Os relatos e reclamações não foram suficientes e nada mudou na segurança da PUC-SP. O aumento no índice de roubos e furtos não foi uma situação exclusiva do bairro de Perdizes ou da PUC-SP, o número cresceu em toda a cidade de São Paulo. A capital teve aumento de 10% aumento de 10% nos roubos em geral, em janeiro, (de 10.739 para 11.846) em 2022 em comparação com o mesmo período de 2021. Nos furtos em geral, a alta foi de 23,4% (de 13.148 para 16.231). Esses números refletem vários indicadores de violência.
Na avaliação do professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) e pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública Rafael Alcadipani, uma combinação de fatores pode estar por trás do aumento dos roubos em São Paulo. Ele acredita que com a diminuição das restrições impostas pela pandemia, as pessoas estão circulando mais. Há ainda a questão econômica, "estamos com uma situação grave e isso significa que devemos ter um crescimento da quantidade de roubos, mesmo" e essa realidade aponta para fatores estruturais muito importantes. "O governo ganhou os louros quando os crimes caíram muito nos primeiros meses da pandemia e agora está subindo e acaba não tendo tanta responsabilidade assim", diz o especialista.