Negligência hospitalar envolve incertezas e falta de comunicação

Profissionais da saúde compartilham suas experiências com um olhar atento à complexidade e à gravidade das falhas hospitalares
por
Mohara Ogando Cherubin
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29/05/2025

Por Mohara Cherubin

 

Por detrás de jalecos brancos, andares silenciosos e corredores iluminados por luz fria, histórias marcadas por diversas possibilidades resistem no íntimo dos profissionais. Um diagnóstico incorreto, a atuação de profissionais que acreditam estar aptos a resolver determinada situação, mas que não possuem a qualificação adequada, ou ainda um falso entendimento da complexidade do caso escancaram uma realidade ainda presente nos hospitais: a negligência que pode comprometer vidas.

Aline Thomáz é médica geriatra e vivenciou as consequências da atuação de profissionais negligentes em um lugar pouco experimentado pelos profissionais da saúde, dessa vez era ela quem recebia notícias devastadoras. A médica tinha um sobrinho de 5 anos, uma criança mais frágil que as demais devido a uma condição do tipo neuromuscular que o tornava extremamente vulnerável. Era muito magro e não tinha força muscular, logo um simples resfriado já resultava em uma grande preocupação, já que a criança não tinha forças para ter uma tosse efetiva, gerando o acúmulo de secreção e agravando a doença. Em uma dessas ocasiões foi levada ao pronto-socorro pela família e o médico responsável, cercado pela pressa de atender os demais pacientes, forneceu um diagnóstico de asma, não identificando a gravidade da criança e o mandado para casa.

Dois dias depois a criança retorna ao mesmo pronto-socorro, já apresentando uma situação de piora clínica, na qual foi indicada a internação, seguida de uma intubação. Todavia, o profissional responsável pelo procedimento não era apto para tal, e tampouco pediu por ajuda, realizando-o incorretamente. As consequências foram um dente quebrado e broncoaspiração, causada pela entrada acidental de substâncias estranhas nas vias aéreas inferiores (bronquíolos e pulmões). Após o procedimento mal sucedido, Danilo recebeu o diagnóstico de pneumonia química. As complicações foram irreversíveis e a criança morreu no dia seguinte, ainda no hospital.

Aline, ao se referir ao pronto-socorro, um ambiente de altíssima sensibilidade, reitera que o profissional da saúde deve ser sempre mediador do conflito e não causador do mesmo. Em um momento que demanda um atendimento ágil, o médico deve sempre demonstrar alta sensibilidade com o paciente, tendo em vista que os diagnósticos de pronto-socorro são, geralmente, muito amplos. Logo, se não existe a certeza do diagnóstico e esse indivíduo vai precisar ser reavaliado, o melhor a fazer é interná-lo, em vez de mandá-lo para casa, para que desse modo o paciente tenha mais tempo de contato com o médico e receba o devido diagnóstico. O caso do Danilo é um exemplo do que pode acontecer quando o médico não reavalia um diagnóstico amplo e se torna o causador do conflito.

Para Janaina Martins, enfermeira especializada em Centro Cirúrgico, a falta de comunicação é um dos principais problemas quando nos referimos a situações de negligência hospitalar. Para além de uma comunicação precisa, as instituições necessitam registrar todas as informações no prontuário do paciente, o maior veículo de comunicação entre as equipes profissionais, entre o próprio indivíduo e família e entre a fonte pagadora, seja um convênio ou o próprio SUS. Janaina ainda comenta um caso de transporte de paciente, presenciado no início de sua carreira, um exemplo evidente do que a falta de uma comunicação verbal pode causar a um paciente. No caso, uma paciente chegou ao pronto-socorro com queixas de fortes dores abdominais, sendo rapidamente encaminhada para um ultrassom de emergência. Todavia a equipe do serviço de diagnóstico de imagem não foi informada que se tratava de uma paciente diabética, dependente de insulina e que estava em jejum prolongado, e acabaram realizando um ultrassom simples de abdômen. Após o exame, ela foi encaminhada para um tomografia, um procedimento ainda mais demorado, no qual identificou-se que o ultrassom estava incorreto. A equipe retornou à sala de ultrassom para realizar o devido exame na paciente, e quando as luzes do ultrassom foram acesas, a paciente havia tido uma parada cardiorespiratória.

Devido a falta de comunicação e vigilância para com a pessoa atendida, a paciente, ainda hoje, sobrevive com o suporte de uma traqueostomia, um recurso ventilatório que custou a sua fala. Ademais, o período de parada causou sérios problemas neurológicos, físicos e a família ficou muito abalada. Por fim, Janaina revela que a paciente era a filha dos donos do hospital. A comunicação entre os profissionais de saúde sempre deve ser assertiva, pois falhas como essas podem acontecer e custar a qualidade de vida de qualquer paciente.

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