Existe uma série de TV americana, chamada The Handmaid's Tale (baseada no livro O Conto da Aia, de 1985, da escritora canadense Margareth Atwood), em que a sociedade vive num futuro distópico onde a taxa de natalidade cai para níveis muito baixos, mulheres férteis são escravizadas e obrigadas a gerar filhos para as famílias de classes mais ricas e poderosas. Além disso, o conservadorismo religioso e a lógica patriarcal dominaram a cultura da sociedade. As mulheres não possuem autonomia de nenhum tipo em relação ao próprio corpo. Nessa série, elas não só servem apenas para reprodução, como são violentadas em rituais religiosos e abusivos.
Parece um futuro irreal e distante, mas a série tem sido inspiração para protestos em diferentes lugares do mundo a favor da legalização do aborto, pois na série as mulheres não podem escolher não engravidarem. E a crítica é certeira: a ilegalidade do aborto deposita no estado o poder sobre o corpo da mulher e, consequentemente, a sua vida, tornando a mulher escrava da sociedade.
No Brasil, ocorrem 1 milhão de abortos induzidos por ano. A cada dois dias uma mulher morre por aborto inseguro e pelo mesmo motivo são 250 mil internações de no SUS (Sistema Único de Saúde) por ano. Todos os dados de acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).
Segundo o Código Penal Brasileiro, o aborto é permitido apenas em três condições: quando a gestação é consequência de um estupro; em caso de risco de vida para a mãe ou quando o feto é acéfalo.
O aborto é ilegal no Brasil porque é considerado crime contra a vida, porém é evidente que é uma realidade no país. A advogada Mariana Mattos explica: partindo da premissa que o aborto é uma realidade social, o Estado tem que incluir esse tipo de assistência no sistema de saúde. Dessa forma, o país só estará pronto para uma eventual legalização quando houver a conscientização de que o aborto faz parte da história da humanidade, e continua existindo. Daí o dever do Estado de garantir as condições médicas básicas para um aborto seguro, evitando inclusive o óbito da gestante.
O aborto é um assunto que gera polêmica e divergências de opiniões no mundo inteiro e é igualmente um problema, pois segundo site do governo francês uma mulher morre a cada nove minutos por aborto clandestino, no mundo. Dado que transita entre países desenvolvidos onde já é legalizado e países que possuem sérios problemas em relação à isso. Como a França e o Brasil, respectivamente.
Enquanto esse cenário se desenvolve no Brasil, em outros países o tema tem outra perspectiva. Como por exemplo na França, o aborto não só é legalizado como existem campanhas para tornar essa prática cada vez mais acessível para todas as mulheres. A estudante do Instituto de Estudos Políticos de Paris, Célia Chenin afirma: "A gente nasce e cresce aprendendo que aborto é algo normal. Até na escola a gente aprende que isso é um direito da mulher".
Em 1974 a então Ministra da Saúde, Simone Veil, realizou um discurso na Assembleia a favor da descriminalização do aborto, para que um ano depois, em 1975 fosse descriminalizado a Interrupção Voluntária de Gestação (IVG), como chamado na França. Portanto, hoje o aborto pode ser realizado até a 12ª semana de gestação, requisitado pela mulher, caso a mesma justifique não possuir condições sociais ou econômicas para se tornar mãe. Além disso, menores de 18 anos necessitam da autorização dos pais.
O procedimento muda de acordo com a quantidade de semanas da gestação, porém durante todo o processo (seja ele qual for) possui acompanhamento médico. E, a partir de 2013, o reembolso total dos custos do aborto é realizado pelo governo.
Um site do governo do Programa Planning Familial -que busca oferecer suporte para as mulheres - mostra dados que 35% das mulheres abortam, pelo o menos, uma vez na vida e 220 000 abortos são praticados todos os anos na França.
Existe toda uma cultura por trás dessas políticas e dessa prática no país europeu, uma conscientização e educação sexual para que a população lide com isso de uma forma mais racional. “Não é tabu, mas é algo difícil de viver. Todos querem ter essa liberdade mas ninguém quer que esse momento chegue.”, finalizou Célia.