Mais que um filme cor de rosa

Com a marca de US$1,2 bilhão em bilheteria global, o longa Barbie dá o que falar
por
Tábata Santos
|
29/08/2023

O filme Barbie, com direção de Greta Gerwig e estrelado por Margot Robbie, causou alvoroço antes e após o seu lançamento no dia 20 de julho deste ano e a razão gira em torno de fatores como classificação indicativa, sexismo e masculinidade frágil.

Muito se falou nas redes sociais sobre a faixa etária à qual o filme é indicado, mas afinal, Barbie é um filme feito para crianças? A resposta, para muitos, é não! Ou pelo menos é o que diz a Juliana Martine, mãe da Melissa, de 7 anos. “Da noite para o dia a minha filha acordou em um mundo cor de rosa, todas as lojas de roupas ou de brinquedos estavam tomadas pela figura da Barbie, é automático que iriamos pensar que o filme foi feito pra ela, foi decepcionante.” conclui.

O mundo cor de rosa, a boneca em si e os trailers misteriosos podem ter induzido a associação ao público infantil, contudo, quando falamos sobre a Barbie, não estamos falando apenas sobre crianças, mas sobre uma era de mudanças e empoderamento feminino.

Criada oficialmente em 1959, pela cofundadora da empresa de brinquedos Mattel, Ruth Handler, a Barbie foi inspirada na filha de Handler, Bárbara, e na boneca de quadrinhos adulta Bild Lilli, carregando oficialmente o nome Bárbara Millicent Roberts.

A ideia da boneca surge a partir da percepção de Ruth de que todas as bonecas infantis do mercado eram modelos de bebês, que propositalmente induziam o maternal, a vida doméstica e acentuavam o patriarcado na sociedade. Com isso, ela traz uma boneca adolescente, moderna, independente e que rompe com os papéis tradicionais atribuídos às mulheres na época.

Barbie foi desde o início uma inovação revolucionária no mundo dos brinquedos e da moda e a sua estratégia de marketing ligada à publicidade televisiva contribuiu para que mais de 1 bilhão de bonecas Barbie tenham sido vendidas em mais de 150 países.

O maior objeto de desejo de crianças e adolescentes na década de 60, também carregou críticas ligadas ao estereótipo e mundo perfeito, além de causar insegurança no público masculino que se preocupou com a noção de liberdade que a boneca transmitia ao público feminino. A Mattel conseguiu superar os receios masculinos demonstrando lucros que lhes eram convenientes e quebrou barreiras ao conseguiu acompanhar o avanço da sociedade, trazendo inclusão com bonecas de todas as cores, pesos e diferenças possíveis, o que perpetuou a Barbie como a maior boneca da história.

Com o filme, a ideia da Barbie voltou a ter notoriedade e as expectativas do público é o reflexo da trajetória da boneca durante todos estes anos. Não houve propagandas ligadas à produção do longa que mencionasse ser um filme feito para crianças, apesar do trailer sugestivo que exibia crianças quebrando suas bonecas em forma de bebê e se encantando com a boneca em forma adulta, porém a classificação indicativa é clara: para maiores de 12 anos.

O que colaborou para gerar insatisfação nas crianças menores de 12 anos e seus pais, é que marcas de todas as esferas tornaram a boneca e a cor de rosa a sua identidade nos últimos meses. Bonecas, livros, roupas, sapatos, utensílios domésticos, bolsas, acessórios e muitos outros produtos se apoiaram nesse lançamento e inflaram as expectativas do público, o que pode ser considerado ruim se pensarmos no número de críticas ou muito bom se nos basearmos na bilheteria global do filme, que atingiu a marca de US$ 1,2 bilhão, independente se isso gerou críticas negativas ou positivas ao filme.

Não foram somente as crianças que se frustraram, mas o público conservador, em sua maioria homens, também. Segundo o cinéfilo Robson Signorelli, a frustração se dá devido ao humor ácido que existe no filme ao retratar os homens como secundários às mulheres. “É engraçado, o filme traz como protagonista a personagem de uma mulher, Barbie, e alguns homens ainda assim esperavam serem retratados como algo superior. O filme foi fiel à proposta da boneca de empoderar as mulheres, incentivá-las a ter independência e tudo que o patriarcado condena, é natural que haja tantas críticas em torno disso.”, reflete.

Atrelado a criação da Barbie, surge o Ken, figura masculina que Ruth Handler criou em 1961, inspirada também em um de seus filhos, com a finalidade de ser o par romântico da Barbie. O boneco é moderno, bronzeado, vaidoso e atende a todos os desejos de sua amada, além de desempenhar um papel complementar como coadjuvante nos filmes.

A negativa masculina quanto ao filme da Barbie, acontece porque no longa há uma rivalidade entre ela e o Ken, que se acentua quando ele passa a se enxergar como superior às mulheres da Barbielândia (mundo da Barbie), após ter tido uma experiência no mundo real e adorado a ideia de viver em uma sociedade machista, sexista e misógina. Todavia, o Ken é retratado com sarcasmo e humor ácido, através de um personagem falso, frágil e desprovido de inteligência, que além de não ter uma identidade marcante, não consegue superar a inteligência feminina em nenhum aspecto.

Mesmo com a popularidade da boneca Barbie e dos mais de 40 filmes infantis já lançados tendo ela como protagonista, era incerto o que poderíamos esperar do longa de 2023. A personagem continua sendo uma figura inspiradora que representa hoje, não só o empoderamento feminino, mas a juventude em que sonhávamos nos tornar adultas como ela.

O filme traz a nostalgia da criança que cresce idealizando viver na Barbielândia  e se depara com o caos do mundo real que exclui e banaliza a mulher e expõe de forma cômica o que o patriarcado tenta esconder.

A diretora Greta Gerwig, que teve o roteiro assinado por ela e seu marido, o também diretor Noah Baumbach, não se dedicou para criar um filme anti-homem e nem para dar à Barbie o título de feminista, visto que durante a trama há tanto a masculinidade tóxica e violenta e desvalorização da voz da mulher na sociedade, quanto questões que exploram as fragilidades masculinas e os impedem de expressar os seus sentimentos para não parecerem vulneráveis, o que é também um problema social acentuado pelo machismo. Para a revista Rolling Stone, Greta conta que a intenção do filme e todas as escolhas feitas por ela quanto a cenário, fotografia, enredo e humor, é para algo muito maior do que apenas tratar sobre machismo e feminismo, “o filme trata da ideia de que qualquer tipo de estrutura hierárquica de poder que se mova em qualquer direção, não é boa.”

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