Kassab e PSD crescem no xadrez político de 2022

Partido desponta com Tarcísio em São Paulo, observa poder no Congresso e ensaia aliança com futuro governo Lula
por
Beatriz Loss, Julia Rugai e Pedro Galavote
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26/11/2022

 

 

Gilberto Kassab em audiência na Câmara dos Deputados. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

 

Conhecido por uma notável facilidade de transição entre os governos, Gilberto Kassab, presidente nacional do Partido Social Democrático (PSD), foi uma peça chave nas eleições de 2022 e na campanha do governador eleito do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e, agora, caminha para alinhamento da sigla ao governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

 

Há quem admire sua facilidade de transição entre os governos. Mas há também aqueles que enxergam suas movimentações como um jogo nas sombras da política brasileira. Pode-se dizer que Kassab caminha nestes dois campos e é considerado um grande articulador político.

 

De vereador à ministro do Estado, Kassab ocupou diversos cargos na política brasileira e transitou não só pelo governo Bolsonaro (PL), mas também por Dilma (PT) e Michel Temer (MDB). Diz enxergar-se como um político de centro ideológico e ressalta que o partido tem dado conta de carregar um posicionamento coletivo. “O Centro do equilíbrio, ponderação, é exatamente a saída para este cenário polarizado e, historicamente, a preferência do eleitor brasileiro tem sido o centro”, pontua Kassab. 

 

A insistência por um posicionamento coletivo, visando a “unidade do partido” - como mencionado diversas vezes durante uma recente entrevista concedida para o programa Roda Viva, da TV Cultura - fez com que o ex-ministro segurasse, a todo custo, seu posicionamento final para o segundo turno das eleições presidenciáveis deste ano. O comportamento era previsível e, enquanto é visto por alguns integrantes do partido como o movimento certo, para nomes que vagam há tempos pela política brasileira configurou a “preferência pelo jogo nas sombras dos bastidores políticos.” 

 

Kassab sempre foi uma figura presente nos bastidores. Logo na fundação do PSD, quando questionado sobre a ideologia do partido, o ex-prefeito respondeu que não era um partido nem de direita, nem de esquerda, nem de centro. Ainda assim, o ex-prefeito diz que a insistência em “pinçar” esta frase é um equívoco. “Jamais disse que o partido não seria de direita, de esquerda ou de centro. Explicava que a definição desse posicionamento seria coletiva, como de fato ocorreu”, pontua o presidente da sigla. 

 

O especialista Francisco Fonseca, cientista político e professor da PUC-SP, afirma que “essa é uma resposta muito simbólica porque com isso ele estava querendo dizer ‘olha, eu vou me adaptando aos diversos governos.’ Por exemplo, ele foi ministro de Ciência e Tecnologia da Dilma e logo em seguida aderiu ao golpe de 2016 e trabalhou com o Temer.”

 

Homem de terno e gravata com pessoas ao redor

Descrição gerada automaticamente

Dilma Rousseff e Gilberto Kassab em convenção do PSD. Kassab e Temer reativando Conselho de Ciência e Tecnologia. Fotos: Jorge Willian/Agência O Globo e Walter Campanato/Agência Brasil

 

 

Nas eleições deste ano não escolheu apenas um lado. Passou toda a campanha negociando com o então candidato à presidência, Lula, mas também apoiou o candidato de Bolsonaro no estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, uma vez que seu vice na chapa é Felicio Ramuth, parlamentar do PSD. Além disso, o partido é o mesmo de Alexandre Kalil, que foi apoiado por Lula ao governo de Minas Gerais. 

 

“O Kassab é um político muito hábil de bastidores, muito gelatinoso, pragmático e que, na verdade, não contribui pra uma vida política em relação a programas de governo. Está com o governo de um modo geral pra ser um certo intermediário de um conjunto de negócios. Aquilo que se chama de centrão, são negócios”, avalia Fonseca.

 

Mesmo com um pequeno encolhimento da bancada da Câmara dos Deputados, em relação ao número atual, a sigla encabeçada por Gilberto Kassab se exercita para projeções futuras. Em 2018, contava com 34 deputados federais. Atualmente, a bancada tem 46 e, com a eleição deste ano, somam 42 deputados federais. O cenário no Senado é diferente e o PSD ocupa a segunda maior bancada da casa, com 12 senadores, atrás do PL. 

 

O movimento, que mira uma ampliação do partido, não é de agora e tampouco será considerado o bastante com os resultados de 2022. Durante as eleições municipais de 2020, a sigla já apresentava bom desempenho quando passou de 539 para 655 prefeituras, acumulando 116 a mais que as eleições de anteriores e se consagrando como mais vitoriosa. As diferentes fotografias de pleitos antigos, e do atual, reafirmam Gilberto Kassab como um dos caciques na política. 

 

A capilaridade nacional conquistada ao longo destes anos ganhou mais fôlego durante as campanhas das eleições de 2022. No entanto, a sigla não foi capaz de lançar um candidato próprio que arcasse com a competição.

 

 

A candidatura de Tarcísio

 

Eleito governador do Estado de São Paulo no segundo turno, o candidato Tarcísio de Freitas (Republicanos) teve como uma importante força motora de sua campanha a figura de Gilberto Kassab. 

 

“A candidatura de Tarcísio e este apoio, a meu ver, foi uma percepção antecipada”, explica o coordenador de ações sociais e sindicais do PSD, Ricardo Patah. Ele diz que para o nascimento desta conjuntura, os diálogos com o partido foram além da figura de Kassab. O personagem responsável pelo sucesso desta articulação, que desembocou na parceria entre Tarcísio e o ex-prefeito, é Afif Domingos. 

 

Coordenador de campanha do candidato pelo Republicanos, Domingos é também um dos fundadores do PSD e tem como característica o trânsito entre os diferentes governos. Participou do ministério da Economia do governo Bolsonaro ao lado de Paulo Guedes e, a partir de seus conselhos, embarcou na candidatura de Tarcísio de Freitas. 

 

Patah conta que a escolha envolveu muito diálogo, comportamento que marcou os caminhos de Kassab durante a pandemia na visita de diversos diretórios em diferentes estados. Liderada por Tarcísio, a chapa foi uma das primeiras a definir o vice, Felício Ramuth, ex-prefeito de São José dos Campos, que trocou o PSDB pelo PSD no início deste ano. 

 

Kassab e Tarcísio

Kassab, Tarcísio e seu vice, Ramuth. Foto: Divulgação/Twitter

 

“Aqui em São Paulo o PSD definiu seu apoio à candidatura do Tarcísio de Freitas pois ele é o mais qualificado, honesto e bem preparado para fazer o Estado avançar, se desenvolver e melhorar a vida das pessoas que aqui vivem”, pontua Kassab ao Contraponto. Ele avalia que, diferente do PSDB, o PSD conseguiu se renovar e não enfrenta muitas dificuldades nas urnas.

 

Através de trocas de mensagem, o presidente nacional do PSDB, Marco Vinholi, comentou que enxerga Kassab como um grande articulador político e influente no cenário atual.

 

Mesmo ponderando o jogo de poderes que acontece, agora, no Estado de São Paulo, Vinholi diz que não acredita que o PSDB irá se dissipar e a articulação do PSD com o Republicanos não inviabiliza a restauração dos tucanos nos próximos anos. 

O especialista Francisco Fonseca pondera que o PSDB ainda tem muitas prefeituras no estado e que, formalmente apoiando Tarcísio, estaria participando do poder. Em um plano nacional, o partido míngua e perde protagonismo. 

“Busquei incessantemente por uma candidatura própria, e depois mesmo fora do nosso partido”, pontua Kassab. Quando questionado sobre a tentativa de candidatura, com o nome do atual presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD), o ex-prefeito paulista diz que não conquistou o apoio necessário para decolar e elogiou o desempenho de Pacheco à frente do Senado. “Vejo sua reeleição [ao Senado] como algo natural (...) e confio que será uma escolha pelo desenvolvimento do Brasil”, complementa. O nome de Rodrigo Pacheco é visto, segundo assessores do partido, como “pacificador” para o futuro. 

 

Segundo assessores da campanha de Tarcísio, o PSD já está empenhando esforços para a transição de governo no Estado de São Paulo. Em nível nacional, Kassab também já afirmou em entrevistas que a sigla vai apoiar o governo de Lula, mas quer realmente fazer parte com algumas condições. O pessedista quer indicar dois nomes para compor ministérios e quer se ‘sentir governando’.

 

“O ideal, para próximos pleitos, é uma pacificação. Acredito que com a vitória de Lula, teremos menos hostilidade”, diz Ricardo Patah, também presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Patah comenta sobre as costuras nacionais que o partido fez, com diferentes aspectos políticos e enfatiza que o partido é um dos “instrumentos fundamentais” para a pacificação política do Brasil. 

 

 

PSD como peça chave no futuro governo

 

Como bem coloca Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Inteligência Internacional da FGV, Kassab pode ser entendido como um “grande termômetro da política brasileira''. Sendo um entendedor dos ventos políticos, soube observar em quais lugares ainda há espaço para uma atuação mais assertiva, ao mesmo tempo que seus dirigentes foram liberados para apoiar tanto Lula, quanto Bolsonaro durante o segundo turno.

Com um saldo positivo na eleição de Tarcísio em São Paulo, agora, o presidente do PSD projeta nacionalmente um alinhamento mais direto com Lula.  “Kassab sabe que tem muito a pedir ao Lula, porque sabe que o PT precisa bastante do PSD”, comenta Paz. De acordo com o pesquisador, a sigla de centro será uma peça chave para o futuro governo. “A configuração do próximo congresso é difícil e vai demandar muita habilidade política para poder governar. Não vai dar para manter uma minoria”, completa.

Além de um projeto que possibilita manter Pacheco na presidência do Senado, a sigla procura por espaço para crescer. “É um momento propício para isso porque há uma mudança interessante no cenário da política nacional”, diz Leonardo.

O pesquisador da FGV explica que, enquanto os principais partidos brasileiros se desintegram - ainda que lentamente - os que não eram considerados protagonistas estão ficando maiores. O terreno é fértil para observar quais destes partidos, de um centrão que sempre foi composto por siglas médias, vão ganhar desenvoltura.

“O que está em jogo é saber quem vai compor melhor com o governo federal e quem vai ganhar mais plataforma”, comenta. Esta não é uma jogada exclusiva de Kassab. Valdemar da Costa Neto (PL), Ciro Nogueira (PP) e Luciano Bivar (União Brasil) fazem o mesmo com um possível aceno a Lula.

Neste momento, partidos que compõem o conhecido “centrão” são cada vez mais necessários para qualquer tipo de governabilidade. O PSD de Kassab está na dianteira, mas todos eles ganharam uma estatura diferente e começaram a atuar para além do antigo “blocão”. “Eles podem começar a brigar mais entre si, para ver quem vai pegar a maior fatia do poder”, finaliza.

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