No ano de 2021, tivemos o maior evento global do esporte de salão, a Copa do Mundo de Futsal, na Tailândia. Infelizmente o Brasil não conseguiu conquistar a taça, quebrando as expectativas de milhares de torcedores que confiavam na seleção canarinho. Mas qual seria o motivo da decepcionante campanha? O elenco brasileiro tem algumas das maiores estrelas do futsal mundial, no entanto, não levou em conta o desenvolvimento precoce das demais seleções que surpreenderam pela quantidade de jogadores brasileiros naturalizados.
A exemplo disso temos o Cazaquistão, que fez sua melhor campanha no mundial, ficando em quarto lugar na competição. A seleção da Ásia Central contou em seu elenco com peças importantíssimas, dentre elas, os brasileiros naturalizados Léo Higuita, Taynan e Douglas Júnior.
O Cazaquistão mostrou como a contribuição dos brasileiros pode impactar positivamente o desenvolvimento das demais escolas de futsal ao redor do mundo. Porém, o fenômeno da naturalização envolve questões identitárias, políticas e pessoais. Em um passado não tão distante, ver um jogador naturalizado em campo gerava estranheza para muitos, como é o caso de Arthur Oliveira, filho do lendário treinador, PC de Oliveira, campeão mundial em 2008 pela seleção brasileira.
O paulista chegou a ter passagens pelo Brasil nas categorias de base no início da década passada, mas sem continuidade. Entretanto, ao se transferir para o país Japão, houve um interesse imediato pela confederação do país em naturalizar o atleta para o time nacional.
Hoje, a quantidade de atletas que defendem a camisa de pátrias onde não foram nascidos aumenta exponencialmente. Além do Cazaquistão e do Japão, a Espanha também se desenvolveu muito dentro das quatro linhas depois da chegada de brasileiros ao elenco, além de jogadores em si, os espanhóis também absorveram muitos conceitos da escola brasileira de futsal; resultado? Em poucos anos a seleção Ibérica se tornou campeã europeia em 2016, além de um vice campeonato mundial em 2012 e vem fazendo campanhas cada vez mais constantes ao longo dos anos.
André Varela Lopes, também conhecido como “Pelezinho” ou “Pelé”, é jogador de futsal e atua no A.D.R Retaxo de Portugal, com passagens em diversos clubes nacionais e estrangeiros. Inserido neste meio desde 2003, quando se profissionalizou na equipe do São Paulo/Barueri e por lá consolidou sua carreira até 2012, ano decisivo em sua carreira para que clubes do exterior pudessem acolhê-lo. Japão, Kuwait, Espanha e Portugal foram alguns dos países que tiveram a honra de vê-lo atuar dentro das quadras.
A vivência de André “Pelezinho” no cenário mundial do futsal é riquíssima e esboça quanto os atletas brasileiros podem agregar para o fortalecimento da modalidade ao redor do globo. Em razão disso, conversamos com o atleta com o objetivo de buscar entender os motivos pelos quais tantos atletas brasileiros optam por conquistar espaço dentro do futsal em outras pátrias. Confira:
CP Digital: Na sua opinião, quais são os principais fatores que levam um atleta brasileiro a jogar fora do país? O que te motivou mais nessa escolha?
Acredito que a parte financeira e a expansão da carreira sejam os dois diferenciais. Qualidade de vida não entra muito em questão. O atleta apenas quer saber se estará bem instalado, em condições básicas de treino e se irá receber em dia. Até porque, a grande maioria pensa em retornar para o Brasil e não pensa em ficar nesses países pela qualidade de vida/cultura. O que mais me motivou foi a oportunidade de jogar em outro país e também, pela questão financeira. Em 2006 tive uma experiência internacional, disputei um mundial universitário na Polônia, com um estágio em Portugal, isto de certa forma abriu meus horizontes como um primeiro contato com relação às culturas diferentes e outras experiências.
CP Digital: Sobre as suas passagens internacionais, houve algum país que teve a possibilidade de você se "naturalizar" e assim, defender a seleção local?
Em nenhum desses países tive essa oportunidade, mas provavelmente eu aceitaria. Joguei 2 anos no Japão. Lá o processo de naturalização é bem complexo.
CP Digital: Como você enxerga esse fenômeno de naturalização de jogadores estrangeiros em seleções principais? Sabemos que a procura por brasileiros é grande, na sua visão, isso é consequência da alta concorrência presente no cenário brasileiro?
De fato, há muitas jóias brasileiras em outras seleções. Isso acontece pois é um tanto quanto difícil chegar à Seleção Brasileira. Esses países oferecem essas oportunidades (naturalização) e acaba que tais atletas são pagos pra isso podendo assim, disputar uma copa do mundo, que é o sonho de qualquer atleta.
CP Digital: Você concorda que há uma valorização pelo futsal praticado no Brasil? Esse processo que mistura diferentes escolas de futsal e etnias é algo enriquecedor?
Com relação à valorização, o Brasil se perdeu por um período com problemas políticos na CBFS (Confederação Brasileira de Futsal) e isso enfraquece a modalidade. Em muitos países, tudo é muito novo ainda e estão sempre à procura de evoluir, algo que em nosso país já não acontece muito. O futsal mudou e é preciso estar atento a isso. Nível técnico, organização e estrutura são fatores que variam muito de país pra país. Cada um com sua realidade, mas vejo uma globalização que tem facilitado o crescimento da modalidade em todo canto do mundo. A internet é uma ferramenta absurda pra isso e cada vez mais tem contribuído para o desenvolvimento dos profissionais envolvidos.
Dessa forma, é possível entender que o processo de crescimento do Futsal ocorre por diversos fatores, sendo cada um por uma especificação diferente. Essa exportação de matéria-prima brasileira se torna recorrente e de certa forma normalizada no esporte. Portanto, a ida a Espanha no passado, a presença atualmente fixa no Cazaquistão e no Japão, sem contar o futuro nos Estados Unidos que busca sediar o mundial em 2024 e Japão que se demonstrou uma pedra no sapato dos brasileiros no último torneio com a presença de atletas do nosso país, traz essa expansiva globalização no futebol de salão.