Inteligência Artificial já impacta o mercado da moda

Designers apostam em ferramentas que utilizam a IA para a criação de peças e contribuição nos processos criativos
por
Ana Beatriz Villela, Kiara Elias e Luciana Zerati
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25/07/2023

A inteligência artificial está transformando setores artísticos, e a indústria fashion não é exceção. Algoritmos inteligentes podem examinar tendências históricas, dados de consumo e informações culturais, fornecendo insights valiosos sobre preferências de estilo, cores populares, e combinações de tecidos.

Mas apesar de ser uma aliada no processo de criação, a Inteligência Artificial também é motivo de preocupação de designers e estilistas no mundo da moda, que discutem até que ponto a tecnologia agrega ao invés de substituir essas profissões.

"Eu acredito que a incorporação da inteligência artificial na moda tem o potencial de impulsionar avanços significativos em termos de sustentabilidade e eficiência”, destaca Luiza Brasil, jornalista e colunista da Revista Glamour.

“Além disso, a análise de dados fornecida pela IA nos permite compreender melhor as preferências dos consumidores, identificar tendências emergentes e criar produtos mais alinhados com as demandas do mercado”.

Marcas estão adotando ferramentas como Midjourney, Dall-e e Stable Diffusion, que oferecem recursos avançados de geração de conteúdo programado por meio de algoritmos, a partir de comandos em texto. Esses programas permitem a criação de imagens, peças de vestuário e cenários completamente personalizados, fomentando a inovação e a eficiência no processo criativo.

Guilherme Duque, designer de moda por formação, e atualmente produtor de conteúdo e diretor criativo da Metaland, um studio de criação e agenciamento de avatares virtuais, afirma que a popularização da Inteligência Artificial afeta no processo criativo: “A IA pode contribuir muito nos processos, oferecendo pontos de vista diferentes daquilo que inicialmente o designer tinha em mente e até contribuindo no quesito experimentação e inovação”, conta. Além disso, em sua avaliação, embora a criatividade seja uma habilidade humana única, a IA tem sido usada como uma ferramenta auxiliar para impulsionar e inspirar o processo criativo na indústria da moda.

A pandemia de Covid-19 impulsionou o rápido avanço da digitalização nos procedimentos de desenvolvimento e produção, recorrendo a técnicas como modelagem e pilotagem em três dimensões (3D). Essa aceleração se deu como resposta às restrições impostas, permitindo a continuidade das atividades durante as quarentenas que afetaram quase toda a população mundial, ao mesmo tempo em que contribuiu para a redução do desperdício.

Com a utilização de algoritmos inteligentes, marcas e designers estão testando o potencial de sucesso das peças e coleções antes mesmo de produzi-las em larga escala. Essa abordagem visa minimizar as chances de produtos encalhados nas prateleiras de descontos ou, ainda pior, serem destinados ao incinerador.

A inteligência artificial tem sido uma aliada nesse processo, permitindo a criação de modelos mais eco-friendly, pois todos os testes e moldes podem ser feitos sem a utilização de tecidos, sendo assim, não geram resíduos.

Duque diz que já desenvolveu uma coleção mais sustentável usando Inteligência Artificial: “Eu mesmo já criei uma mini coleção de upcycled jeans usando inteligência artificial. Neste caso, se a coleção fosse produzida, ela seria sustentável, já que havia essa intenção e direcionamento iniciais”.

Em março deste ano, a Vogue Brasil desenvolveu 6 capas digitais utilizando inteligência artificial, cada capa feita por um artista diferente. Todas tinham como objetivo discutir a criatividade e o uso da ferramenta no mundo da moda.

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Capas digitais feitas com IA. Foto: Vogue Brasil

“É fascinante como a IA nos permite expressar de forma mais concreta o anseio de criar cenários, acontecimentos, e narrativas. É uma prática que está intimamente ligada à nossa curiosidade e que intensifica minha determinação em sair ao campo, encontrar novas pessoas e explorar realidades inexploradas”, explica o fotógrafo e responsável por uma das criações, Hick Duarte, em entrevista à Vogue Digital.

No entanto, a divulgação dessas imagens deve ser feita com cautela devido ao realismo das mesmas. Recentemente tivemos o exemplo da foto do Papa Francisco usando uma jaqueta puffer branca circulando em todas as redes sociais. A imagem foi interpretada como real e só no final do dia o autor dela se manifestou, revelando que tinha gerado a foto junto com uma ferramenta de inteligência artificial. A própria Vogue noticiou a imagem como verdadeira.

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Reprodução: Twitter

Embora o uso da inteligência artificial (IA) na moda tenha vantagens significativas, também existem preocupações e desafios a considerar. Uma das críticas é a falta de diversidade da ferramenta, uma vez que, se você não especificar o tipo de modelo que deseja, ela te entrega uma modelo branca, magra, sem rugas e sem poros aparentes. Isso vai contra o movimento de garantir a liberdade dos corpos e a naturalização das "imperfeições".

Luiza Bomeny, embaixadora do Istituto Marangoni Brasil, um dos maiores cursos de moda do mundo, afirma ao Contraponto Digital que o uso de “modelos” gerados por IA em campanhas tem um custo mínimo para as marcas pois não é necessário contratar maquiadores nem fotógrafos, além de não terem cachê. “Antes da gente falar da inteligência artificial tirando os empregos de pessoas reais, eu acho que a gente está voltando 3 casas nas pautas dos corpos reais”, comenta.

Outra reflexão é sobre a possível substituição dos designers profissionais. Segundo Maria Antonia Romão, professora da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e designer de moda, a IA pode ser útil para gerar ideias e inspirações, mas não substitui por completo o profissional. “O designer de moda traz habilidades técnicas e sensibilidade artística e humana que serão muito difíceis de ser replicadas por uma inteligência artificial”, diz. Romão ainda diz que a função do designer vai muito além de desenvolver peças, envolve selecionar materiais e cores, criar padrões, e se adaptar às exigências do cliente.

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Ciências e Tecnologia

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