Futebol feminino de base é feito de projetos e sonhos

Treinadores e jogadoras do Centro Olímpico contam a atual situação do futebol juvenil de mulheres
por
Giovanna Rahhal e Maria Luiza Costa
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13/11/2023

Por Giovanna Rahhal (texto) e Maria Luiza Costa (audiovisual)

 

Pietra Emídio acorda todos os dias às 6 horas da manhã para ir à escola. É necessário almoçar lá perto para não perder seus horários. Em seguida, a jovem de 15 anos parte para o Centro Olímpico (CO), onde trabalha para seguir seu sonho: “Quero ser jogadora profissional, me inspiro muito na Marta, Tamires e na Formiga, que já foi uma grande jogadora”.

Assim como ela, outras milhares de jovens já passaram pelo projeto chefiado pela Secretaria Municipal de Esportes e Lazer da Prefeitura de São Paulo desde 2008. Destas, mais de 70 já foram convocadas para a Seleção Brasileira. Atualmente, o local realiza três peneiras anuais para permitir a entrada de novas atletas que podem ter entre 7 e 17 anos.

Para formar suas equipes, o Centro Olímpico recebe meninas de todos os tipos de cenário. Pietra iniciou sua trajetória esportiva na ginástica artística, mas mudou para o futebol assim que sua escola introduziu a modalidade na educação física. Depois, ela participou de uma escolinha antes de passar pela peneira do projeto.

Já Caroline Souza, 14 anos, chegou ao mesmo local que a colega de outra maneira. Tendo feito uma peneira ainda mais nova, ela não conseguiu ingressar no projeto e passou a atuar em outro time de São Paulo, o Tiger. Foi então que seu antigo treinador conversou com membros do CO para conseguir uma avaliação individual para a menina, que enfim passou. “Uma das minhas maiores realizações é participar de campeonatos que eu nunca tinha participado, é muito legal”, comentou.

Projeto de base

Proibido durante mais de 40 anos, o futebol feminino no Brasil apenas recentemente começou a dar seus primeiros passos rumo à evolução. Isso porque os grandes clubes ainda não oferecem uma oportunidade para as atletas mais jovens, com categorias de base apenas para o sub-15 e sub-17. Enquanto isso, o Centro Olímpico dá às meninas a chance de iniciarem cedo na modalidade. O treinador Denis Sanches, da equipe sub-15, afirma que as meninas entram no sub-11, onde passam seis anos e que, em seguida, elas saem com 16 anos e vão para um clube grande já com 6 anos de formação. Esse tempo faz que as atletas cheguem a times com um estágio de formação mais aprimorado. No entanto, isso também pode um problema.

 

Time sub-12 realiza um coletivo durante o treino

Sanches alerta que a chegada dos clubes grandes para captar jovens atletas pode afetar o futuro das meninas na modalidade, dado que a pressão de atuar por um time maior, com mais responsabilidades, faz uma grande diferença na formação. Isso ocorre, principalmente, nas jogadoras que se destacam nas categorias sub-15 e sub-17, afetando o período de estabilidade anteriormente conquistado para as jovens.

Grandes eventos

Diferente do futebol masculino, que tem procura por categorias de base desde sempre, o feminino recebe mais candidatas depois de grandes eventos, como Copa do Mundo e Olimpíadas. Nestes casos, as famílias das jovens procuram projetos visando inserir as meninas no esporte desde cedo. A questão foi levantada por Sanches, que contou que o Centro Olímpico recebe centenas de DMs (mensagens direcionadas) no Instagram, principal canal de contato do projeto.

Time sub-15 realiza aquecimento no campo de society



Entretanto, não é qualquer menina que consegue ingressar no projeto, dado que a procura dos técnicos é por jogadoras que apresentem um maior rendimento logo de cara. As últimas peneiras, realizadas no fim de 2022 e início de 2023, trouxeram 600 e 150 meninas, respectivamente, para a análise dos profissionais.

Apesar de não limitarem o número de aprovações dependendo do contexto, normalmente poucas jovens têm a oportunidade de ingressar ao time já existente. No caso dos plantéis maiores, que já possuem 30 atletas, nenhuma ou apenas uma menina muito acima da média terá a chance de integrar a equipe.

Dificuldades e futuro 

Ainda que hoje as meninas tenham a oportunidade de ingressar em uma categoria de base muito novas e se desenvolverem para alcançar a meta de ser uma jogadora profissional, são poucas as que realmente atingirão o sonho. Atualmente preparadora física do Centro Olímpico, Viviana Martina já esteve onde as jovens da equipe sub-15 estão atualmente:

Mesmo vendo melhorias no futuro da nova geração, Martina aponta que as dificuldades em se dividir entre carreira e estudos seguem muito similares à sua época. Isso porque são poucas as meninas que se tornarão jogadoras de altíssimo nível e terão salários volumosos, podendo deixar de lado uma faculdade e focar apenas na carreira que dará uma estabilidade financeira duradoura.

No entanto, a preparadora física ressalta que atualmente os clubes possuem mais abertura em relação a atletas que dividem o tempo com uma faculdade. Com o surgimento de universidades que oferecem a modalidade de estudo à distância, as jovens podem ter os dois rumos ao mesmo tempo e, dessa forma, garantir um plano pós-carreira sem grandes prejuízos.

Nos casos de Pietra e Caroline, ambas se dividem entre a escola e o time, com foco maior na carreira esportiva. Após o treino, a primeira ainda se dedica ao curso de inglês, dado que sua família entende ser possível equilibrar as duas funções. Já a segunda, realizou um combinado com a mãe para poder se doar mais ao futebol: ela deve prestar muita atenção nas aulas e em troca não precisa estudar tanto em casa, conseguindo encaixar os estudos e os jogos do CO sem grandes problemas. 

Diferente de Viviana Martino, que dividia seu tempo entre carreira e faculdade, as jovens da equipe sub-15 ainda não pensam em uma graduação, focando apenas em garantir um futuro no futebol enquanto manejam as responsabilidades escolares. Com a trajetória ainda no início, a dupla praticamente não pensa no plano pós-carreira, apenas nos sonhos e nos projetos dentro do futebol.

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