A falta de representatividade feminina no automobilismo 

Apesar de ser considerado um esporte em sua maioria masculino, as mulheres estão buscando ocupar novos espaços  
por
Livia Veiga Andrade
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14/04/2023

A Fórmula 1 estreou em 1950 sob a Federação Internacional de Automobilismo, mais conhecida apenas como FIA, a Fórmula 1 vem conquistando seu espaço entre os fãs de carros desde então. Modalidade mais avançada do automobilismo, atualmente conta com dez equipes e 20 pilotos do sexo masculino.  

O cenário dominado, em sua maioria, por homens não é novidade quando se aborda o assunto esportes. Mas, o que chama a atenção é que, mesmo com todas as ações para inserir cada vez mais mulheres nas categorias, a Fórmula 1 parece não estar sendo afetada. 

Ao longo dos 73 anos de competição, apenas cinco mulheres conquistaram a chance de se tornarem pilotos representando uma das grandes empresas inscritas nos Grandes Prêmios. A falta de representatividade no esporte torna-se notória ao ponto que não existe um termo feminino para se referir às atletas dentro do cockpit. 

Maria Teresa de Filippis, por exemplo, se tornou a primeira piloto italiana do sexo feminino a chegar a categoria mais alta do automobilismo em 1958. Apesar de ter sido uma das representantes da Maserati na Fórmula 1, ela começou sua carreira de maneira tardia. Aos 20 anos de idade foi desafiada por seus irmãos a dirigir um carro veloz e surpreendeu a todos com suas habilidades.  

Filippis competiu sua primeira prova no circuito de Salerno-Cava dei Tirreni e venceu com um carro que havia sido um presente de seu próprio pai. Anos depois, ela conseguiu assinar um contrato com a equipe italiana gerenciada pela Maserati e venceu inúmeros desafios nas categorias de base, mas nunca recebeu a oportunidade de mostrar seu talento nas pistas defendendo a equipe de Fórmula 1.  

O ano de 1958 foi o ponto de virada para ela. A Maserati retirou sua equipe da categoria mais alta do automobilismo, mas Maria decidiu se manter no grid de forma particular, com um carro deixado pela fabricante.  

Naquele mesmo ano, ela não teve nenhuma vitória ou conquista expressiva, mas estava se tornando um símbolo para as outras mulheres que tinham o sonho de seguir a mesma carreira.  

Ao longo dos anos, apenas cinco mulheres ganharam, ao menos, uma oportunidade de guiar um carro competitivo de Fórmula 1. Porém, nenhuma delas conseguiu chegar ao pódio ou ter uma temporada completa nas equipes.  

Mas, para chegar à categoria mais alta do automobilismo é necessário passar pelas etapas de base, como por exemplo a Fórmula 4, 3 e 2, Fórmula Regional, entre outras, que atualmente também não apresentam muitas pilotos femininas.  

Em 2023, o grid final da Fórmula 1 não conta com o nome de nenhuma mulher como piloto principal entre os 20 homens selecionados, mas, ao analisar as bases, encontramos algumas representantes que acendem uma pequena faísca de esperança.  

Na Fórmula 3, atualmente está inscrita a piloto Sophia Flörsch. Ela é nascida na Alemanha e tem apenas 20 anos de idade. Correndo pela PHM Racing, antiga Charouz, é a segunda temporada da atleta no automobilismo.  

Na Fórmula 2 de 2022, que seguiu o mesmo calendário da F1, com 14 etapas duplas, 11 equipes e 22 pilotos, apenas uma mulher ocupou o cockpit da Charouz Racing. Ela voltou para a equipe após a saída de Cem Bölükbaşı e competiu ao lado do brasileiro, Enzo Fittipaldi.  

Em conversa com a TV Globo, a atleta revelou que estava muito feliz em receber a oportunidade de voltar à competição e agradeceu a segunda chance que recebeu e segue sendo a única mulher a chegar tão próxima à Fórmula 1.  

Mas, para além da posição dentro do cockpit, também é preciso pensar nos outros cargos de extrema importância que constituem toda uma equipe automobilística. Formada por engenheiros, treinadores físicos, preparadores, estrategistas, equipe de marketing e muitos outros, o elenco ainda é, majoritariamente, masculino.  

Rachel Loh, formada em engenharia mecânica, é atualmente Engenheira de Competição da equipe Ipiranga Racing que compete na Stock Car, a maior prova de automobilismo brasileiro. Ela também foi a primeira mulher, piloto e capitã, em uma equipe de estudantes no Brasil, a Minibaja, onde os próprios alunos desenvolvem, montam e dirigem pequenos carros competitivos.  

Orgulhosa de seu feito, Rachel conta que foi neste momento que ela se apaixonou e decidiu que continuaria carreira no automobilismo, mesmo com todas as dificuldades que enfrentaria.  

Mas, apesar de já ter alcançado altos cargos ao longo de sua extensa carreira, a engenheira revela que enfrentou momentos bastante complicados quando ainda estava na faculdade e até mesmo nas pistas.  

“A minha jornada, desde ter entrado na engenharia mecânica, onde já era um ambiente extremamente masculino e machista, até hoje as mulheres sofrem preconceitos dentro da escola de engenharia, principalmente do corpo docente. Muitos professores não medem nem as palavras para deixar claro que não apoiam a sua presença ali”, conta Loh. 

Mesmo com os problemas, Rachel usou essas palavras de zombaria e desclassificação como uma espécie de combustível para conseguir manter as forças e seguir em frente.  

A profissional também disse que também já foi questionada inúmeras vezes pelos próprios fãs de automobilismo quando a encontram nos autódromos. Por ser a única mulher engenheira presente por lá, os espectadores costumam confundi-la com membros da equipe de marketing ou da comissão de organização do evento.  

“Como eu era a única mulher dentro de uma equipe, em um cargo técnico, as pessoas sempre me confundiam com promotora, com pessoas do marketing... Então se eu posso dizer que vivenciei situações machistas dentro do automobilismo, foi praticamente com o público, com os fãs”, revela a engenheira.  

No ano de 2022, a FIA lançou, em parceria com muitas mulheres, o projeto Girls On Track. Visando ampliar os horizontes e criar mais oportunidades, a comissão está buscando colocar jovens em um contato mais íntimo com o esporte, para que assim, elas entendam e conheçam novas opções de carreiras.  

“Se é o seu sonho, se é o que você quer de verdade, corre atrás. Nada é impossível. Quando a gente quer uma coisa de verdade, a gente arruma os meios. E nunca deixar ninguém dizer para você onde é o seu lugar e do que você é capaz”, diz Rachel, que está empenhada em implementar mais projetos femininos no Brasil.  

Neste ano, Loh foi uma das responsáveis por levar 100 meninas para visitar os bastidores da Fórmula E, uma categoria de carros elétricos que teve a sua estreia em São Paulo no final de março. O projeto é uma das vertentes do Girls On Track no Brasil e que deve se estender para a Fórmula 1 que já está marcada para o Autódromo de Interlagos no dia 5 de novembro.

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