Por Marina Jonas
A escola não é um ambiente super transformador. Ela cumpre um papel que foi estabelecido há muito tempo e que já não se pensa mais sobre, apenas se reproduz. O celular, por sua vez, o digital, é muito mais legal, divertido, interessante. E, assim, a escola acaba virando um tédio puro, porque de fato é um tédio puro. É o que conta Alice, professora da oitava e nona série do fundamental II. Segundo diz, quando se tem o entretenimento da tecnologia na palma da mão, a escola passa, ainda mais, a ser um lugar para ir só por obrigação. Ela já não é mais um ambiente de transformação, substituído pelo celular como ambiente de inovação, com um mundo cheio de possibilidades. Chegou no limite o modelo de escola tradicional que se conhece. Não tem como exigir que o professor faça uma aula de fato atrativa aos alunos quando eles têm uma distração e uma alternativa tão chamativa quanto o celular. Agora o que é pedido para os professores são metodologias ativas, aulas divertidas, gamificação, estudos de projetos, outras formas de dar aula - mas que, ainda assim, não resolvem o problema de falta de vontade deles de aprender.
A educação é muito complexa; para se transformar mesmo, tem que se estar na estrutura, explica Alice. Então, essa mudança tem que vir da Secretária de Educação do Estado, que envia à ela e seus colegas professor um plano de aulas que devem seguir. Agora é cobrado das escolas e deles que entreguem resultados através da tecnologia, pela qual o aluno estuda pela plataforma digital de educação, o CMSP (Centro de Mídias de São Paulo), pela qual ele também faz provas, redações e exercícios em sala de aula, como os de alternativas. O que conta é que sejam feitos, acertar ou errar não faz diferença, diz a professora. Quando os alunos fazem ou deixam de fazer essas tarefas ou até mesmo quando vão à aula ou deixam de ir, eles estão gerando dados à escola, a qual está dentro do ranking de instituições de ensino do governo.
Além disso, a infraestrutura da escola onde trabalha, localizada em Perdizes, está completamente detonada, conta. Não há sala de nada. Quando se entra na escola, topa-se de frente com pedreiros tapando buracos nas paredes do local. Os estudantes veem que a escola está precarizada e o celular na mão dos alunos os ajuda a dar a impressão de que têm um mundo legal ao seu alcance, e com certeza esse mundo é mais legal do que aquele que está à volta desses jovens. Muitos deles utilizam também fones de ouvido durante as aulas, o que a professora não vê como um problema, mas que feito durante todo o período de estudo parece um pouco demais.
Há uma liberdade que os alunos sentem ao usar o celular, afinal falta alternativa da própria cidade onde vivem para estarem e conviverem nas horas vagas, como lugares públicos relaxar e encontrar pessoas, além de áreas verdes de convívio e ao ar livre. Alice tenta se colocar no lugar deles e, de fato, a tecnologia parece uma boa alternativa à situação dentro da qual se inserem. É um cenário que chama a atenção da professora e que, de acordo com ela, pede que algo seja feito pela própria área da educação, pelo Poder Público e também pela sociedade; não adianta apenas a escola olhar para esses adolescentes, todos têm que olhar para que aconteça uma mudança.
E, o não uso: é possível?
O uso do celular durante as aulas é um hábito muito frequente e que está sendo praticado em excesso pelos alunos, no entanto. Alice conta que já tentou tirar o celular inúmeras vezes dos jovens que leciona, mas já recebeu atitudes violentas, por exemplo xingamentos, como resposta. É como se o espaço “íntimo” deles estivesse sendo invadido quando tenta tirar o celular de suas mãos, e o medo de limitar esse uso é real, conta a professora.
O vício do celular juntado à fase da adolescência pelas quais seus alunos passam torna muito difícil a retirada do uso desse dispositivo de forma tão natural e fácil; assim como os adultos, eles também utilizam o celular a todo momento e em todo lugar, e isso ainda é socialmente aceito, por mais que existam inúmeros estudos mostrando os malefícios desse uso exacerbado por ambas as categorias de idade.
Não é sobre tirar os jovens do celular e colocá-los nas carteiras das salas de aula tradicionais, ainda mais se for com dispositivos eletrônicos para aprender. Para que aconteça de fato uma melhora no desempenho e no interesse dos alunos pelas aulas, tem que haver uma desconstrução se a sociedade realmente quiser que as crianças voltem a aprender nas escolas. As consequências da tecnologia vão muito além do uso em si; os jovens perderam além da capacidade de se concentrar cem por cento em uma coisa só, eles perderam o interesse pelas matérias e formas de aprendizado mais quadradas da escola. Quanto mais dinâmicas se faz fora da sala de aula, mais os alunos se interessam pelo seu conteúdo. Tem que haver uma reinvenção dos métodos de ensino e aprendizagem.