Cinema independente vai além da produção

Ibirá Machado conta sobre a distribuição de filmes alternativos.
por
Julia Quartim Barbosa
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21/05/2025

Por Julia Quartim Barbosa

 

Ibirá Machado abre as portas da Descoloniza Filmes, sua distribuidora de filmes independentes, em 2017, surfando no auge do fundo setorial do Audiovisual (FSA), agora, com os editais permanentemente abertos. Em 2006, durante o primeiro governo Lula, era criado o fundo setorial, uma categoria de programação específica dentro do Fundo Nacional de Cultura. O projeto, que visava desenvolver a indústria, o mercado empresarial nacional e aumentar a participação do audiovisual brasileiro dentro e fora do país, lançou, em 2016 uma chamada de fluxo contínuo de R$28 milhões para renovar núcleos criativos. No mesmo ano, destinou R$139,5 milhões de recursos financeiros a projetos selecionados e contratou 95,5% dos valores correspondentes aos projetos.

Enquanto ainda trabalhava como geógrafo, profissão de formação de Ibirá, passou por uma fase de estudos sobre o cinema indiano, o que mais tarde originou um cineclube. Dentro dessa pesquisa no cinema não ocidental, conheceu Beatriz Seigner, diretora do filme “Bollywood Dream”, que o convidou para fazer a produção de lançamento do filme, que ainda participava somente de festivais. Essa seria sua primeira experiência com a distribuição de produtos audiovisuais, caminho que o levou a Vitrine Filmes, onde aprendeu efetivamente sobre o ofício, antes de abrir sua própria empresa.

Ibirá dedica seu olhar para cinematografias que buscam desconstruir um modelo europeu ou estadunidense e procura entender formatos de se contar histórias mais autênticas e relevantes para a realidade brasileira. Durante a entrevista online, Ibirá estava em Juazeiro do Norte, no sul do Ceará, em um encontro de mercado, evento organizado para trazer à luz projetos da região.

De acordo com dados do Painel Indicadores do Mercado de Exibição da Agência Nacional do Cinema (Ancine), até dezembro de 2023, chegaram às telonas 281 produções brasileiras. Porém, o setor muitas vezes discute demasiadamente a produção e acaba deixando de lado o diálogo e o investimento para a distribuição. O grande desequilíbrio na cadeia de recursos do audiovisual nacional cria problemas para a distribuição dos mais de 200 filmes lançados por ano nos cinemas.

A título de comparação, nos Estados Unidos existe uma lógica para as produções em que a quantidade de valor investido para a produção de um filme é igual ao valor investido na distribuição dele, ou seja, se um filme custa 50 milhões para ser produzido, ele será distribuído com os mesmos 50 milhões. Mesmo não sendo uma regra fixa, se trata de uma regra de mercado que ocasiona sucesso suficiente para não só recuperar os gastos, mas lucrar e conseguir visibilidade em disputas por prêmios.

No Brasil, mesmo em produções com recursos suficientes para serem bons filmes, Ibirá nota uma falta de desenvolvimento, maturidade e estruturação, vinculada a uma falta de conhecimento de mercado e da audiência. É preciso saber gerir recursos públicos, conhecer os espaços de circulação e sobre produção executiva, coisas que faltam nas formações acadêmicas.

A grande dificuldade que o setor de distribuição dessas mais de 200 obras anuais enfrenta é conseguir furar essa pequena bolha de pessoas que acompanham a cena nacional do audiovisual e fazer com que a grande população brasileira tenha acesso a esses filmes. Ao não saberem que existem, as pessoas não irão assistir, e os exibidores, por receio, preferem não programar filmes independentes e alternativos em seus cinemas. Como consequência, distribuidores se tornam reféns de cinemas pouco conhecidos, com salas que já estão um pouco acostumadas a receber filmes desse tipo.

Ibirá conta que filmes muito experimentais costumam ter cem pessoas de público e atribui isso ao fato de não termos uma sociedade preparada para entrar em contato com esse tipo de produção. “A gente não tem uma indústria enquanto não tiver um público que consuma”, insiste o distribuidor.

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