Diante do pleito para eleger o próximo governador do Estado de São Paulo, a questão da “cracolândia” mobiliza a atenção dos candidatos ao Palácio dos Bandeirantes. Segundo levantamento do Contraponto, dos 10 candidatos ao governo do Estado de São Paulo, 7 apresentam propostas na área de segurança pública. Os outros 3 candidatos, apostam em políticas sociais e na reformulação nas políticas de drogas.
"Estamos assistindo a uma mudança que seja mais permanente, espalhamento para outras regiões desses grupos de usuários causando novas formas de conflitos sociais, de transtornos para as pessoas e mais violência contra eles”, relata Maurício Fiore, pesquisador do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) e membro fundador da Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD), sobre o que conhecemos como "Cracolândia".
Em época de eleições, um dos principais temas abordados pelos candidatos a governador do estado de São Paulo é este conflito da região, já que o governo atual tem sido alvo de polêmicas por suas ações nesta questão.
Nos últimos meses, o atual governo do estado aponta que deixou como uma das grandes prioridades a "solução para a Cracolândia". A região é conhecida por abrigar grande parte da população de rua da capital, principalmente de dependentes químicos. Hoje, é alvo de operações policiais atuando, muitas vezes, com repressão para dispersar os usuários - o que ocasiona um fluxo migratório destes. Ressalta-se que denúncias de defensorias públicas são recorrentes.
De acordo com Fernanda Balera, Defensora Pública que atua no Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos na Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPESP), as operações policiais “utilizam o pretexto da Guerra às Drogas para praticar inúmeras violações de direito que vão desde invasões de domicílios sem mandado judicial, revistas abusivas e generalizadas até a proibição de utilização de barracas por pessoas em situação de rua sob a justificativa de que elas são locais de armazenamento de drogas”.
Em nota exclusiva ao Contraponto, a prefeitura diz que foram encontrados bons resultados do plano movido pelo governador. Seriam eles: o encaminhamento de usuários para atendimento no Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (SIAT II) aumentou aproximadamente cinco vezes entre janeiro e julho; o número de pessoas atendidas no CAPS IV (Centro de Atenção Psicossocial), localizado na Praça Princesa Isabel, aumentou 29,4% de janeiro a julho. Foram 453 pacientes em janeiro e 586 pacientes em julho.
Além disso, acentua que "o trabalho de abordagem social realizado na região da Praça Princesa Isabel e arredores é mantido com a busca ativa para a identificação e a oferta de acolhimento a pessoas em situação de rua".
Entre especialistas e funcionários públicos que atuam na chamada “cracolândia”, as políticas públicas adotadas pelo Estado são improdutivas. A “Guerra às drogas”, por meio da “legislação proibicionista não foi efetiva para controlar o uso de drogas consideradas ilícitas”, segundo a Balera.
Fiore também avalia no mesmo sentido a ineficiência dessa lógica, há uma “marginalização do usuário”. Segundo Fiore, aplicar alguma política pública na região da “cracolândia” se insere em uma perspectiva muito complexa. “Uma região [“cracolândia”] que já era bastante degradada e associada a outras ilicitudes”.
A percepção da adoção de medidas extremas e rápidas, como a mais recente “Operação Sufoco'', feita pelo atual Governo de São Paulo, prejudica todas as frentes de apoio aos frequentadores da região, levando insegurança e vulnerabilidade aos usuários, moradores e pessoas que trabalham na “cracolândia”.
Fiore acredita que para além do combate ao tráfico de drogas por meio das operações policiais ou até mesmo a internação compulsória – ele mesmo contrário à ideia – a questão urbana é essencial para entender os rumos da “cracolândia”.
Para a defensora pública, as operações policiais não resultam positivamente no cenário da “cracolândia”. “A operação sufoco se insere nesse contexto e parte da falsa ideia de que, ao provocar “dor e sofrimento” as pessoas irão procurar tratamento, o que nunca foi comprovado empiricamente”, diz Balera.
O Contraponto entrou em contato com a assessoria dos principais candidatos a governador de São Paulo para compreender a opinião e o planejamento de cada um sobre como está sendo feito e como será o seguimento do trabalho realizado na Cracolândia: são eles Fernando Haddad (PT), Tarcísio de Freitas (Republicanos), Rodrigo Garcia (PSDB), Carol Vigliar (UP), Elvis Cézar (PDT), Gabriel Colombo (PCB), Vinicius Poit (Novo), Altino Junior (PSTU), Antônio Jorge (DC) e Edson Torta (PCO). Com exceção de Gabriel Colombo, o CP não recebeu resposta dos outros candidatos.
O que propõem os candidatos a governador para a Cracolândia?
Rodrigo Garcia: Investimento na Operação Caronte
Rodrigo Garcia (PSDB), atual governador da cidade de São Paulo, diz que o problema da Cracolândia é de enorme responsabilidade social e política para o seu cargo. Garcia afirma que durante os últimos 90 dias, o seu governo e a Polícia Civil conduziram operações na área em busca de controlar a situação. A Operação Caronte, como foi nomeada pela polícia, age em áreas estratégicas pelo centro da cidade, mais de 110 traficantes já teriam sido presos. O político promete reforçar o sistema de saúde do estado e atuar junto com os municípios na prevenção e controle da região.
Fernando Haddad: Implementação de uma nova política de drogas
Fernando Haddad (PT) aparece em primeiro nas intenções de voto em pesquisas concluídas pelo Datafolha para o cargo de governador da cidade. O político defende a implementação de uma nova política de drogas junto com um investimento nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS). Haddad afirma que buscará criar um modelo parecido com o programa “De Braços Abertos”, colocado em prática quando o político exercia o cargo de prefeito da cidade.
Tarcísio de Freitas: Investimento no Programa Recomeço
Tarcísio de Freitas (Republicanos) fala sobre concluir uma forte ação para controlar a Cracolândia e evitar a possível degradação de outras áreas da região. Em seu plano de governo, Tarcísio estuda a possibilidade de ampliar o Programa Recomeço, ação que oferece tratamento aos dependentes químicos. Em suas redes sociais e em discursos de sua campanha, o candidato afirma que pretende levar o centro administrativo da cidade para a região da Cracolândia, com a intenção de aumentar a segurança do local e a circulação de pessoas.
Carol Vigliar: Desmilitarização da Polícia Civil e Militar
Carol Vigliar (UP) é a única mulher na disputa pelo comando do Palácio dos Bandeirantes. Professora de filosofia no ensino médio, Vigliar já atuou no MLB e, agora, entra na disputa, pela primeira vez em sua carreira política, ao governo da cidade. Em seu plano de governo, a candidata não entra em detalhes sobre os projetos para a região. Entretanto, uma de suas principais ideias para o governo é a desmilitarização da polícia, plano que impactaria diretamente a Cracolândia.
Gabriel Colombo: Projetos para o acolhimento e ressocialização
O quinto na pesquisa mais recente do Datafolha, Gabriel Colombo (PCB), candidato do Partido Comunista Brasileiro, enviou nota exclusiva ao Contraponto. O político aponta ações na região com menos força policial, promovendo uma revitalização no centro da cidade. Colombo promete um projeto amplo de desapropriações e reformas de imóveis para prover moradia. O candidato afirma que em seu governo, os pontos principais quanto o assunto é Cracolândia serão o respeito à saúde mental, o acolhimento e ressocialização dos dependentes químicos. Além de parcerias com organizações da sociedade civil que já trabalham na área e entendem o dia a dia da região.
Vinicius Poit: Novas criações de segurança pública
Vinicius Poit (Novo) considera que recorrer a políticas de segurança pública é uma das formas de solucionar os problemas da região da cracolândia. Em 22 de junho, em sua conta pessoal no TikTok, Poit diz que “a cracolândia está acabando com o centro! Os comerciantes não merecem pagar o pato!”. Concorrendo por um partido considerado de direita e liberal, o candidato sinaliza para comerciantes locais maneiras de melhorar a segurança da região, reativando o comércio e o turismo da região. “Está na hora da gente retomar, recuperar o centro e retomar os empregos da região que o potencial é enorme”, afirma o candidato.
Elvis Cezar: Projetos junto com a Polícia Civil e Militar
Para Elvis Cesar (PDT), o Estado tem muita responsabilidade quanto à situação da Cracolândia. Durante o primeiro debate entre os candidatos ao governo de São Paulo, realizado pela Band, Cesar, que foi prefeito de Santana do Parnaíba por duas gestões, lembrou de seus feitos direcionados à população em situação de rua. O candidato apontou ser necessário a atuação da segurança pública por meio de um “acompanhamento contínuo”, entre a polícia civil e militar.
Altino Júnior: Defesa da legalização das drogas
O candidato Altino Júnior (PSTU), considera irresponsável a escolha de usar a repressão da polícia militar nesta situação. Para ele, que ressalta a defesa da legalização das drogas, o ideal seria uma reforma urbana, a qual deve unificar áreas de assistência social e entidades (ONGs) que atuam com a população de rua.
Antônio Jorge: Intervenção e desocupação total da área
Desde 2017, quando atuava como deputado, Antônio Jorge (DC) defendia a intervenção e desocupação na Cracolândia. Neste ano, em entrevista ao SBT News, já como candidato, afirmou que sua candidatura e partido tem como norte "defender a família" e "ser conservador". Quanto questionado sobre a questão da população da cracolândia, exaltou: "Não pode ficar mais [a Cracolândia], é um absurdo!"
Edson Dorta: Dissolução da Polícia Militar
Já Edson Dorta (PCO) defende a dissolução da Polícia Militar e de todo aparato repressivo, seja envolvendo a Cracolândia ou não. Em seu plano de governo, ele ressalta a proibição de despejos e desocupações e a necessidade de um plano nacional de construção de milhões de moradias populares, para garantir habitação para a população.