Mulheres no controle

Quando criança, Vera não imaginava trabalhar com jogos, afinal, cresceu numa cidade do Interior, onde jogos não eram um assunto comum, principalmente na roda de conversas entre garotas. Erin Calmon diz que não lembra ao certo a sequência, mas utilizou o RPG Maker e shards de Ultima Online, que eram servidores piratas, para modificar e se aprofundar no universo de criação de games. Por ser mulher, negra e no espectro autista, Daniela Santana conta que sempre sofreu preconceito no mercado de trabalho.
por
Malu Lutfi
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24/09/2020

Vera Lúcio Paulino

Vera, mais conhecida no mercado como Verinha Paulino, cresceu em uma cidade do interior de Minas. Sua família, de descendência indígena e italiana, não possuía influências culturais marcantes, além do básico do Interior. Sua bisavó materna, de pele vermelha, nasceu no meio do mato, e seus tataravós, por parte de seu pai, tiveram uma história romântica de novela dos anos 20, com direito a mudanças de país na busca pelo amor. 

Aos 8 anos, Vera foi morar com seus avós, e eles sempre a deram muita liberdade de escolha. Ela diz que sempre teve a oportunidade e apoio para decidir seus próprios gostos, independente de influências externas. Como qualquer pessoa, sofreu críticas, mas confirma que nunca foram um problema.

Quando criança, Vera não imaginava trabalhar com jogos, afinal, cresceu em uma cidade do Interior, onde jogos eletrônicos não eram um assunto comum, principalmente na roda de conversas entre garotas. Seu primeiro contato com videogame foi através de seus primos (que mal a deixavam jogar) e, em 1997, aos 5 anos, seu pai a presenteou com um Super Nintendo.

Como cresceu apenas jogando com homens, em sua adolescência, se via como uma menina diferente. Na época da escola, sempre andou com garotos, como se fosse a única roda de conversa disponível e de seu agrado. Em contraposta, a maioria das meninas não aprovava sua paixão por games, considerando que eram “coisas de menino”, e acabou sofrendo bullying por isso.

Verinha começou seus estudos na área de saúde, e nem planejava seguir a carreira de comunicação. No entanto, durante um curso de enfermagem, a paixão pelos jogos falou mais alto. Para prosseguir na carreira que desejava, se formou em comunicação social em rádio e TV. Hoje, morando em São Paulo e com 28 anos, Verinha é redatora de um portal de cultura geek, o Suco de Mangá. 

Sua carreira começou com gravações de notícias sobre videogames para a extinta Rádio Unifran, de Franca, interior de São Paulo, até começar a ir em eventos, como a BGS, para fazer matérias mais completas. Posteriormente, entrou para o site Suco de Mangá, onde produzia textos sobre jogos e, hoje, fala e escreve sobre animes. Além disso, Vera ressalta que trabalhou como maquiadora para diversos campeonatos de e-Sports e se orgulha demais por sua participação na apresentação do estúdio BTS em campeonatos de DOTA2, onde, também, ensinou como entender e usufruir do jogo. Recebeu muitos comentários de mulheres que gostaram e se identificaram com ela, afinal, não é todo dia que uma mulher tem a oportunidade de falar ou ensinar sobre um game.

Verinha diz que acompanha os campeonatos de DOTA2 até hoje, mas sua paixão é pelos jogos singleplayer. Dentre seus favoritos, estão as séries de Fire Emblem, em especial o Three Houses, e Story of Seasons. No entanto, Vera ressalta que além de seu gosto por jogos, também é fã de costura, o que favoreceu na produção de alguns cosplays que ela mesma criou.

Como o mundo não se limita a jogos, ela também afirma gostar de muitos gêneros musicais, mas, atualmente, têm apreciado músicas orientais,  principalmente J-Pop e J-Rock. Além desses, Vera também admite escutar um pouco do gênero Enka. De acordo com seu depoimento, conheceu músicas japonesas através do jogo Kingdom Hearts. Sobre filmes, Vera não opta por nenhum tema específico, e segue seu humor do momento. Na TV, ela diz que curte assistir e acompanhar novelas.

Refletindo a partir deste artigo, Vera também expõe uma de suas ideias, que consiste em um documentário. Sua obra em andamento conta um pouco sobre as dificuldades para mulheres se tornarem profissionais de e-Sports, pois, durante alguns trabalhos, observou que ainda existe um conceito de que a "mulher não sabe jogar, pois, não se esforça”. A produção promete mostrar a diferença do cotidiano entre homens e mulheres, além de explicar que as coisas não são tão simples assim.

Para não ficarmos apenas na zona de conforto, Vera conta sobre algumas experiências frustrantes que passou no mercado. Como mulher, confessa que sofreu muito preconceito e já se deparou com diversas críticas e ofensas sem motivo ao comentar ou apresentar coisas sobre games. Com pesar, Verinha também conta que já perdeu uma oportunidade de emprego por não ter um Instagram “caprichado” com mais fotos exibindo seu corpo. Afinal, como ela mesma ouviu, “o público não se interessa se você não tiver nada para mostrar”.

No geral, Verinha gosta de ver mulheres que jogam e são ativas na comunidade. Como ela mesma diz, se torna menos solitário e até empolgante ver outras meninas que só querem fazer o que gostam. Mesmo que a presença feminina no cenário ainda esteja bem longe do equilíbrio, ela diz ser super importante a presença de cada uma delas, mesmo que em pequena escala. 

Os jogos, ao seu ver, se tornaram uma comunicação de fácil acesso, que acabam prejudicando o MetaGaming para alguns. Sobre isso, Vera afirma que já viu muitos desistirem de jogar intuitivamente para seguirem os passos de outro jogador, o que, em sua opinião, inibe um pouco suas estratégias e ideias pessoais.

Sobre o futuro, Vera se orgulha do rumo que as coisas tomam. Diz que a inclusão feminina efetiva deve demorar, mas, gradualmente, o assunto ganha notoriedade e é cada vez mais levado a sério. Ela acredita que o mercado e a mídia estão se reinventando e se adaptando. 

 

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Glossário

 

BGS: Brasil Game Show, feira anual de videogames.

BTS: Bangtan Boys, é um grupo musical sul-coreano.

Cosplay: Abreviação de costume play ou de costume roleplay, que pode traduzir-se por "representação de personagem a caráter".

DOTA2: Jogo eletrônico, desenvolvido pela Valve Corporation, do gênero Multiplayer Online Battle Arena.

e-Sports: Competições organizadas de jogos eletrônicos.

Enka: Estilo de música japonesa que mistura sons tradicionais japoneses com melodias ocidentais.

Fire Emblem: Série de jogos eletrônicos de RPG de estratégia, desenvolvido pela Intelligent Systems e publicado pela Nintendo.

J-Pop: Pop japonês.

J-Rock: Rock japonês.

Kingdom Hearts: Série de jogos de RPG desenvolvidos e publicados pela Square Enix.

MetaGaming: Jeito individual de jogar, entender e apreciar um game

Singleplayer: Jogos que possibilitam a participação de apenas um jogador por partida.

Story of Seasons: Jogo de simulação agrícola desenvolvido pela Marvellous Entertainment.

Three Houses:  Jogo eletrônico de RPG de estratégia desenvolvido pela Intelligent Systems e Koei Tecmo, e publicado pela Nintendo.

 

 

Erin Calmon Silva

 

Aos 30 anos, Erin Calmon Silva, conhecida no mercado como Saishy, é fundadora da TinyBird Games, uma empresa que, além de desenvolver games indies, abre novas possibilidades para a comunidade LGBTA. Nascida em Vitória, Espírito Santo, e atualmente residindo em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Saishy explica que sua descendência é uma enorme mistura e que, se tivesse que classificar, seria de origem brasileira. Além disso, Erin explica que não possui superior completo, pois decidiu largar a faculdade. 

Quando questionada sobre seus primeiros contatos com games, Erin diz que não lembra ao certo a sequência ou as datas exatas, mas utilizou o RPG Maker e servidores piratas de Ultima Online, chamados Shards, que a permitiam modificar e se aprofundar no universo de criação de games. Ela afirma que se interessou muito pelos dois, e passava o tempo todo criando scripts para UO e outros títulos que nunca iam para frente no RPG Maker. Em sua infância, se via trabalhando com eletrônica, construindo aparelhos, brinquedos, etc., porém, aos 12 anos, começou a idealizar seu futuro profissional como criadora de jogos.

Erin teve dois consoles quando criança: um Megadrive e um Snes. Ressalta, também, que seu jogo favorito era de um elefante (CJ’S Elephant Antics), que jogava com sua irmã e sua babá da época. Sua mãe lhe contou que jogava o Pacman nos arcades quando mais nova, mas Erin nunca a viu interessada em jogar. Sua família sempre assistiu e acompanhou os filmes populares da época, e sua mãe era fã da saga Star Wars.

Sobre seus gostos pessoais, Saishy confessa que nunca teve muito interesse por música, pois as letras a deixam distraída e tiram sua atenção, ela justifica essa característica pelo fato de estar no espectro autista. Ela complementa dizendo que só escutava trilhas sonoras de jogos. No entanto, Erin sempre teve uma enorme paixão por livros e chegou a escutar de sua mãe que sempre teve um vocabulário muito desenvolvido para sua idade, o que, de acordo com ela, é outro sintoma que pode estar relacionado ao autismo. Atualmente, ela confirma que livros (principalmente do gênero LitRPG) são seu maior vício e passatempo nas horas vagas, ressaltando seu favorito do momento: Cinnamon Bun.

Após conhecer os animes que passavam na TV na década de 90, como Sakura Card Captor, Pokemon, Digimon, Corrector Yui, etc. passou a ficar mais fissurada em animes e mangás. Ela diz que, hoje em dia, consome muitos mangás e light novels japonesas, mas também acompanha novels de escritores independentes. Erin ressalta, também, sua apreciação por jogos cooperativos, principalmente de tabuleiro e RPG’s de mesa. De acordo com ela, Terraria ou Stardew Valley, quando possuem opção de multiplayer, sugam todo seu tempo. Quando falamos de jogos singleplayer, ela diz não se interessar regularmente. Após falar sobre isso, Saishy reflete e confirma que seus gostos são responsáveis por suas produções, sempre pensando em construir um jogo que pode ser usufruído cooperativamente. 

Como criadora de jogos, Saishy explica a coisa que mais lhe atrai nos games é o behaviorismo do game design. Para ela, é impressionante, por exemplo, as moedas do jogo Super Mario não oferecerem nenhuma real recompensa dentro do jogo. Erin diz que, hora ou outra, duvida de seus gostos por jogos. Quando criança, jogava Super Mario World várias e várias vezes seguidas, finalizando e recomeçando sem parar. Porém, hoje não tem mais disposição e vontade para jogar o mesmo jogo, e poucos a atraem. Também diz não ter interesse em assistir pessoas jogando, assim como participar do cenário competitivo dos games.

Saishy trabalhou boa parte de sua vida como programadora freelancer na área de jogos. 

Como autônoma, ela afirma ter mais controle do ambiente e das pessoas com quem se relaciona, e se sente mais segura para trabalhar. Com pesar, conta de uma experiência terrível em uma oportunidade presencial. A proposta do jogo que lhe pediram era, basicamente, uma propaganda política de direita, que na época ela não entendia. Quando pediu demissão, sofreu calúnia e difamação e, posteriormente, processou a contratante e recebeu indenização pelo caso. Finalizando, ela diz que nunca trabalhou na indústria AAA, apenas em estúdios indies.

Sobre nostalgias e bons momentos, Erin comenta que, em 2011, realizou um intercâmbio profissional no Japão, onde ela e um colega realizaram uma engine para jogos em HTML5. Como ela mesma diz, morou em Otsuka, Tokyo, por seis meses e foi uma das melhores experiências profissionais de sua vida.

Atualmente, Saishy trabalha em seu projeto pessoal, chamado TinyAttack, que consiste em um roguelike de ação multiplayer, em um estilo pixelart. Ela diz, com muito orgulho, que este é seu projeto de estimação e espera termina-lo em breve.

Como mulher trans e autista, é difícil para Erin especificar quais foram seus obstáculos dentro do mercado. Ela diz que não sabe se sofreu preconceito por um fator ou por ambos, mas, antes de realizar sua transição, já se deparou com muitas coisas horríveis, vindas diretamente de homens, no ambiente corporativo. Em um dos casos, ela conta sobre uma agência de design que trabalhou e, quando decidiram contratar mais um funcionário, afirmaram que não podia ser uma mulher, pois já havia uma funcionária no escritório e, caso contratassem outra, elas ficariam conversando e não iriam produzir.

Além disso, Erin também expõe sua visão sobre a representatividade feminina dentro dos jogos. Ela afirma que repudia a retratação da maioria das mulheres nos jogos e, os poucos casos de semelhança com a realidade, dificilmente tem a repercussão que merecem. De acordo com Saishy, somente as que se encaixam no padrão de beleza são exaltadas e reconhecidas.

Ela cita, como exemplo, o caso de The Last of Us 2, que, independente de todos os problemas com a história, caracterização ou desenvolvimento, o que mais gerou discussão na internet foi o físico de uma das personagens. De acordo com muitos internautas (em sua grande maioria, homens) o estilo corporal de uma mulher não poderia ser retratado daquela forma, com muitos músculos e diminuição de curvas nas partes do busto e quadril. Então, existem pessoas que reclamam pela personagem não ser bem construída, ou por sua aparência, ou pelo fato delas serem mulheres. De acordo com Erin, é uma quantidade desproporcional de ataques a personagem, como se o público masculino pudesse ser medíocre e mulheres devessem ser, nada menos, que perfeitas (na visão deles, é claro). 

Como exemplo, Saishy fala sobre a Atlus, empresa liderada por homens e com jogos que parecem dirigidos aos mesmos, que admite não saber retratar personagens femininas. Inclusive o próprio diretor da companhia afirma não acreditar em amizade entre homens e mulheres, o que, consequentemente, é refletido nos jogos da produtora. 

Em suma, Erin diz acreditar no diálogo e em suas consequências. Se existisse mais cooperação e o jogo pudesse refletir o resultado de uma colaboração de equipe, ao invés de um sistema de subordinação, ela supõe que não acreditaríamos nessa visão de mundo individual como a verdade. 

Sobre as grandes indústrias de videogame, Saishy enxerga um movimento decadente que tenta se manter e adaptar em cima daqueles que descarta. Portanto, Erin não consegue idealizar um futuro decente a partir disso. Para falar de jogos indies, ela faz uma analogia sobre ler uma notícia de superação, que tenta vender ideias como inspiradoras e ignorar milhões de pessoas que não conseguiram atingir o mesmo marco, ou seja, mesmo com uma produção independente, o sucesso não é garantido. De acordo com ela, o mercado precisa notar que o bem mais valioso que possui são seus trabalhadores, e os mesmos devem se juntar para reivindicar seus direitos.

Para o futuro, Erin acredita na criação de jogos a partir de sistemas colaborativos entre trabalhadores, como no caso da Motion Twin, ou da mais recente Future Club. Ela argumenta, dizendo que jogos indies são criações artísticas autorais e necessitam de todo o comprometimento da equipe, e só uma cooperativa teria como fornecer o ambiente necessário para tais projetos. Saishy pretende adotar este formato de negócio em sua obra TinyAttack. 

 

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Glossário

 

Animes: Animação ou desenho animado japonês.

Arcade: Arcada ou fliperama (como é tradicionalmente conhecido no Brasil) é um aparelho de jogo eletrônico profissional instalado em estabelecimentos de entretenimento.

Behaviorismo:  Teoria psicológica que objetiva estudar a psicologia através da observação do comportamento, com embasamento em metodologia objetiva e científica fundamentada na comprovação experimental, e não através de conceitos subjetivos e teóricos da mente como sensação, percepção, emoção e sentimentos.

Cinnamon Bun: Livro de LitRPG, de Ravens Dagger.

CJ’S Elephant Antics: Jogo de plataforma desenvolvido pela Genesis para o Commodore 64, com conversões feitas para o Amiga, Atari ST, ZX Spectrum e Nintendo Entertainment System. 

Corrector Yui: Série de anime criado por Kia Asamiya. 

Digimon: Franquia de mídia japonesa, distribuída pela Bandai e criada por Akiyoshi Hongo.

Engine: Motor de jogo, também conhecido pelo termo em inglês, game engine.

HTML:  Linguagem de marcação utilizada na construção de páginas na Web. 

Future Club: Estúdio de desenvolvimento de jogos cooperativos.

Indústria AAA: Na indústria dos jogos de vídeo, AAA (pronuncia-se "tripol eɪ") ou Triplo-A(em português) é uma classificação utilizada para jogos com os maiores orçamentos e níveis de promoção. Um título considerado AAA, é esperado que seja de alta qualidade, ou que esteja entre os melhores do ano.

Light novels: Romances ilustrados, geralmente no estilo anime/mangá, compilados de revistas ou sites na internet.

LitRPG: Gênero literário que combina as convenções de RPGs de computador com ficção científica e romances de fantasia.

Mangá: Palavra usada para designar história em quadrinhos ou banda desenhada feita no estilo japonês.

Megadrive: Console da empresa Sega.

Motion Twin: Estúdio independente especializado em videogames online.

Multiplayer: Jogos multijogador, também conhecidos como jogos multiplayer, são jogos que permitem que vários jogadores participem simultaneamente de uma mesma partida.

Pacman: Jogo eletrônico criado por Tōru Iwatani para a empresa Namco, e sendo distribuído para o mercado americano pela Midway Games.

Pixelart: Forma de arte digital na qual as imagens são criadas ou editadas tendo como elemento básico os pixels. 

Pokemon: Série de jogos eletrônicos desenvolvidos pela Game Freak e publicados pela Nintendo como parte da franquia de mídia Pokémon. 

Roguelike: Subgênero de jogos RPG, caracterizado pela geração de nível aleatória ou procedural durante a partida, mapa geralmente baseado em ladrilho e morte permanente, e normalmente cenário com uma temática de alta fantasia.

RPG Maker: Série de motores de jogo para desenvolvimento de RPGs eletrônicos, criada pela empresa ASCII.

RPG: Jogo em que os jogadores assumem papéis de personagens e criam narrativas colaborativamente.

Sakura Card Captor: Série de mangá do gênero mahō shōjo, criada pelo grupo CLAMP e publicada na revista Nakayoshi.

Script: Um scripting, ou linguagem de script, é uma linguagem de programação que suporta scripts, programas escritos para um sistema de tempo de execução especial que automatiza a execução de tarefas que poderiam alternativamente ser executadas uma por vez por um operador humano. 

Shards de Ultima Online: Pedaços do jogo Ultima Online, um dos primeiros MMORPGs lançados comercialmente, em 30 de setembro de 1997 pela Origin Systems, utilizados para modificação.

Singleplayer: Jogos com um único jogador.

Snes: Console de videogame de 16 bits desenvolvido pela Nintendo.

Star Wars: Franquia, do tipo space opera, estadunidense, criada pelo cineasta George Lucas.

Stardew Valley: Jogo de videogame, dos gêneros RPG e simulação, desenvolvido por Eric Barone e publicado pela ConcernedApe e pela Chucklefish.

Terraria: Jogo eletrônico RPG de ação-aventura independente produzido pela desenvolvedora de jogos Re-Logic. 

The Last of Us 2:  Jogo eletrônico de ação-aventura desenvolvido pela Naughty Dog e publicado pela Sony Interactive Entertainment

 

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Daniela Santana

A tradutora e streamer Daniela de Santana Pereira, conhecida no mercado como Daniela Razia, é formada em letras, magistério e estudante do segundo período de pedagogia em Educação Especial. Nascida na periferia do Guarujá, São Paulo, Dani conheceu o universo da produção de conteúdo de games pelo blog Preta&Nerd, em 2016. 

Como ela mesma relata, teve seu primeiro contato com jogos aos 8 anos, quando se aventurava nos fliperamas da cidade. Quando mais velha, passou a idealizar seu futuro como tradutora de games, considerando que adoraria se tornar referência e ver alguns títulos legendados. Dani diz que não encontrava jogos com legendas em português, o que a deixava bem frustrada. Aprendeu inglês por conta própria e, gradualmente, foi aprendendo a gostar da língua e da atividade de tradução. Posteriormente, decidiu seguir a carreira profissional de tradutora de games. 

Dani explica que, em sua infância, seu pai não permitia a entrada de videogames em sua residência, pois era muito rígido e os consoles não o agradavam. Quando mais velha, conta que começou a alugar os mesmos em estabelecimentos especializados. Hoje, aos 43 anos, ela confirma já ter comprado jogos com seu próprio dinheiro. Ainda ressalta que jogos como Cadillac Dinossaurs e The King of Fighters marcaram muito seu crescimento. Além disso, conta com bom humor que a música Bad, de Michael Jackson, um dos artistas que escutava bastante, a representava na época do fliperama, considerando que a escutava durante suas partidas. 

A saga de Final Fantasy é muito importante para Dani, embora ela pontue que To The Moon roubou seu coração ao apresentar o autismo como tema central. De acordo com ela, a obra é muito tocante e representa seu filho e a si mesma. 

Sobre seus gostos atuais, Daniela afirma se identificar muito com jogos de RPG. Nos streamings, ela se diz eclética, e assiste séries nerds e com temáticas da cultura geek. Afirma, também, que gosta de filmes de ação e comédia. As músicas que mais gosta são do gênero pop e k-pop. Além de contar que gosta e acompanha, quando consegue, os e-Sports. No tempo livre, ela ainda frequenta academia e escreve fics. 

Daniela conta, também, sobre projetos pessoais e suas participações no Wakanda Streamers e da Preta&Nerd. O grupo de streamers foca na junção e acolhimento das minorias negras, e a Preta Nerd também, mas com debates sobre feminismo negro, ser nerd, coletivos de leitura e conteúdo acadêmico acessível.

No mercado de trabalho, Daniela confessa que não trabalhou com nada relacionado a games, além de tradução. Seu maior marco profissional foi a tradução de seu primeiro jogo, que a fez, inclusive, chorar de emoção. O título deste game precisa ficar em anonimato. Por ser mulher, negra e no espectro autista, Dani conta que sempre sofreu preconceito no mercado. Para conseguir traduzir jogos e trabalhar com o que gosta, ela se esconde atrás de um pseudônimo masculino. Ela confessa que pretende mudar isso ainda este ano, pois assume que já estarmos presos a tantos problemas e se questiona se vale a pena se prender em mais um. 

Ter que se esconder atrás de um nome masculino prova como a representatividade dentro dos jogos afeta Dani. Embora não cite casos específicos, ela afirma que a falta de semelhanças e inclusão das minorias geram, em seu caso, assédio preconceituoso por ser negra, gorda e mais velha. Com pesar, Daniela confessa como isso a traumatizou e a negligenciou do mercado de trabalho, além de gerar um desconforto na hora de jogar algo e não se sentir representada naquilo. 

Embora Dani diga que nos últimos 20 anos aconteceram mudanças significativas na representação feminina dentro dos jogos, ela acrescenta que ainda está longe do ideal. Complementa dizendo que existe uma lacuna enorme sobre representatividade que precisa ser preenchida. As mulheres, em jogo, continuam hipersexualizadas e pessoas negras pouco aparecem. Ela acredita que o mercado parece incluir, lentamente, essas demandas, mas está longe de ser a igualdade que deseja e tem direito.

Além disso, Daniela reflete sobre empresas que usam as minorias apenas para gerar lucro, sem real intenção de favorecer essas pessoas. Ela diz que parece cruel, mas é uma grande realidade do mundo em que vivemos. No entanto, se mantém esperançosa, na expectativa de que a mudança continue, mesmo que gradualmente. Como Dani diz, é melhor se manter otimista, mesmo com muitos pontos no cenário que precisam de mudanças. 

No final, Dani reflete se, algum dia, teremos, realmente, o controle na mão. Ela quer ter mais esperança e se sentir confortável ao segurar um controle, teclado, celular, e poder jogar sem questionarem seu direito de estar ali. 

 

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Glossário:

 

Cadillac Dinossaurs: Jogo de beat 'em up para arcade lançado em 1993 pela Capcom e baseado nos quadrinhos Xenozoic Tales de Mark Schultz.

Geek: Gíria inglesa que se refere a pessoas peculiares ou excêntricas, fãs de tecnologia, eletrônica, jogos eletrônicos ou de tabuleiro, histórias em quadrinhos, mangás, livros, filmes e séries.

e-Sports: Competições organizadas de jogos eletrônicos, especialmente entre os profissionais.

Fics: Abreviação da expressão inglesa “fanfiction”, que significa “ficção de fã” na tradução literal para a língua portuguesa.

Final Fantasy: Jogo eletrônico de RPG criado por Hironobu Sakaguchi, desenvolvido e publicado pela Square no Japão pela primeira vez em 1987.

Fliperama: Fliperama, ou salão de jogos, é um estabelecimento destinado ao uso de máquinas do tipo "pinball" , o nome "flipper" vem das alavancas usadas para controlar a bola em pinball. 

K-pop: Gênero musical originado na Coreia do Sul, que se caracteriza por uma grande variedade de elementos audiovisuais.

Nerd: Conceito sociológico moderno que, por vezes, é descrito como uma tribo urbana, muito embora possua características gerais mais imprecisas do que a maioria delas, e embora também não preceda à autoidentificação.

Preta&Nerd: Espaço virtual onde é possível discutir um modo de consumo (nerdiandade) tendo em vista a simultaneidade dos recortes de raça, gênero, classe. 

RPG: Jogo em que os jogadores assumem papéis de personagens e criam narrativas colaborativamente.

Streamer: Pessoa que realize o ato do streaming, ou seja, transmissão de conteúdo em alguma plataforma.

The King of Fighters: Série de jogos de luta produzidos pela SNK.

To The Moon: Quarto jogo nipo-americano produzido por Kan "Reives" Gao e o primeiro lançamento comercial de sua desenvolvedora indie Freebird Games. 

Wakanda Streamers: Iniciativa nascida em 2018 com o objetivo de reunir e dar suporte à comunidade preta, criando uma rede de apoio.

 

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Cultura e Entretenimento

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