Cerca de 1,8 milhão de pessoas vivem em moradias precárias na cidade de São Paulo, segundo dados da FGV (Fundação Getúlio Vargas). Ainda na capital paulista, a fila por moradia popular na capital paulista supera 1 milhão de inscritos.
Buscando superar essa realidade, muitos munícipes se filiam a movimentos de luta por moradia. É o caso de Joana Darc, 47, integrante do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), que encontrou na militância o sonho de uma moradia digna.
“Um lugar para mim e para os meus filhos”, diz sobre seu desejo. “Sou mãe de quatro filhos, mãe sole, criei eles sozinha. Vi no movimento a oportunidade de ter um lugar melhor para morar”, acrescenta.
Com a insegurança econômica gerada pela pandemia do novo coronavírus, o professor de direito da PUC-SP Álvaro Luiz Gonzaga argumenta que a escolha do próximo prefeito de São Paulo nas eleições municipais de novembro é essencial para definir quais serão os rumos do direito à moradia na cidade mais populosa do Brasil.
“O poder executivo exerce papel fundamental na garantia ao direito à cidade”, afirma. “Vemos os retrocessos sociais pelo quais passamos na esfera federal, e caberá às urnas e ao povo decidir se seguiremos ou não este caminho também nas eleições municipais”, finaliza.
Tendo isso em vista, o Contraponto Digital foi atrás dos planos de governo dos quatro candidatos que constam nas simulações de segundo turno da última pesquisa Ibope, divulgada na última sexta-feira (30), sendo eles:
- Bruno Covas (PSDB), primeiro colocado na pesquisa, com 26% das intenções de voto;
- Celso Russomanno (Republicanos), segundo colocado na pesquisa, com 20% das intenções de voto;
- Guilherme Boulos (PSOL), terceiro colocado na pesquisa, com 13% das intenções de voto;
- Márcio França (PSB), quarto colocado na pesquisa, com 11% das intenções de voto.
A seguir, você confere as principais propostas dos candidatos e análises de pessoas que trabalham e militam pelo direito à moradia em São Paulo sobre o que esperar do próximo prefeito da capital paulista.
Bruno Covas (PSDB)
Atual prefeito de São Paulo (desde 2018) e ex-secretário de Meio Ambiente do estado de São Paulo (2011-2014)
Em seu plano de governo, o neto de Mário Covas, ex-governador de São Paulo (1995-2001), se concentra em defender sua gestão na área da habitação na capital paulista.
Covas destaca ter construído 50 mil moradias para famílias de baixa renda, além de outras 20 mil que ainda estão previstas. O candidato a reeleição também elenca ter construído o primeiro conjunto habitacional voltado exclusivamente para a população em situação de rua em São Paulo.
Para Bruno Covas, sua reeleição garantiria a continuidade das conquistas na área. “Nossa gestão irá multiplicar seus resultados nos próximos quatro anos, com a entrega gradual das 70 mil moradias já viabilizadas, parte delas com investimento privado”, afirma.
Celso Russomanno (Republicanos)
Apresentador de TV e deputado federal por São Paulo desde 2015
Candidato a prefeito de São Paulo pela terceira vez consecutiva, o deputado tem como uma de suas propostas “diminuir os gastos públicos com o pagamento de auxílio aluguel”, destinando os recursos poupados para a “construção de unidades habitacionais”.
O apresentador também defende o uso do dinheiro da OODC (Outorga Onerosa do Direito de Construir), dispositivo que permite a construção de um edifício com altura acima do permitido para uma região, “para investimentos em programas habitacionais de interesse social e recuperação dos assentamentos da população de baixa renda.”
Ainda em seu plano de governo, Russomanno defende consolidar o processo de retrofitting (modernização) de edifícios na região central de São Paulo para ocupação da população de baixa renda, além de ampliar o programa de PPPs (Parcerias Público-Privadas) habitacionais.
Guilherme Boulos (PSOL)
Mestre em Psiquiatria pela USP (Universidade de São Paulo) e militante pelo direito à moradia
Líder nacional do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e candidato a presidente em 2018, Boulos defende a retomada dos Mutirões da gestão Luiza Erundina (1989-1992), sua vice, cujo objetivo eram construir moradias populares em terrenos abandonados de forma autogestionada, sobretudo na periferia de São Paulo.
No centro de São Paulo, Boulos defende em seu plano de governo criar um programa de locação social para pessoas em situação de rua, abrigando-as em unidades hoteleiras ou moradias.
Quanto aos imóveis ociosos no centro histórico, Boulos propõe destinar aqueles que não cumprem sua função social para a construção de habitações de interesse social para a população de baixa renda.
Márcio França (PSB)
Advogado e ex-governador de São Paulo (2018)
Buscando o cargo de prefeito pela segunda cidade diferente - antes, administrou São Vicente (SP) entre 1997 e 2004 -, Márcio França propõe criar um programa de assistência técnica para autoconstruções e regularização fundiária em áreas de habitação precária com mais de cinco anos de ocupação.
Defensor de parcerias com o setor privado, o ex-governador de São Paulo também propõe o uso de Cepacs (Certificados de Potencial Adicional de Construção) para financiar OUCs (Operações Urbanas Consorciadas) para atrair e captar investimentos para a “recuperação e ocupação do centro” de São Paulo.
Ainda entre seus projetos, França propõe uma “estratégia de habitação social” em que moradias de diferentes padrões sociais são incluídas em um mesmo projeto habitacional, “na qual beneficiados mais afluentes ajudam a financiar as propriedades de menor renda”.
O que esperar do próximo prefeito? E o que o espera?
Para Álvaro Luiz, “existem problemáticas que não podemos mais nos esquivar” como, por exemplo, a segurança de mananciais, muitas vezes ocupados por famílias em busca de moradia, e alerta que problemas gerados “por anos de política habitacionais baseadas na concessão de auxílio aluguel” baterão na porta do próximo prefeito.
“Para além disso, a retomada dos imóveis do centro, a desapropriações de imóveis que não cumprem a função social da propriedade e a moradia digna são essenciais”, acrescenta.
Militante do MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Moradia), que luta pelo direito à moradia em São Paulo, Lucas Nascimento, 29, argumenta que “a questão da moradia não é apenas morar, mas sim a luta por vagas de creche para que as mães possam trabalhar e ajudar na renda da família, é a vaga nos postos de saúde, nas escolas para os jovens”.
“Com esse desemprego, mesmo nos prédios populares, as famílias de baixa renda estão saindo por não conseguirem pagar o condomínio e as contas de água, luz, gás e muito outras”, diz.
Sobre o que deseja do próximo prefeito de São Paulo, Joana Darc espera que o próximo chefe do executivo paulistano construa “uma política verdadeiramente pública de moradia inclusiva”.
Já João Paulo Rodrigues, 23, militante da UNMP (União Nacional Por Moradia Popular), espera que o próximo prefeito reconheça a “história e legado” dos movimentos por moradia em São Paulo com as políticas públicas habitacionais na hora de elaborar programas para a área.
“E se não reconhecerem, as ruas sempre foram nossa maior demonstração de força”, diz.