Body neutrality: a nova fase do gordo-ativismo

Entenda mais sobre a mobilização emergente no Brasil em volta da neutralidade corporal
por
Laura Pancini
|
05/05/2020

por Laura Pancini

Corpo. (Foto: Laura Pancini)
Corpo. (Foto: Laura Pancini)

 

Você ama seu corpo todos os dias? Nos últimos anos, o discurso do movimento body positive (“corpo positivo”) tomou conta das redes sociais como uma resposta a gordofobia e a pressão estética. Seu intuito é levar todos, principalmente corpos gordos, a se amar sem restrições, independente do que é ditado pela sociedade, pela mídia e até pela própria pessoa. Sua essência é boa, mas não cobre um detalhe fundamental da natureza humana: nós somos seres imperfeitos. Assim, o movimento evoluiu para uma nova vertente.

O body neutrality (“neutralidade corporal”) nasceu na Internet por volta de 2015, mas cresceu exponencialmente entre gordo-ativistas no Brasil no último ano. O movimento estimula valorizar o corpo por algo além de sua aparência: com ele, você se exercita, visita lugares, abraça amigos, namorados e parentes. É importante apreciá-lo por tudo que ele faz, além de entender que terão vezes que amá-lo não será espontâneo.

A neutralidade corporal veio também como um questionamento sobre a eficácia do movimento corpo positivo. “Ame seu corpo a qualquer custo (sic)”, “Você é perfeito não importa o que for (sic)”, “Amor próprio é tudo (sic)”, são algumas frases por trás da mentalidade body positive.

Essas repetições desconsideram a vulnerabilidade que as pessoas têm a fatores externos como: o mercado da beleza, da moda ou da estética, a (falta de) representatividade em revistas ou outros tipos de mídia, e também o que é geralmente visto como o corpo aceitável pela sociedade.

Indo muito além da pauta da auto-estima, gordo-ativistas vêm se manifestando sobre as dificuldades e preconceitos enfrentados diariamente em transportes públicos, entrevistas de emprego, aplicativos de relacionamento e diversas outras esferas sociais. Luana Carvalho, 21 anos, é modelo plus size, gordo-ativista e usa seu Twitter para mostrar sua vivência como mulher negra e gorda. Para ela, ainda há muito a ser melhorado: “O movimento ainda é muito focado no corpo branco e cisgênero. Por conta da minha vivência, faço questão de racializar esse debate”.

Luana Carvalho em seu Instagram (@lxccarvalho)
Luana Carvalho. (Foto: Instagram @lxccarvalho)

Luana relata que o movimento do corpo positivo foi criado por mulheres negras e que a frase “Não existe Body Positive sem Black Lives Matter (vidas negras importam)” era essencial para suas fundadoras. Hoje em dia, já não é mais o mesmo: “Houve um esvaziamento do movimento, e hoje se vê uma dominância de pessoas brancas e muitas vezes magras que falam sobre auto-estima de uma forma desonesta. Não há uma preocupação em falar sobre políticas públicas, gordofobia, exclusão e desigualdade, ele fala exclusivamente sobre corpo e auto-estima”.

Apesar de achar auto-estima importante, Luana sabe que isso não é o suficiente. “Mesmo com a maior auto-estima do mundo, ainda vou continuar sendo excluída pela gordofobia. Acho que o movimento tem que ir além de uma hashtag de Instagram”, ela comenta, se referindo ao #BodyPositive. Atualmente, existem mais de 12 milhões de publicações sob a hashtag. “É importante? Sim, mas não serve para mim”.

Com isso, Luana e muitas outras pessoas gordas vêm se identificando no movimento Body Neutrality. Ainda há muito a ser desenvolvido, mas sua essência já se mostra mais inclusiva. “A neutralidade corporal está muito mais perto do que me identifico. Eu vejo que existe uma preocupação em falar sobre outros corpos que não seguem o padrão branco cisgênero e isso está mais alinhado com o que acredito”.

Querendo se distanciar da obsessão em torno do amor próprio que, no fim das contas, acaba sendo muito direcionado a estética, a neutralidade corporal quer que você vá para um lugar mais neutro em relação ao seu físico. Isso traz uma forma de alívio às pessoas que tendem a oscilar drasticamente entre amor e ódio a sua compleição. Nossa relação com o corpo é uma construção constante. Com a ajuda do body neutrality, talvez seja mais fácil respeitar os sentimentos e vivências que nos contemplam e viver com elas harmoniosamente. Por que não tentar?

Tags:

Comportamento

path
comportamento

Cultura e Entretenimento

path
cultura-entretenimento