Adriana Varejão inaugura exposição na Pinacoteca de São Paulo

Maior mostra da carreira da artista reúne mais de 60 obras - algumas inéditas - produzidas entre 1985 e 2022
por
Jorge Koike, Ligia Saicali, Manuela Pestana
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07/04/2022

    Inaugurada em março deste ano, a exposição “Suturas, fissuras e ruínas” da artista carioca Adriana Varejão traz ao público a maior mostra de sua carreira. Com reconhecimento nacional e internacional, Varejão expõe na Pinacoteca de São Paulo cerca de 60 obras - algumas delas nunca vistas - que marcam diferentes épocas de sua jornada artística.

    Nascida em 1964, no Rio de Janeiro, Adriana Varejão iniciou sua participação no universo das artes um tanto cedo. Já na década de 1980, Varejão participava de cursos livres na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, e em 1988 já havia conquistado sua primeira exposição individual, na galeria Thomas Cohn, em São Paulo. 

    Ainda que tenha ingressado em engenharia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Varejão logo percebeu sua vocação para as Artes e começou a ganhar destaque na cena nacional e internacional. Durante a década de 1990, a artista expôs na Bienal de São Paulo, Havana, Johanesburgo e Liverpool. 
    
      
Autorretrato da artista. “Almas Gêmeas”, 2015. Foto: Arquivo Pessoal 

    A mostra “Suturas, fissuras e ruínas” procura retomar marcos importantes da carreira da artista, elucidando características peculiares de seu estilo próprio. Além de Varejão utilizar das estruturas e superfícies como parte integrante de suas obras, ela também procura dissecar construções e ideais que formulam o imaginário da história brasileira, especialmente de um ponto de vista social e antropológico. 

        
“Autorretratos coloniais”, 1993 e “Filho Bastardo (Cena de Interior)”, 1997. Foto: Arquivo Pessoal. 


    Os “rasgos” presentes em suas obras, que demonstram um conteúdo que se assemelha à carne crua, com um toque visivelmente visceral, representam os recortes simbólicos que a artista procura fazer dentro de narrativas conservadoras e retrógradas da sociedade. Uma tentativa de, realmente, provocar “suturas, fissuras e ruínas” no que se concebe como a “verdade” ou a “tradição”, e dilacerar certas visões equivocadas, machistas e eurocêntricas sobre o mundo. 

    “Sua obra põe em pauta o exame reiterado e radical da história visual, das tradições iconográficas europeias e das convenções e códigos materiais do fazer artístico ocidental. Desde suas primeiras pinturas barrocas, a superfície da tela nunca é mero suporte; ao contrário, é um elemento essencial da mensagem da pintura. O corte, a rachadura, o talho e a fissura são elementos recorrentes nos trabalhos da artista desde 1992”, aponta o curador da mostra,  Jochen Volz, em depoimento oficial para o site da Pinacoteca de São Paulo. 

“Suturas, fissuras e ruínas”

    Na parte central da Pinacoteca, chamada de Octógono, são dispostas cinco esculturas de Adriana Varejão, duas delas feitas especialmente para essa mostra.

 Já de início percebe-se que a artista tem muito a mostrar além da superfície de suas obras, uma vez que é possível visualizar o interior de suas esculturas. Como uma espécie de víscera, de cor vermelha e padrão corpóreo, o espectador se depara com as primeiras peças de Varejão, e se situa sobre o que está por vir. 

 

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Uma das cinco esculturas do Octógono. Na imagem é possível ver o “interior”, visceral e vermelho. Foto: Arquivo Pessoal. 

    “Eu senti ao mesmo tempo uma angústia e uma libertação”, aponta Amanda, 23, doutoranda em Letras pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), que visitou a exposição na última quarta-feira (6). 

    O restante da exposição é dividido em sete salas, que buscam marcar os diferentes períodos da carreira da artista. A primeira delas dispõe obras do início da trajetória de Varejão, com quadros do final da década de 1980. 

    Com forte influência barroca, já é possível notar características que irão permear todo o traço artístico de Varejão. “Seu genuíno interesse pela materialidade, na busca de ir além da bidimensionalidade da tela, além do diálogo com a história colonial brasileira", são alguns dos pontos enfatizados pelos textos explicativos encontrados na própria mostra.

    Ainda, fica claro que a inspiração para a realização dos quadros desta sala são desencadeados após uma visita da artista à cidade histórica de Ouro Preto, onde é possível encontrar um riquíssimo acervo de arte barroca.

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“Azulejos”, 1988. Foto Arquivo Pessoal. 


“Altar Amarelo”, 1987. Foto: Arquivo Pessoal. 

    Passando pela trajetória da artista nas diferentes salas, é possível conhecer um pouco mais sobre seu processo criativo. “Uma característica da produção de Adriana Varejão é o fato da artista iniciar séries sem o compromisso de encerrá-las”, aponta explicação disponível nas paredes da mostra. 

    Frente a isso, na quarta sala é possível verificar a temática do mar - e dos microorganismos que lá habitam -, sendo interpretada e reinterpretada pela artista anos depois em diferentes formatos. Além dos quadros realizados na década de 1980, Varejão mergulha novamente nesse mesmo assunto 25 anos depois, em 2009, produzindo obras tridimensionais em formatos de “grandes pratos que se projetam na parede”. 


                
“O Universo”, 1985 e “Mãe D’Água”, 2009. Foto: Arquivo Pessoal. 


    Na última sala é possível verificar uma das marcas registradas da artista, que se configura como uma certa adoração por azulejos, o que eles representam, onde podem ser encontrados, como se comportam diante do tempo e do espaço em que estão localizados. 

    “Para (...) obras como essas, a artista pesquisa e toma como referência imagens vistas, por exemplo, em construções coloniais brasileiras, como as igrejas das cidades de Recife, Olinda, Rio de Janeiro, Salvador e Cachoeira”, aponta a explicação da mostra.

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“Atlântico”, 2008. Foto: Arquivo Pessoal. 


“Azulejões”, 2000. Foto: Arquivo Pessoal. 

    Também nessas obras, consideradas talvez as mais conhecidas de seu acervo, é possível observar a presença de rachaduras, que marcam toda a trajetória da artista. “Aqui, mais uma vez, a fissura aparece de forma intencional (...), abrindo, literalmente, fendas que permitem a outras camadas de pintura emergir”, explica o texto disposto nas paredes da mostra. 
 

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